Foi em 1915 que Franz Kafka publicou “A Metamorfose”, a história de um homem que se transformou em um monstro (eu pessoalmente imagino uma barata) e teve que se adaptar a essas condições nada confortáveis. Uma metáfora divertidamente assombrosa sobre a condição humana. Porém, em 1901, o francês Han Ryner já havia escrito um livro, entitulado originalmente de “The Human Ant” ou “O Homem-Formiga”, com uma proposta bem parecida.
Publicada pela primeira vez no Brasil pela editora Ercolano (@ercolanoeditora), neste livro o personagem principal é Octave Pédidant. Funcionário de um cartório de registros e em um casamento tedioso, ele não possui perspectiva para o futuro. Até que um dia é abordado por uma fada (sim, uma fada) que acaba o transformando em uma formiga por um ano. A partir deste momento, ele se vê em uma condição muito diferente da realidade humana. Afinal, esse bichinho parece frágil e pequeno, mas consegue carregar 20 vezes o seu próprio peso e, ao trabalhar em equipe, conquista todos os seus objetivos.
Mesmo transformado, Octave continua a ter pensamentos e reflexões humanas que constantemente entram em conflito com sua mente de formiga operária. Ele não possui asas, ou seja, é estéril, e sua função na colônia é trabalhar para o bem comum, seja protegendo o formigueiro, cuidando das rainhas e das ninfas ou produzindo os alimentos.
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De todos os pontos interessantes que o livro oferece, dois me chamaram atenção, ficando explícito o desejo do autor em fazer uma comparação com a sociedade capitalista e conservadora em que vivemos.
O primeiro é a questão do trabalho, igualitário para todas as formigas. Mesmo as rainhas e os machos possuem funções estipuladas para o desenvolvimento do bem comum, criando uma comunidade próspera. Esse ponto a todo momento é refletido pelo personagem, que chega a comentar que, apesar de algumas formigas serem maiores e outras menores, todas eram iguais:
“Essas diferenças de tamanho não estabeleciam nenhuma hierarquia social, não nos dividiram em castas de comandantes e obedientes. Cada um de nós trabalhava do seu jeito, conforme lhe convinha, para o bem de todas” (p.72).
Outra questão importante abordada pelo autor é a sexualidade de Octave como formiga. Sua mente humana e de inseto entram em conflito a todo o momento sobre seus desejos e impulsos sexuais. Como não possui asas, ele não apresenta nenhuma função reprodutora na colônia e deve ficar longe das rainhas aladas. Porém, acaba se apaixonando por uma, mesmo sem conseguir ir em frente com o seu desejo.
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Dessa forma, “O Homem-Formiga” é um livro inteligente e perspicaz. Ele oferece uma leitura rápida e surpreendente divertida, ao mesmo tempo que aborda questões que nos fazem refletir com o personagem principal sobre a existência humana e sobre nós mesmos. Além disso, a edição é cuidadosa e lindamente trabalhada.
Desafiei-me a ler esse livro por um simples motivo: tenho quase fobia de formiga, ou melhor, de formigueiros. Então, ler todas as descrições e imaginar as movimentações das pequenas me faziam arrepiar. Porém, o livro superou o meu nervoso e, quando vi, já havia terminado o texto. Poderia ser uma prova da qualidade da leitura? Leia também para tirar suas próprias conclusões!
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