“Sol de inverno” (2024): filme de amadurecimento retrata dor silenciosa de ter que se esconder

Sol de inverno (ぼくのお日さま) é um filme japonês de 2024 sobre dois adolescentes e um gosto em comum: a patinação artística no gelo. Escrito e dirigido por Hiroshi Okuyama (Makanai: Cozinhando para a casa Maiko, 2023), o drama é um longa contemplativo e silencioso sobre questões de amadurecimento. Adornado por belas imagens do inverno japonês, o filme apresenta seu enredo de forma livre e simples, deixando ao espectador a liberdade de entender sua narrativa da forma que preferir.

Distribuído no Brasil pela Sato Company, Sol de inverno teve seu lançamento no cinema de rua da Liberdade, em São Paulo, na última quinta-feira. Devo dizer que foi até uma surpresa saber que o filme teria um lançamento físico no Brasil, visto que se trata de uma produção independente e que não teve grande apelo ao público nem mesmo em seu país de origem.

Partindo para os pontos relevantes da narrativa, Sol de inverno, como mencionado anteriormente, é um filme silencioso e bastante contemplativo. Em seu início, acompanhamos o jovem Takuya (Keitatsu Koshiyama) em seus dias longos e entediantes como atleta de hóquei no gelo em seu colégio. O garoto, que sofre de gagueira, se vê em um universo que não lhe agrada, sofrendo, algumas vezes, a pressão por parte de seu treinador e equipe por conta de seu não comprometimento com o time de hóquei. Em contrapartida, Sakura (Nakanishi Kiara) é uma patinadora singular, porém silenciosa e um pouco apática também, mas que desempenha seu papel com maestria, com a ajuda de seu treinador Arakawa (Sosuke Ikematsu).

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A narrativa começa a se desenrolar a partir do momento em que Arakawa vê Takuya tentando patinar no gelo e enxerga potencial no garoto, tendo a ideia de treiná-lo para formar uma dupla de dançarinos com Sakura. Em meio ao ambiente escolar, que é o principal espaço apresentado no longa-metragem, somos apresentados à vida particular deste treinador, que um dia também foi um excelente patinador a nível mundial e agora se “esconde” no interior do Japão, dando aulas em um colégio pequeno.

À medida que vamos conhecendo um pouco melhor estes três personagens, a ideia do roteiro – ou o que acredito ter sido a sua ideia – começa a fazer certo sentido. Acredito que o tema abordado aqui seja bastante relevante, e o caminho seguido pelo texto do filme também apresenta potencial, porém, parece haver um certo medo de se aprofundar nos personagens. Sabemos pouco ou quase nada deles, ainda que haja uma certa apresentação de seus ambientes familiares etc.

A narrativa que se arrisca a pincelar por altos a temática LGBTQIA+ não é falha, porém, lhe falta algo em relação à representatividade. Um ponto importante que gostaria de destacar, é o fato de Sosuke Ikematsu (Shin Kamen Rider, 2023), um ator relativamente conhecido do Japão, estrelar esse filme. De certa forma, Sol de inverno se assemelha a outros filmes asiáticos de temática parecida como o sul-coreano A distant place (2020) – remake do japonês His (2020). A sensação que fica, após assistir a esses dramas, é a de que a vontade de representatividade não falta, porém, há o receio relativo à aceitação desse tipo de narrativa e as possíveis represálias da mídia e até mesmo do público. Infelizmente, quem paga o preço somos nós, espectadores.

Quanto ao enredo de Takuya e Sakura, essa é, talvez, a parte menos impactante do filme. Apesar de o enfoque da narrativa ser entre os três personagens e a relação que acaba se desenrolando entre eles, em certos pontos ela se torna um tanto entediante e, embora haja um conflito nessa relação – conflito esse que é o auge da narrativa –, durante as cenas desses personagens jovens, eu acabava ansiando que a história se voltasse ao seu treinador novamente.

Embora haja esses pequenos desconfortos em relação ao que já foi discutido aqui, Sol de inverno não é um filme ruim. Analisando a partir do que se propõe a fazer, a produção de Hiroshi Okuyama alcança seu objetivo, ainda que a história apresentada não guarde nenhuma surpresa para o seu espectador. A experiência agridoce do enredo do filme se iguala a sensação após assisti-lo. Algumas das “falhas” percebidas aqui, infelizmente não são por conta da direção ou mesmo dos atores, mas da mentalidade ainda atrasada de uma parte do público. Sendo assim, não há espaço nesta crítica para culpar o filme.

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