“Barba ensopada de Sangue” (2024): filme de Aly Muritiba é um olhar para ancestralidade

Com adaptação do livro Barba Ensopada de Sangue de Daniel Galera, Aly Muritiba apresenta ao público da Mostra Internacional de Cinema em São Paulo um de seus trabalhos mais bonitos e complexos.

Ao assistir filmes como Barba Ensopada de Sangue eu me questiono de quais são as delícias e angústia de realizar uma adaptação de um livro para o cinema, e ainda mais um best-seller de Daniel Galera. Recentemente tive contato com a escrita de Galera, e fiquei extasiado como ele consegue abordar a complexidade da vida humana, e nos envolver numa trama que nos deixa sem fôlego, colocando sempre de uma forma linda na história o cerne de nossas angústias, algo que Aly Muritiba busca desenvolver durante a narrativa do filme.

Na história de Barba Ensopada de Sangue, um homem jovem viaja para uma cidade no litoral sul do Brasil em busca de respostas sobre seu passado. Ao chegar na casa abandonada de seu avô, conhecido como Gaudério, ele se depara com uma hostilidade de uma comunidade ferida, que transfere a raiva de seu avô a Gabriel.

Barba Ensopada de Sangue tem um olhar generoso para a ancestralidade e reprodução de padrões, ao colocar o narrador questionando o tempo todo quem era esse patriarca, e se ele realmente tinha essa crueldade que a vila conta.

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O elenco é muito bem escalado com nomes como Gabriel Leone, Thainá Duarte, Ivo Müller, Roberto Birindelli e Teca Pereira, que contribuem brilhantemente para o desenvolvimento da história. Leone, como o ator técnico que é, desenvolve bem o fardo de ser um protagonista complexo, com suas angústias e peso do passado. Já Thainá Duarte desaparece totalmente para dar vida a Jasmin, ela está imersa na história, nos costumes e nos desejos de sua personagem. A química entre os dois funciona, mas acredito que assim como a brisa do mar não é o suficiente para apagar uma chama, a química entre os dois seja somente isso, uma brisa. Vale a pena destacar Roberto Birindelli que apesar do pouco tempo em tela, acalenta o público com suas lembranças infantis, de um tempo em que se sentavam em volta de uma fogueira para contar histórias.

Em termos de direção, Aly Muritiba responde ao público porque é um dos principais diretores brasileiros contemporâneos. Tecnicamente o filme é impecável, a escolha estética é linda, a fotografia é ótima, a trilha sonora é sutil e uma montagem muito bem executada, isso tudo contribui muito para a poética dessa história, e para apresentar ao público o conflito de sua personagem principal.

Ailton Krenak em seu livro O Futuro é Ancestral desenvolve um pensamento central onde, o futuro é ancestral e a humanidade precisa aprender com ele a pisar suavemente na terra, e acredito que de uma certa forma Barba Ensopada de Sangue constrói uma narrativa olhando para essa ancestralidade e buscando uma quebra de padrões. O filme é muito bem executado, os atores são brilhantes, o roteiro funciona, mas eu gostaria de ver mais! Eu gostaria de ver mais sobre esse conflito interno, sobre essa dinâmica social, um filme talvez, e somente talvez, não seja o suficiente para contar uma história tão complexa e brilhante.

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