Sei das coisas por estar vivendo.
Clarice Lispector
Leia AQUI 10 frases inspiradoras de “A Hora da Estrela”
Certamente não é o tamanho de uma obra que define sua grandeza. A Hora da Estrela é a prova viva disso. Uma das mais instigantes obras de Clarice Lispector, não é a toa que a autora deu múltiplos títulos ao livro: afinal, ele aborda tanto, ao mesmo tempo, e de maneira tão singela, que não há título que dê conta de A Hora da Estrela.
A história de Macabéa nos faz compreender que estamos todos fadados a viver a sós com nossos próprios caóticos acasos. Em determinado momento da história dessa alagoana em São Paulo, Macabéa é convidada por Glória para tomar um café em sua casa. Acostumada a comer cachorro quente, sanduíche de mortadela, café e refrigerante, e tendo vivido as dores e dificuldades da pobreza, seu encontro com a mesa de Glória escancara a desigualdade e tensas questões de classe, raça e território. A comida, assim como no caso de O Sol é Para Todos (que já passou pelo nosso Menu Literário), é o que dá o ponta pé para que mergulhemos em inúmeras outras questões que vão muito além dela mesma.
Glória, querendo compensar o roubo do namorado da outra, convidou-a para tomar lanche da tarde, domingo, na sua casa. Soprar depois de morder? (Ah que história banal, mal aguento escrevê-la)
A Hora da Estrela, Clarice Lispector
E lá (pequena explosão) Macabéa arregalou os olhos. É que na suja desordem de uma terceira classe de burguesia havia no entanto o morno conforto de quem gasta todo o dinheiro em comida, no subúrbio comia-se muito. Glória morava na rua General não-sei-oquê, muito contente de morar em rua de militar, sentia-se mais garantida. Em sua casa até telefone tinha. Foi talvez essa uma das poucas vezes em que Macabéa viu que não havia lugar no mundo e exatamente porque Glória tanto lhe dava. Isto é, um farto copo de grosso chocolate de verdade misturado com leite e muitas espécies de roscas açucaradas, sem falar num pequeno bolo. Macabéa, enquanto Glória saía da sala — roubou escondido um biscoito. Depois pediu perdão ao Ser abstrato que dava e tirava. Sentiu-se perdoada. O Ser a perdoava de tudo.
No dia seguinte, segunda-feira, não sei se por causa do fígado atingido pelo chocolate ou por causa de nervosismo de beber coisa de rico, passou mal. Mas teimosa não vomitou para não desperdiçar o luxo do chocolate.
Nós amamos tanto este livro aqui em casa que, como você vai ver nas fotos, temos duas edições. Quando juntamos as escovas de dente, nenhum dos dois quis se desfazer da sua edição, por isso mantivemos ambas! É isso que acontece quando duas pessoas amantes de livro resolvem dividir o mesmo teto…!
No Menu Literário de hoje, fizemos um café inspirado na cena acima. Com bolo, roscas açucaradas, biscoitos e chocolate quente, imaginamos e inventamos uma mesa de café da Glória, que tanto fez Macabéa arregalar os olhos. E dessa vez, teremos não uma, mas DUAS receitas!
ROSQUINHAS AÇUCARADAS DA GLÓRIA
Essas rosquinhas são simplesmente deliciosas. Doces na medida certa, elas parecem ter saído de uma padaria de bairro, dessas que fazem tudo em pequena escala e com muito amor, sabe? Além de que essa massa tem uma textura incrível de trabalhar e rende muito: com essas quantidades, você faz 70 rosquinhas!
Vamos aos ingredientes:
Rosquinhas:
- 3 1/4 xícaras de farinha de trigo
- 2 ovos
- 1/2 xícara de leite
- 1/2 xícara de óleo
- 1/2 xícara de açúcar + 1 colher de sopa
- 1/2 pacote de fermento biológico instantâneo (ou 15g de fermento biológico fresco)
- 1 pitada de sal
Calda:
- 1 xícara de açúcar
- 3/4 xícara de água
Modo de preparo:
1- Em uma tigela, coloque o leite morno, o fermento, 1 colher de sopa de açúcar e 1 colher de farinha. Deixe descansar por 10 minutos, para fermentar, até ficar esponjoso. Lembrando que leite morno não é leite quente! Tem que estar em uma temperatura em que você consiga colocar seu dedo e mantê-lo por alguns segundos sem se queimar.
2- Adicione os ovos, o sal, o açúcar e o óleo. Misture bem. Acrescente a farinha aos poucos, até a massa parar de grudar nas mãos. Farinha é uma coisa complicada de dizer medidas exatas, porque cada marca e a umidade do dia e da sua cozinha vão demandar quantidades diferentes. Tome a medida dessa receita como guia e acrescente aos poucos; pode ser que você precise de um pouco menos ou um pouco mais.
3- Deixe a massa descansando por 1 hora ou até que ela dobre de tamanho.
4- Após o descanso, sove a massa por aproximadamente 5 minutos, até que ela fique lisa e elástica.
5- Modele as rosquinhas. Para isso, você irá pegar uma pequena quantidade de massa e abrir em uma bancada uma cobrinha, como na foto.
6- Corte a cobrinha na metade e faça um círculo, enrolando uma das pontas por dentro do círculo, até que ela fique como na foto abaixo.
7- Em forno pré-aquecido a 180ºC/200ºC, asse por aproximadamente 10-12 minutos, até que elas fiquem douradas. Fique de olho, porque a temperatura vai depender do seu forno.
8- Quando terminar de assar as rosquinhas, faça a calda. Em uma panela, acrescente a água e o açúcar e deixe dissolver, fervendo por mais ou menos 5 minutos. Para saber o ponto certo: você vai ver que a calda estará borbulhando nos cantos da panela, e quando você pegar um pouco com a colher, ela vai demorar a escorrer, mas ainda estará bastante líquida. Jogue as rosquinhas aos poucos nessa calda, virando-as dos dois lados, e reserve-as. Antes de servir (espere um pouquinho para que a calda esfrie!), polvilhe açúcar por cima para dar aquela cara de doce de padaria. Elas ficam maravilhosamente brilhantes!
Também fizemos biscoitos amanteigados de chocolate. Essa receita é muito simples, rápida e gostosa – e não é minha, mas sim da minha diva maior da cozinha, Rita Lobo, do site Panelinha. Ela chama de biscoitos 1, 2, 3, e você vai entender o porquê agora:
BISCOITOS AMANTEIGADOS DE CHOCOLATE
Ingredientes:
- 100g de açúcar (1/2 xícara de chá)
- 200g de manteiga
- 300g de farinha de trigo (2 xícaras + 2 colher de sopa)
- 1 colher de sopa de chocolate em pó
Entendeu o 1,2,3? São 100g de açúcar, 200g de manteiga e 300g de farinha. Só isso! Eu adicionei o chocolate, mas sem ele também fica uma delícia. Você só precisa misturar todos os ingredientes, deixar eles descansando na geladeira por 10 minutos antes de modelar, fazer as bolinhas (ou o formato que preferir) e assar por aproximadamente 10-15 minutos em fogo pré aquecido a 180ºC. Essa receita rende 40 biscoitinhos, mais ou menos. E pra deixar essas ranhuras bonitinhas é só você apertar um garfo nas bolinhas antes de assar.
No nosso café, teve também o bolo que é referido na cena do café da Macabéa. Por aqui, foi um bolo de cenoura – receita de família e, na minha modesta opinião, o melhor bolo de cenoura que existe! Quem quiser a receita dele pode escrever um email pra gente (notaterapia@gmail.com). Também teve o chocolate quente, mas foi feito com chocolate em pó ao invés do chocolate de verdade que impressionou a Macabéa. E teve também um misto quente, porque senão ia ser doce atrás de doce!
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