Primeiro livro em prosa de Mahmud Darwich, escrito em 1973, Diário da tristeza comum reúne ensaios autobiográficos que recuperam o passado do poeta, da infância até a vida no exílio, revelando seu status presente-ausente no seio da sociedade do colonizador israelense. Ao narrar episódios de sua vida, Darwich permite que mergulhemos na tragédia palestina, de ontem e hoje.
Refletindo sobre perdas e buscas, Darwich combina fatos históricos, relatos pessoais e diálogos que, ao longo de nove ensaios, dão forma a imagens poéticas capazes de sensibilizar e envolver o leitor.
“Por certo, a melancolia do desterrado — tristeza comum a todo um povo — aparece em várias páginas; mas nelas há também humor e ironia mordazes, a exemplo do relato que dá título ao livro, em que o autor narra em capítulos breves o inferno cotidiano dos palestinos, submetidos a uma vigilância e violência permanentes.” Do posfácio de Milton Hatoum.
O capítulo “A Lua não caiu no poço” abre o livro com um diálogo entre um Darwich adulto e seu “eu criança”. A árvore, a rocha e a lua, elementos presentes em tantos de seus poemas, acompanham as primeiras memórias do desterro rumo ao exílio.
Mais tarde, de volta a sua terra, o poeta se vê de corpo presente, mas ausente da pátria. Daí a pergunta: “O que era mais doloroso, ser refugiado no país de outros ou refugiado no seu próprio país?”.
Por ter escrito alguns desses textos quando ainda estava em Israel, talvez esta seja a obra em que Darwich mais se dedica em dissecar a psique do invasor.
“Um soldado que era poeta me contou que nunca, em toda a sua vida, ele se sentiu um forasteiro na Palestina até entrar em uma das aldeias na Cisjordânia após a última guerra [de 1967]. Ele estava de uniforme militar e viu uma menina na rua que olhou para ele de tal forma que sentiu o chão tremer sob seus pés. Pelo olhar daquela menina, que não conseguia descrever, ele se deu conta de que era um invasor. Ele não escondeu sua surpresa com a rejeição que viu nos olhos dela. De onde veio sua memória? E quem lhe ensinou que ela tinha pátria? Quem lhe ensinou?!”
Embora tenham sido escritos em 1973, para o leitor de hoje, esses relatos e reflexões sobre a ocupação, o sionismo e o nacionalismo árabe parecerão extremamente – e infelizmente – bastante atuais.
Um dos pontos mais impressionantes do livro está no capítulo “Silêncio por Gaza”, ensaio escrito durante o exílio de Darwich no Egito. Aqui nos deparamos com a indiferença do mundo diante das violações perpetradas pelas forças de ocupação israelense sobre a Faixa de Gaza, ainda nos anos 1970. Com este relato, que atesta a continuidade da Nakba, Darwich já demonstrava uma consciência histórica e política aguçada. Ao mesmo tempo, anunciava a força, a resistência e a resiliência que testemunhamos hoje na população de Gaza.
Assim, mais do que contar uma história pessoal, Diário da tristeza comum expressa uma tristeza ordinária, resultante das privações impostas pela ocupação aos palestinos nos detalhes mais banais da vida cotidiana.
Com esta edição, a Tabla completa a tarefa de publicar o que pode ser considerada a trilogia da prosa darwichiana, reunindo suas três obras-primas: Diário da tristeza comum, Memória para o esquecimento e Da presença da ausência.
Sobre o Mahmud Darwich:
Mahmud Darwich nasceu na aldeia de Albirwe, na Galileia (Aljalil), Palestina, em 13 de março de 1941. Poeta da solidão, do exílio, da interioridade, da transcendência, mas também da resistência, é considerado um dos maiores escritores de língua árabe. Darwich foi amado e admirado também em muitos países onde sua extensa obra foi traduzida. Diário da tristeza comum é o quarto livro de Mahmud Darwich publicado pela Tabla.
Sobre a tradutora:
Safa Jubran nasceu em Marjeyoun, no Líbano, em 1962 e chegou ao Brasil em 1982. É professora livre-docente na Universidade de São Paulo, onde leciona língua e literatura árabes, desde 1992. Em 2019, recebeu, pelo conjunto da obra traduzida do árabe ao português, o Sheikh Hamad Award for Translation and International Understanding, do Catar. Traduziu diversos livros para a Tabla, inclusive Memória para o esquecimento, de Mahmud Darwich. É a tradutora de Diário da tristeza comum.
Dados do livro:
Título: Diário da tristeza comum
Editora: Tabla
Autor: Mahmud Darwich
Tradução: Safa Jubran
Posfácio: Milton Hatoum
Projeto Gráfico: Marcelo Pereira – Tecnopop
Número de páginas: 176
Assunto: Não ficção
Sobre a editora Tabla:
A editora Tabla tem como foco a publicação de autores do Oriente Médio e do Norte da África, estejam eles em sua terra ou na diáspora. O objetivo é dar voz a literaturas sub representadas no Brasil, estabelecendo pontes diretas num eixo sul-sul. O catálogo busca, portanto, representar a diversidade cultural, étnica, linguística e religiosa dessa parte do globo, a fim de combater preconceitos e estereótipos tão difundidos por aqui.