A escritora Jorgelina Tallei, argentina, fronteriza e naturalizada brasileira, radicada no país há mais de 20 anos, lançou na última Flip seu novo livro de poesias, Sotaque Ambulante, publicado pela editora Urutau. Professora universitária na área de Letras e Linguística, de Espanhol, na Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), Jorgelina entrelaça, em sua obra, as experiências migrantes que marcam o ir e vir entre países, a sensação de pertencer ou não a um lugar, e a escolha entre abandonar ou se apropriar de uma língua.
A autora trabalha com estratégias de translinguagem, transitando entre português e espanhol e misturando ambos de maneira original, sem perder a identidade marcada pelos lugares por onde passou. As poesias costuram dores e alegrias da migração: a despedida de um país, a felicidade de habitar outro, as incertezas diante do desconhecido e a coragem de recomeçar em território estrangeiro.
A originalidade de Sotaque Ambulante está na escrita entre línguas, criando uma voz própria que dá forma à condição de viver em trânsito. Essa identidade se materializa nos poemas que visibilizam a potência do contato entre espanhol e português, mostrando que é possível construir pontes entre os dois idiomas sem a necessidade de renunciar a nenhum deles. O próprio título da obra já sugere essa travessia: um “sotaque” que se move, migrante e ambulante, acompanhando a história de quem vive entre fronteiras.
Além do sucesso na Flip, o livro terá novos lançamentos: em setembro, em Posadas, na Argentina; ainda em setembro em Asunción no Paraguai; em seguida em Portugal em Lisboa, na Livraria Snob, Jorgelina também estará presente durante o Festival Internacional de Literatura de Óbidos, na Fólio 2025 onde também lançara seu livro; e no final do ano o livro terminou sua jornada de lançamentos em Foz do Iguaçu. Paralelamente, Jorgelina já prepara seu próximo livro, em que mantém a mesma proposta de escrita entre línguas, desta vez em forma de cartas à mãe. A obra abordará o luto e os sentimentos que atravessam a experiência de perder alguém à distância entre os deslocamentos da vida migrante
Línguas em trânsito
Um dos traços marcantes de Sotaque Ambulante é o modo como se trabalham as línguas. Português e espanhol se entrelaçam em um portunhol afetivo, poético e político, que desafia normas rígidas e abre espaço para uma escrita híbrida. Esse gesto não é apenas estético: é também crítico, pois revela a língua migrante como algo vivo, capaz de desestabilizar fronteiras e inventar novas formas de dizer.
Ao longo do livro, a autora cria estratégia entre os idiomas, deixando surgir uma linguagem que reflete a própria condição migrante: incompleta, marcada por silêncios e lacunas. O “sotaque ambulante” torna-se, assim, metáfora da vida em trânsito e da literatura que nasce entre lugares.
Entre literatura e a vida
Sotaque Ambulante é, ao mesmo tempo, autobiográfico e coletivo. Carrega marcas da experiência pessoal de Jorgelina, mas também ecoa as histórias de muitas mulheres que atravessam deslocamentos. É um livro que se abre para a experiência de cada leitora, convidando-a a reconhecer suas próprias fronteiras, seus próprios deslocamentos e sotaques.
Assim a obra é uma reflexão sobre identidade, língua e pertencimento em tempos de travessias.
Sobre a autora:
Jorgelina Tallei, é professora, escritora, ativista social e pesquisadora. É fronteiriça, mora em Foz do Iguaçu. Natural da Argentina e nacionalizada brasileira, mora no Brasil há mais de vinte anos. Autora dos livros infantis “A língua de todos e a língua de cada um” (2022), “A menina que falava o portunhol” (2024), e do livro de poemas “Poemário da fronteira” (2023). Escreve em portunhol, misturando as línguas, o espanhol e o português, uma “língua” de fronteira que reflete a identidade imigrante. É doutora em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mestre em Letras pela Universidade de São Paulo (USP) e graduada em Letras pela Universidade Nacional de Rosário, na Argentina. É docente da área Letras e Linguística na Universidade Federal da Integração Latino-americana, a UNILA, na cidade de Foz do Iguaçu.