A escritora Vivian Gornick só viu o seu reconhecimento como escritora depois dos 80 anos de idade. Aí você pode pensar “antes tarde do que nunca”, mas pelo menos não é isso que ela pensa. Como a autora disse: ‘O que me tira do sério é ter ficado rica só agora’.
Aos 88 anos, escritora conta como foi a redescoberta da sua obra pelo novo movimento feminista, que rendeu a reedição de livros e prêmios. Uma mulher singular”, de 2015, acaba de sair no Brasil.
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Ao Jornal O Globo ela desabafou:
— Eu preciso te contar: mais do que as reedições e todo este fuzuê, o que me tira mesmo do sério é ter, a esta altura da vida, ficado rica. Como sempre vivi na falta dele, não sei o que fazer com dinheiro. É muito tarde, aos 88 anos, pra mudar meu estilo de vida, mas já pego táxi quando chove e não preciso mais escolher o prato mais barato do cardápio. Pequenas liberdades nas coisas que podem fazer a vida parecer mesquinha. É um bom começo? — pergunta.
A história de Vivian não foi das mais fáceis. Ela cresceu pobre, do lado de lá do Rio Harlem, em projeto habitacional no Bronx que no período entre guerras tinha como moradores, em sua maioria, imigrantes judeus.
Seus pais, de origem ucraniana, eram operários marxistas. Vem daí, arrisca, a urgência de sua escrita. As argamassas da celebrada obra memorialística são frases curtas, muxoxos aparentemente sem sentido e imagens nítidas do universo que é Nova York.
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Sobre Uma mulher singular
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Espécie de sequência natural de Afetos ferozes, este Uma mulher singular é um mapa fascinante e comovente de ritmos, encontros casuais e amizades em constante mudança que compõem a vida na cidade, neste caso, Nova York. Enquanto passeia pelas ruas de Manhattan ― novamente na companhia da mãe ou sozinha ―, Vivian Gornick observa o que se passa à sua volta, interage com estranhos, intercala anedotas pessoais e meditações sobre a amizade, sobre a atração (tantas vezes irreprimível) pela solidão e também sobre o que significa ser uma intelectual feminista num mundo frequentemente hostil às mulheres e sua luta por autonomia.
Gornick explora como os afetos a forjaram, mesmo sendo tão independente, em uma cidade que, aliás, parece de alguma forma espelhar sua busca pessoal: a Nova York destas páginas transpira a aspereza e o orgulho típicos de uma metrópole, mas também oferece uma miríade de afetos para todos os gostos.
Escrito como uma colagem narrativa que inclui peças meditativas sobre a formação de uma feminista moderna, o papel do flâneur na literatura e a evolução da amizade, Uma mulher singular é também um dos últimos trabalhos de tradução empreendidos por Heloisa Jahn ― uma das grandes editoras e tradutoras do país, leitora onívora e generosa, responsável por apresentar diversos autores ao público brasileiro e que sempre viveu rodeada de afetos ―, morta em 2022.
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