31 de outubro é, oficialmente, Halloween, uma data incrível para os amantes de terror e suspense (como eu). Apesar de no Brasil não ser comum a tradição de se comemorar o Halloween, admiradores de toda a parte do país tentam avivar um pouco esse espírito por meio de festas à fantasia ou pequenos eventos com essa temática.
Porém, não é porque não é costume do brasileiro festejar a data, que não temos representantes dignos de um Halloween maravilhosamente assustador. E, obviamente, Álvares de Azevedo não poderia ficar de fora dessa pequena homenagem festiva.
Patrono da cadeira número 2 da Academia Brasileira de Letras, Manuel Antônio Álvares de Azevedo, ou simplesmente Álvares de Azevedo (Maneco para os íntimos), foi um dos maiores representantes do ultra-romantismo (segunda geração) na literatura brasileira. Nascido no dia 12 de setembro de 1831, em São Paulo, sua vida, embora curta, foi agitada e cheia de mistérios. Morreu jovem, aos 20 anos, vítima de tuberculose – doença muito comum para jovens da época, principalmente para os que levavam uma vida mais boêmia.
Mesmo tendo sido poucos os anos em que caminhou por este mundo, o jovem rapaz já mostrava traços de genialidade literária raros de se ver por aí. Um dos fatores que contribuíram para isso foi seu nascimento em uma família de meios financeiros abonados. Sua família tinha dinheiro o suficiente para investir na educação de Álvares, assim como comprar livros vindos de fora do país. Era leitor compulsivo de Lord Byron e Musset, paixão essa que fica evidente na forma em que ele escrevia suas poesias.
Entretanto, nem tudo era um mar de rosas na vida do jovem-prodígio. Ele perdera o irmão mais novo ainda em seus primeiros anos da infância, acontecimento que abalou muito sua vida emocional. Vivera uma vida de dedicação à mãe e à irmã, e, por isso, era muito apegado à família. Esse sentimento era notório em suas poesias, cheias de saudade, na época em que ele fora para a faculdade, quando vivia em São Paulo sozinho. Nessa época o restante da família morava no Rio de Janeiro.
“Se eu morresse amanhã, viria ao menos
Fechar meus olhos minha triste irmã;
Minha mãe de saudades morreria
Se eu morresse amanhã!”
Além da saudade que transbordava por meio de suas palavras, ele demonstrava grande frustração e um sofrimento melancólico pela distância de suas amadas mãe e irmã. As temáticas que ele mais usava em sua literatura eram a morte, ideias de autodestruição, dor e uma idealização do feminino que fazia com que as mulheres retratadas por ele fossem sempre inacessíveis, ora sendo anjos ora sendo seres fatais. Esse conjunto de características, juntamente com seu pessimismo abundante, fizeram dele o principal responsável pelo “mal do século”, que consiste basicamente dessas características melancólicas e pessimistas em um cenário de descontentamento geral, no Brasil.
Toda sua obra foi escrita no período de quatro anos que passou na faculdade de Direito. Ele não pôde concluir o curso, visto que foi acometido pela tuberculose, e morreu antes que pudesse se graduar. Este foi um dos fatores que contribuiu para a morte ser tema recorrente em sua poesia. Funcionava como um escape de sua realidade conturbada e sensação de impotência contra as forças naturais.
“Lembrança de morrer:
Quando em meu peito rebentar-se a fibra,
Que o espírito enlaça à dor vivente,
Não derramem por mim nenhuma lágrima
Em pálpebra demente.
E nem desfolhem na matéria impura
A flor do vale que adormece ao vento:
Não quero que uma nota de alegria
Se cale por meu triste passamento.
(…)
Só levo uma saudade… é dessas sombras
Que eu sentia velar nas noites minhas…
De ti, ó minha mãe, pobre coitada,
Que por minha tristeza te definhas!
De meu pai… de meus únicos amigos,
Pouco – bem poucos… e que não zombavam
Quando, em noites de febre endoudecido,
Minhas pálidas crenças duvidavam.
(…)
Beijarei a verdade santa e nua,
Verei cristalizar-se o sonho amigo…
Ó minha virgem dos errantes sonhos,
Filha do céu, eu vou amar contigo!
Descansem o meu leito solitário
Na floresta dos homens esquecida,
À sombra de uma cruz, e escrevam nela:
Foi poeta – sonhou – e amou na vida.
Sombras do vale, noites da montanha
Que minha alma cantou e amava tanto,
Protegei o meu corpo abandonado,
E no silêncio derramai-lhe canto!
Mas quando preludia ave d’aurora
E quando à meia-noite o céu repousa,
Arvoredos do bosque, abri os ramos…
Deixai a lua pratear-me a lousa!”
Além de tudo isso mencionado acima, sua literatura também conta com outro tipo de elemento gótico, que é o uso de personagens sobrenaturais. Isso acontece em “Macário” (1855), cuja história conta com o aparecimento do próprio Diabo.
CURIOSIDADES
#1 Quando estava na faculdade, Álvares e Bernardo Guimarães (“A Escrava Isaura”, 1875) fundaram a Sociedade Epicuréia, organização que escandalizara a todos em São Paulo com suas histórias – e possivelmente vários boatos – de orgias e cultos a Satã.
Imaginem só, fazer parte de um clubinho de pensadores e escritores trevosos assim?
#2 Sua morte foi acelerada por uma queda de cavalo, na qual a lesão provocada transformou-se em um tumor na fossa ilíaca. Uma cirurgia para a retirada do tumor foi feita, mas o ferimento infeccionou e ele não resistiu, morrendo de febre alta causada pela infecção.
#3 Acredita-se que suas últimas palavras teriam sido: “Que fatalidade, meu pai!”
#4 Álvares gostava de enterros e velórios (para a surpresa de 0 pessoas), e compôs vários discursos elegíacos.
Faltou algum aspecto que você aprecia da vida intensa do nosso ultrarromântico? Deixe nos comentários ????