Após sua estréia no Festival de Cannes este ano, críticas ferozes foram escritas sobre Horizon – Uma Saga Americana, épico de faroeste que Kevin Costner bancou do próprio bolso, além de dirigir e estrelar o projeto. “Conservador”, “regressivo” e “maniqueísta” foram algumas das palavras utilizadas para descrever o projeto.
Sendo franco, basta ver a meia hora inicial para entender o porquê dessas descrições, com a grande sequência da abertura do filme sendo um massacre cometido por nativos americanos em um assentamento de colonos. Mulheres e crianças são assassinadas a sangue frio, enquanto famílias inteiras vêem seus lares sendo destruídos nas chamas, e precisam se esconder de seus algozes nas montanhas próximas. A cena não poupa esforços em mostrar a brutalidade do ataque e a devastação que deixou, com os sobreviventes buscando colher os cacos de suas vidas no dia seguinte.
Dizer que a cena pinta os nativos americanos de modo ruim é eufemismo, e se for levar em consideração somente esse momento, os detratores de Horizon tem toda razão, e o filme realmente possui uma visão antiquada do mítico Velho Oeste. A questão é que há muito mais na trama depois disso, e inclusive ele se encerra com uma situação inversa: o massacre de mulheres e crianças nativas pelas mãos de homens brancos.
Entre esses dois momentos emblemáticos, há uma série de situações mostrando o que Costner de fato quer fazer com seu projeto de quatro partes, uma grande história sobre a América como uma terra para todos, que pode proporcionar, em partes iguais, oportunidade e violência. É uma visão ingênua e simplista? Certamente, mas ele tem o direito de exercê-la, e cabe a nós, críticos, encará-la tal como ela é, e não o que gostaríamos que fosse. Uma atitude saudável, mas que talvez gere menos engajamento nas redes sociais.
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Até dentro dessa visão, é possível apontar que certas escolhas feitas para construir nuances nessas situações mais extremas são desengonçadas. O roteiro coloca na boca de um personagem o recado de que “nem todos os nativos são iguais”, somente para, na cena seguinte, mostrar exatamente isso, que o ataque aos colonos foi fruto de jovens nativos indignados, e são punidos pelos anciãos.
Há um evidente esforço de mostrar essa América germinal como um espaço cosmopolita, onde pessoas de diversos lugares irão, talvez, encontrar seu espaço ao sol. Além dos colonos e nativos, há a presença de personagens britânicos e a imigração chinesa também tem seu espaço, embora pareça ser algo que irá ser desenvolvido na vindoura parte dois. Nesse sentido, Horizon parece uma extensão natural do que Costner tentou fazer em Dança Com Lobos, mas abrangendo a relação de vários grupos, não somente de um protagonista com uma comunidade nativa. Na verdade, são tantos núcleos na produção que é até difícil definir um protagonista.
O que não é necessariamente ruim, pelo contrário, o escopo narrativo do longa ajuda a fornecer um senso de escala aos acontecimentos. Acompanhamos personagens se deslocando por diversas partes do território americano, em busca de objetivos variados. Matthew (Luke Wilson), por exemplo, é líder de uma caravana, e precisa mediar os conflitos que surgem ao longo da jornada. Já Hayes (Costner) se envolve sem querer em uma briga familiar, e vai ajudar Marigold (Abbey Lee Kershaw) a proteger o bebê de Lucy (Jena Malone), que está sendo caçada por sua antiga família.
Para acompanhar a escala da trama, Horizon aposta visualmente nos grandes campos abertos dos Estados Unidos, que com frequência tornam diminutos os personagens que atravessam essas paisagens. A grande caravana que transformará a vida de centenas de pessoas é uma pequena marca nos ambientes desérticos e rochosos que os cercam.
Esse tamanho todo impressiona, mas também atrapalha. Há uns 4 ou 5 filmes dentro desta primeira parte, e a sensação que fica é de um gigantesco episódio piloto, pois nenhuma das histórias parece avançar muito além dos seus respectivos primeiros atos. Mas é um piloto interessante, e em tempos onde filmes descritos como “grandiosos” ou “épicos” são nada mais do que uma cacofonia de efeitos especiais produzido às pressas, é um alívio ver um filme verdadeiramente grandioso. Horizon, assim como a América que retrata, é mais promessa do que outra coisa, mas é uma boa promessa.