7 conselhos para se tornar um bom escritor (segundo o livro A Verdade Sobre o Caso Harry Quebert)

A verdade sobre o caso Harry Quebert é um romance do suíço Joël Dicker. Lançado no Brasil em 2014, o livro conta a história de Marcus Goldman, escritor que, aos 28 anos, conheceu a fama e o sucesso após ser publicado por uma das maiores editoras de Nova York. No entanto, após o sucesso de seu primeiro livro, Marcus sofre um terrível bloqueio criativo e busca inspiração na pequena cidade de Aurora, na casa de seu mentor, amigo e ex-professor da faculdade Harry Quebert.

Mas um dia descobrem o cadáver de uma adolescente de 15 anos enterrado na propriedade de Quebert, e junto dela estava o original do romance que consagrou o próprio Harry Quebert como um dos maiores escritores dos Estados Unidos. Harry admite ter tido um caso com a menina no ano de seu desaparecimento, 1975, mas jura ser inocente do assassinato. A partir daí, se desenrola um thriller excepcional em que Marcus inicia uma investigação para tentar provar a inocência de seu amigo. Durante esta investigação, Marcus Goldman invoca alguns ensinamentos de seu mentor sobre o que um escritor precisa saber e fazer para se tornar um bom escritor. Confira:

“- O segundo capítulo é muito importante, Marcus. Ele deve ser incisivo, uma porrada.
– Como assim, Harry?
– Como no boxe. Você é destro, mas em posição de guarda é sempre seu punho esquerdo que está na frente: o primeiro direto deixa seu adversário zonzo, seguido por um poderoso cruzado de direita, que o derruba. É o que deve ser o segundo capítulo: um golpe de direita no maxilar dos seus leitores.”

“- Se os escritores são criaturas frágeis, Marcus, é porque são passíveis de conhecer dois tipos de sofrimentos sentimentais, ou seja, duas vezes mais que os seres humanos normais: as dores de amor e as dores literárias. Escrever um livro é como amar alguém: pode acabar sendo muito doloroso.”

“- Harry, como ter certeza de que ainda temos forças pra escrever?
– Alguns têm, outros não. Você terá, Marcus. Sei que terá.
– Como pode estar tão certo disso?
– Porque está em você. Como se fosse uma doença. Pois a doença dos escritores, Marcus, não é não poder mais escrever: é não querer mais escrever e ser incapaz de parar.”

“- Harry, de quanto tempo precisamos para escrever um livro?
– Depende.
– Depende de quê?
– De tudo.”

“- O que acha disso?
– Nada mal. Mas acho que você dá muita importância às palavras.
– Às palavras? Mas elas são importantes quando escrevemos, não?
– Sim e não. O sentido da palavra é muito mais importante do que a palavra em si.
– Aonde quer chegar?
– Muito bem, uma palavra é uma palavra e as palavras pertencem a todos. Basta abrir um dicionário e escolher uma. É nesse momento que a coisa fica interessante: será capaz de dar a essa palavra um sentido bem específico?
– Como assim?
– Pegue uma palavra e repita-a em um de seus livros, a qualquer propósito. Vamos escolher uma palavra qualquer: gaivota. As pessoas passarão a falar, referindo-se a você: ‘Sabe o Goldman? É aquele cara que fala das gaivotas’. E depois chegará o momento em que, ao avistarem gaivotas, essas mesmas pessoas subitamente começarão a pensar em você. Observarão aquelas reles aves estridentes e dirão: ‘Fico me perguntando o que o Goldman viu nesses bichos.” Em seguida, associarão gaivotasGoldman. E todas as vezes que avistarem gaivotas, pensarão no seu livro e em toda a sua obra.  Não perceberão mais essas aves da mesma maneira. É nesse momento que você descobre que está escrevendo alguma coisa. As palavras são de todo mundo, até que você prova ser capaz de apropriar-se delas. É isso que define um escritor. E você vai ver, Marcus, haverá quem tente convencê-lo de que um livro tem a ver com palavras, mas não é assim: na verdade, um livro tem a ver com pessoas.”

“- Harry, como podemos transmitir emoções que nunca vivemos?
– Este é justamente o trabalho de escritor. Escrever significa que você é capaz de sentir mais intensamente que os outros e em seguida transmitir o que sentiu. Escrever é permitir que seus leitores enxerguem o que às vezes é invisível para eles. Se apenas os órfãos contassem histórias de órfãos, teríamos dificuldade em sair do mesmo lugar. Isso significaria que você não poderia falar de mãe, pai, cachorro ou piloto de avião, nem da Revolução Russa, porque você não é mãe, nem pai, nem cachorro ou piloto de avião, e não estava lá durante a Revolução Russa. Você é simplesmente Marcus Goldman. E, se todo escritor fosse obrigado a limitar-se a si mesmo, a literatura seria de uma tristeza terrível e perderia todo o sentido. Nós temos direito de falar de tudo, Marcus, de tudo o que nos toca. E ninguém pode nos julgar por isso. Somos escritores porque fazemos de maneira original algo que todo mundo à nossa volta sabe fazer: escrever. É nisso que reside toda a sutileza.”

“- Um novo livro, Marcus, é uma nova vida que começa. É também um momento de grande altruísmo: você oferece, a quem estiver disposto a conhecer, uma parte sua. Alguns vão adorar, outros, detestar. Alguns vão tratá-lo como celebridade, outros, desprezá-lo. Alguns sentirão inveja, outros terão interesse. Não é para eles que você escreve, Marcus. E sim para todos aqueles que, graças a Marcus Goldman, terão tido um bom momento em seu dia a dia. Você me dirá que isso não é nada de mais e, tão obstante, já é muito. Alguns escritores querem mudar o mundo. Mas quem realmente pode mudar o mundo?”

Related posts

Novela de Thomas Mann: o fascismo é capaz de hipnotizar?

8 curiosidades sobre o escritor Eduardo Galeano

Ambição, Poder e Destino: Anakin Skywalker, o Macbeth de Star Wars?