Os 4 melhores poemas de Edoardo Sanguineti

Edoardo Sanguineti foi um poeta e escritor italiano, sendo um dos principais teóricos do chamado Grupo 63, parte da poesia de vanguarda do país. Também foi crítico literário, autor de peças teatrais, ensaios e professor de literatura das universidades de Torino, Salerno e Gênova.

Grande parte de sua atuação foi no front da batalha cultural iniciada com as experiências vanguardas dos anos 60. A sua principal obra é Laborintus, em 1956, tendo também outras publicações como Erotopaegnia (1960), Wirrwarr (1972), Due Ballate (1984), Novissimum Testamentum (1986), Corollario (1997). Reuniu toda sua poesia no volume Mikrokosmos. Poesie 1951-2004. O poeta morreu em Gênova, sua cidade natal, em 18 de maio de 2010, aos 79 anos de idade. 

O NotaTerapia separou os 4 melhores poemas do autor:

em ti dormia como um fibroma enxuto, como uma tênia magra,
[um sonho;
agora pisa o pedrisco, agora espanta a própria sombra; agora grita
deglute, urina, tendo sempre esperado o gosto
da camomila, a temperatura da lebre, o rumor do granizo,
a forma do teto, a cor da palha:
………………….sem remédio o tempo
voltou-se para os seus dias; a terra oferece imagens confusas;
saberá reconhecer a cabra, o camponês, o canhão?
não estas tesouras realmente esperava, não esta pera,
quando tremia naquele teu saco de membranas opacas.

***

Que podia fazer ou dizer, Vasko, quando aquela séria Shirley
Temple em tecnicolor me alcançou correndo pela Lijnbaan, agitando
a cauda ruiva, e rindo ? de repente senti as suas presas
— como se diz — no coração:
                                      tem a minha caveira entre as patas, mas sua cara, agora, está limpa: e suga minha espinha dorsal sobre este deserto de Roterdã, dentro deste Number One, neste literary supper: é uma coisa (ela) do género Holbein d. J. (penso em Portret van een onbekende wrouw): não tão bem feita, é claro, mas
é mais magra: e com o morcego na cabeça, por exemplo: e sem todo aquele véu amarelo: também lhe perguntei o nome (você também ouviu): uma palavra como Inneke,
creio:
         e depois, que poderia escrever mais, se devo ainda discutir
até às seis da manhã, no quarto 348,com o europeu Tchicaya.

com Breyten, com você? (não consigo nem mesmo telefonar a minha mulher, e nem acabar as Afinidades eletivas): e tenho ainda um par de espinhas na cara:
Tradução de Ivo Barroso

**

Já não saberei escrever-te uma carta infinita, em folhas de papel de escola com pautas regulares, com frisos a lápis de cor azul e rosa, guirlandas de corações e flores, cheia de D maiúsculos (em vez de   Du, de
     Dein), de fúr uns sublinhados com força:
                            (uma carta como aquela que bisbilhotávamos outro dia, nas mãos
                            de dois meninos educados, no andar superior de um ônibus 94):

nem mesmo que fosses aquela minúscula pseudo
havaiana berlinense sem seios, sem sutiã, que se exibia incautamente para nós: (para nós, sentados a sugar um milk-shake de banana, sob uma bandeirinha com a legenda “EIS”, num sorveteiro galante que parecia um açougueiro):
                   mesmo se eu fosse aquele fauno obsceno de meia-idade que eu, agora, de fato sou:
                                      olha-me no rosto, pelo menos enquanto me cortas os cabelos na varanda, que ali estou de peito nu, ao vivo sol do meio-dia, ao vento:
                                  eu que me imaginava igual a um Hoffmann em delírio: e sou quase o sósia de um medíocre cômico inglês:

Tradução de Ivo Barroso

**

de Reisebilder [Fotos de viagem]

à funcionária da aduana em minissaia, que me escolheu com seus
[olhos de sibila
e de pomba, de dentro de uma fila interminável de viajantes em
[trânsito, eu disse
toda a verdade, confinado num séparé-confessionário de madeira
compensada:
……………..disse que tenho um filho que estuda russo e alemão;
que Bonjour les amis, curso de língua francesa em 4 volumes, era
para minha mulher;
……………..e estava pronto a dizer mais: sabia que foi
[Rosa Luxemburgo
quem lançou a palavra de ordem “socialismo ou barbárie”; e podia
fazer disso um madrigal estrepitoso:
……………………mas suava, vasculhando os bolsos,
buscando em vão a conta do Operncafé; e então você irrompeu
arrastando atrás de si até os meninos, maravilhosos e maravilhados:
(a expulsávamos com os mesmos gestos duros, eu e minha beatriz
democrática de farda):
……………..mas para mim o irreparável já se tinha consumado,
ali, na fronteira entre as duas Berlins: quarentão aos pés da guarda.

(tradução de Maurício Santana Dias)

Fonte
Fonte
Fonte

Related posts

Livro do mês da Editora Funilaria, “Ninguém matou Suhura”, da moçambicana Lília Momplé, com 40% de desconto

“Caderno Proibido”: o PROIBIDÃO nas cartas de Alba de Céspedes

“Açougueira”, de Marina Monteiro: cutelo, sangue e carne barata em reflexões acerca da condição da mulher