Quando falamos do gênero “distopia” na literatura, sempre pensamos em histórias ambientadas em um lugar futurístico, onde a maioria vive em condições de extrema opressão e medo, sem liberdade, e a minoria é quem conduz o Estado. Exemplos temos de sobra: “1984”, de George Orwell; “Fahrenheit 451”, de Ray Bradbury; “O conto da Aia”, de Margaret Atwood; “Jogos vorazes”, de Suzanne Collins. Se junta agora a este grupo o novo, ou tão novo assim, livro de Stefano Volp: “O segredo das larvas”.
Por mais que trate de um mundo no futuro, percebemos nas distopias questões do nosso presente. A censura aos livros, a vigilância constante e desnecessária, e a retirada dos direitos das mulheres são, infelizmente, temas ainda presentes no nosso dia a dia. E Volp oferece em seu livro um assunto pouco discutido no gênero: a questão racial.

“O segredo das larvas” narra a história de Freya, uma jovem que vive em um Brasil diferente. Após o “Breu”, um apagão geral de energia elétrica, a sociedade se estabeleceu de uma forma diferente: temos uma capital, entitulada de Éden, dominada por pessoas brancas, e as colônias, para onde foram enviadas todas as pessoas de cor de pele preta.
Periodicamente, as colônias recebem um evento chamado “Filtragem”, onde 14 meninas são escolhidas para se mudarem para a capital, sempre as mais bonitas. Porém, nenhuma delas nunca voltou, exceto uma, com a língua cortada. Esta é a mãe da nossa protagonista, Freya.
Freya busca, assim, compreender o que ocorreu com sua mãe. Por isso mesmo, ela faz de tudo para nunca ser enviada para o Éden, ao mesmo tempo que possui um sentimento de vingança contra os que maltrataram sua mãe. Ela sabe que nada de bom acontece na capital.
Qual será o destino de Freya? Em 403 páginas, para ser exata, Volp oferece uma história recheada de aventura, história e questões relevantes para a sociedade. Temas relevantes como preconceito racial, fundamentalismo religioso, exploração sexual e censura são debatidos na perspectiva de personagens bem construídos.
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A leitura de “O segredo das larvas” é rápida, assim como o enredo. Claramente o autor tem como inspiração outros livros contemporâneos do mesmo gênero, mas confesso que fui surpreendida em vários momentos, em uma narrativa que não enrola. Estamos a todo momento em movimento.

Diria que um dos pontos negativos, inclusive, seria o final, que para mim ficou um pouco apressado e aberto. Algumas perguntas foram respondidas, mas muitas ainda ficaram no ar. Porém, acredito que tenha sido uma opção de Volp. Como primeiro livro de uma trilogia, é necessário manter essa dinamicidade e, neste ponto, o autor acerta. Impossível terminar de ler sem querer ter em mãos os próximos livros.
O livro foi publicado por Volp anteriormente como autopublicação e, agora, chega em versão física pelas mãos da Galera, selo da Record que tem como público alvo o público jovem-adulto.
Pensar que meninas pretas poderão se ver representadas na literatura por uma heroína forte e inteligente, como eu me reconheci na minha adolescência ao ler sobre Katniss Everdeen, me deixa contente. A bibliodiversidade é necessária! Falar sobre tudo e sobre todos. Queremos que todos sejam abraçados pela literatura.