O pensador e ativista Ailton Krenak defende que a harmonia com a natureza é uma alternativa ao sistema predatório do capitalismo. De fato, a crise ambiental é uma das preocupações contemporâneas e a literatura pode nos auxiliar a refletir acerca do problema, como é o caso de Quimera, livro da poeta Prisca Agustoni.
“Verdejar o mundo/ nem que seja na linguagem” — logo no poema de abertura está a senha para atravessar Quimera, novo livro de Prisca Agustoni, vencedora do prêmio Oceanos 2023. Aqui, a poeta suíço-brasileira escreve consciente de que estamos em meio a um colapso ambiental cada vez mais evidente e assustador, e convoca seus leitores à luta.
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Em cada uma de suas cinco seções, Quimera despe diferentes dimensões desse ser (nós!) que se coloca fora da natureza, por vezes acima dela e, sobretudo, contra ela. A poesia de Agustoni nos lembra do óbvio: somos natureza. E, aos poucos, um mundo mais vivo vai se revelando: ter árvores crescendo dentro do corpo, usar a escrita como uma maneira de cultivar a terra, ser fera, ver uma paisagem viva dentro de um animal dissecado. A cada camada que o olhar da poeta arranca, fica mais evidente que somos, a um só tempo, nossa maior ameaça e a única aposta possível.
Os animais em volta e tudo que há de animal em nós, o verde que ainda resta e toda a natureza são as marcas do “antigo” que negamos enquanto “progredimos”, mas é justamente a persistência deles, mesmo soterrados pelos nossos erros, que serve de alerta e augúrio. Daí vem o esforço da poeta para escavar, na linguagem, a vida nova: “cada fóssil exumado/ é a letra submersa de uma língua/ remota, que volta”.
Para os gregos, “quimera” indicava metamorfose, transformação necessária para resistir aos conflitos, mas os dicionários vão associá-la aos sentidos mais frágeis de sonho, ilusão e fantasia. Nos poemas de Agustoni, somos colocados diante de outros sentidos, entre eles um sentido forte de utopia: aprender com “o despertar dos extintos”, aprender a implodir “as previsões,/ os cálculos exatos sobre nosso término”
Quem é Prisca Agustoni?
Prisca Agustoni nasceu na Suíça italiana e, desde 2002, mora no Brasil. É poeta, tradutora e professora da Universidade Federal de Juiz de Fora. Escreve e se autotraduz em italiano, francês e português. Entre seus livros destacam-se Animal extremo (Patuá, 2017), O mundo mutilado (Quelônio, 2020), Rastros (Círculo de Poemas, 2022), Pólvora (Macondo, 2022), O gosto amargo dos metais (7Letras, 2022), vencedor dos prêmios Cidade de Belo Horizonte e Oceanos 2023, e Arqueologias (Peirópolis, 2024).
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