Soldados da Borracha (2019) homenageia heróis brasileiros anônimos da Segunda Guerra Mundial

Nas aulas de História na escola, em geral, não encontramos logo de cara uma lição sobre a História da Amazônia. Legada quase por completo aos espanhóis no Tratado de Tordesilhas, é no Brasil Império que ela passa a ser nossa, e nos primeiros anos do Brasil República, ela aparece nas lições como palco do ciclo da borracha. Mas nem todas as histórias da História são ensinadas em sala de aula, e para suprir essa necessidade de contar relatos existe o cinema – e para homenagear heróis brasileiros anônimos da Segunda Guerra Mundial existe o documentário Soldados da Borrracha (2019, direção de Wolney Oliveira).

No contexto da Segunda Guerra Mundial, a borracha era recurso de suma importância, e os Aliados (França, Inglaterra e União Soviética, mais os Estados Unidos) estavam perdendo. Com plantações asiáticas, nas quais se extraía o látex, nas mãos do Eixo (Alemanha, Itália e Japão), fazia-se mister economizar toda borracha possível, incluindo a encontrada em miudezas como brinquedos e pneus de bicicleta. Isso mudaria quando o Brasil entrou na guerra, contra Itália e Alemanha e do lado dos EUA.

Com base operacional em Fortaleza, foi criado um órgão especial para incentivar trabalhadores a irem para a Amazônia extrair látex. Cartazes coloridos, feitos por um artista que nunca havia visto uma seringueira, atraíam com promessas de riqueza e abundância. Se para o Rio de Janeiro iam os pracinhas da FEB – Força Expedicionária Brasileira – para a Amazônia iam os soldados da borracha do SEMTA – Serviço Especial de Mobilização dos Trabalhadores para a Amazônia.

O alistamento era mais forçado que voluntário e a jornada do Nordeste à Amazônia, cheia de percalços. Era preciso ser jovem, corajoso e inteligente para encarar um local infestado de cobras e jacarés, além dos índios canibais. A travessia poderia durar um ano ou mais, e as vítimas de doenças como a malária eram muitas. As promessas de tratamento médico e odontológico, obviamente nunca cumpridas, causavam alguma revolta, mas não o suficiente para haver mudanças.

Surpreendentemente, são muitos os sobreviventes do período que o documentário conseguiu entrevistar. Uma delas, mulher-soldado, canta uma canção de enaltecimento à vitória que se aproximava. Minutos depois, a mesma canção é ouvida na trilha sonora. Outro entrevistado relata as péssimas condições de trabalho e, entre lágrimas, rememora como foi enterrar o pai entre as seringueiras.

Alguns viam a realidade como uma prisão, outros não se arrependeram de terem se tornado soldados da borracha e outros ainda se acostumaram com as muitas dificuldades. Se o Rio de Janeiro parou para dar as boas-vindas aos pracinhas que voltavam da Europa e ainda hoje continuam as homenagens aos que lutaram na FEB, os soldados da borracha não receberam o devido reconhecimento pelo serviço prestado. Mas para isso existe o cinema: se não para compensação monetária, ao menos para reparação histórica. Os soldados da borracha merecem ter sua história contada e conhecida por todos – e o documentário de mesmo nome, agora que se completam 80 anos do fim da Segunda Guerra Mundial, é um bom ponto de partida.

Revisado por Mariana Perizzolo

“Soldados da Borracha” entra na programação do Canal Brasil no segundo semestre de 2025. Confira o trailer:

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