“Conduzindo Madeleine” (2022): toda viagem é uma companhia nas sutilezas do cinema frânces

Uma característica contemporânea que tenho notado é que os road movies não são mais tanto sobre as descobertas de fora, mas para as viagens que fazemos para dentro. E, viajando para dentro, a gente passa a encontrar os pequenos afetos daqueles que estão ao nosso redor. É mais ou menos assim que eu traduziria essa doçura de filme, daqueles que só o cinema francês é capaz de fazer: Conduzindo Madeleine, de Christian Carion.

Com elenco enxuto de Alice Isaaz, Dany Boom e Line Renaud, mas escolhido à perfeição, o filme conta a história de Madeleine, uma senhora de 92 anos que chama um táxi para levá-la para a instituição de repouso que ela vai morar. O taxista é Charles, um homem rabugento que começa a se incomodar com as histórias e os pedidos inusitados de Madeleine.

É preciso dizer que, mais uma vez, na tradução perdemos grande parte do sentido ampliado que o filme proporciona. Em francês, “Une Belle Course” (Um belo trajeto, uma bela corrida, uma bela jornada, em tradução literal), abarca muito mais o protagonismo de que temos, diante de nós, duas viagens simultâneas: a da senhora que atravessa a cidade rumo ao asilo e dela própria rumo ao passado. Além disso, podemos abrir mais alguns trajetos como o dela em direção ao motorista, o dele em relação à ela e à própria vida, enfim, muitos mais do que o Conduzindo Madeleine que chega até nós.

Pois é isso que vemos durante este trajeto: Madeleine enquanto recorda, começa a amolecer o coração de Charles, ao mesmo tempo em que revela o seu passado de ter nascido antes da guerra, ter vivido um amor, ter sofrido violência doméstica e se tornado a mulher que hoje é. O mais gracioso do filme não está expressamente na narrativa que não só é esperada como até comum. O mote está na delicadeza com que os sentimentos são retratados de acordo que o afeto entre os dois aumenta.

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Assistir a histórias dessas duas figuras enquanto passeamos pela belíssima cidade de Paris é como se estivéssemos acompanhando três tempos: o presente em que os dois se encontram, um passado vivido por Madeleine e um passado ainda mais antigo, aquele do tempo imutável que leva todos nós.

O filme chega aos cinemas no dia 2 de maio!

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