Clássico feminista O Papel de Parede Amarelo ganha adaptação teatral com excelência técnica, mas falha na construção emocional. A peça, tão necessária quanto o livro de 1892, oscila entre o impacto e a desconexão.
O espetáculo O Papel de Parede Amarelo é inspirada no livro homônimo, publicado em 1892, o conto de Charlotte Perkins Gilman (1860-1935) é considerado um marco da literatura feminista por abordar temas como o controle sobre o corpo feminino e saúde mental, que permanecem atuais. A narrativa retrata a história de uma mulher confinada em um quarto pelo marido, que desenvolve uma obsessão pelo papel de parede.

Escrito no final do século XIX, o conto reflete as limitações impostas às mulheres, especialmente no que diz respeito à autonomia sobre seus corpos e mentes. Charlotte Perkins Gilman escreveu a história baseada em sua própria experiência com a cura de repouso, um tratamento prescrito pelo médico Silas Weir Mitchell para depressão pós-parto. Essa “cura” proibia atividades intelectuais e físicas, agravando sua condição.
No conto a protagonista, uma mulher sem nome, é confinada por seu marido, John, em um quarto com um papel de parede amarelo horrível, como parte de seu tratamento para uma condição nervosa. A narração é realizada em primeira pessoa, através de um diário secreto, mostrando sua crescente obsessão pelo papel de parede e sua gradual perda de sanidade.
Durante a apresentação temos uma grande interação de Gabriel Duarte com o áudio narrado pela atriz, onde fica claro ser a consciência da personagem escrevendo em seus diários. Nessa dinâmica com as interações com o áudio entendo que houve um desejo de ousar com essa escolha, mas que em minha opinião em alguns momentos falham, devido à imprecisão do time nessa interação, uma escolha ousada. A atriz performa sua narrativa de forma quase infantil, gerando um certo humor em sua apresentação que hora funciona com o público e hora deixa escapar o efeito desejado.
Na parte técnica da peça temos excelentes escolhas. O figurino assinado por Jum Nakao é simplesmente exuberante, temos um quimono que se destaca em cena, e que vai se transformando conforme a personagem muda. A cenografia de Marcia Moon me gerava diversos questionamentos no começo, mas com o avanço da peça temos a certeza de que as escolhas de materiais e design estão totalmente relacionadas à dramaturgia, e funciona muito bem. O desenho de luz de Cesar Pivetti contribui para a tensão da performance criada por Gabriela Duarte.
A direção em conjunto de Alessandra Maestrini e Denise Stoklos é interessante, pois temos um conjunto técnico bem elaborado, que contribui para o desenvolvimento narrativo da peça. No entanto, as escolhas na direção da atriz são triviais, levando a acabamentos exagerados, o que em minha opinião é triste, pois Gabriela Duarte transborda carisma em cena.

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O Papel de Parede Amarelo e Eu, é uma aposta ousada e necessária para tempos onde os números de agressão contra mulher só crescem, ainda mais tendo a consciência de que o maior número desta violência não está na agressão física, mas sim na agressão verbal e psicológica. Porém, a peça peca em criar uma conexão entre a personagem e o público, deixando a atuação exagerada, e cheia de ausência, pois a escolha da utilização do áudio não permite um desenvolvimento da personagem pela atriz, a mantendo sempre distante desse subtexto tão importante. Sai da peça com a sensação de que Gabriel Duarte se esforça com seu carisma, mas não consegue alcançar essa preciosidade, algo que talvez com ajustes simples darão extrema potência ao conjunto da obra.
Ficha técnica:
Adaptação da obra de Charlotte Perkins Gilman. Com Gabriela Duarte. Um espetáculo de: Alessandra Maestrini e Denise Stoklos. Produção: Nosso cultural – Ricardo Grasson e Heitor Garcia. Figurinos: Jum Nakao. Cenografia: Marcia Moon. Assistente de Cenografia: Espirro (Márcio Zunhiga). Desenho de Luz: Cesar Pivetti. Direção Musical e trilha sonora original: Federico Puppi. Preparação Corporal: Luis Louis Visagismo: Wilson Eliodorio. Camarim: Elizabeth Chagas Comunicação Visual: André Stoklos. Consultoria criativa: Kelly Vaneli. Redes Sociais: Jéssica Cristina. Gerenciamento: Lead Performance. Fotos: Priscila Prade. Assessoria de Imprensa: Adriana Balsanelli e Renato Fernandes. Coordenação de projeto: Pipoca Cultural. Idealização: Gabriela Duarte.
Serviço:
Estreia dia 28 de março, sexta-feira, às 21h.
Temporada: De 28 de março a 1º de junho de 2025.
Sextas, às 21h, Sábados, às 20h e domingos, às 18h.
Duração: 70 minutos. Classificação etária: 12 anos.
Ingressos: R$120 e R$60.
Teatro Estúdio
Rua Conselheiro Nébias, 891 – Campos Elíseos, São Paulo – SP
Capacidade: 130 lugares.
5 minutos da estação Santa Cecília do Metrô
O café e a bilheteira abrem 2 horas antes do início do espetáculo.
Acessibilidade: O teatro conta com rampas de acesso, banheiros adaptados e espaços exclusivos para cadeirantes.