A jornalista e roteirista Denise Godinho resolveu investigar, alguns anos atrás, a relação entre literatura e gastronomia. A cocada mencionada na obra Dom Casmurro, de Machado de Assis, foi a inspiração para colocar as ‘receitas literárias’ em prática. Como resultado desse projeto, surgiu “Capitu vem para o jantar”, primeiro como blog, depois como livro em 2016, além de um canal no YouTube e um perfil no Instagram.
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Capitu vem para o jantar propõe-se a desvendar as comidas encontradas em grandes obras, os pratos preferidos de alguns escritores e receitas inspiradas em clássicos da literatura. O livro é dividido em: lanchinhos para acompanhar a leitura; refeições para discutir uma boa obra; doce leitura: o açúcar escondido em nossos livros favoritos; comidinhas com gosto de infância e drinques da literatura. Estão entre algumas receitas: sanduíche de queijo suíço e leite maltado de O apanhador do campo de centeio, de J.D. Sallinger, bacalhoada de O primo Basílio, de Eça de Queirós, berinjela recheada de O amor nos tempos de cólera, de Gabriel García Márquez, paella de Por quem os sinos dobram, de Hemingway, mousse de abacaxi de Madame Bovary, de Flaubert, entre outros.
“Desde que nos habituamos a nos sentar à mesa, permitimos que o ato de se alimentar se transformasse em muito mais que um instinto de sobrevivência. Virou desejo. Virou demonstração de amor. Virou sentimento.
Foi natural que a paixão pela comida logo passasse a ser narrada em livros.
À mesa, muitos personagens se apaixonaram, tramaram guerras e banharam seus pensamentos em imponentes taças de vinho.
Em algumas ocasiões, escrever sobre comida se tornou um abrigo.
Eça de Queirós, escritor português que padecia de uma doença do intestino, fazia de suas histórias um artifício para matar o desejo dos alimentos proibidos para ele. É por isso que as deliciosas e completas descrições das iguarias em seus livros dão água na boca.
Em outros momentos, comer se tornou um gatilho da memória.
Para o francês Marcel Proust, o paladar tem a função de invocar o passado.
Lygia Fagundes Telles, por sua vez, escreveu que a memória tem um olfato
memorável. Quem nunca se perdeu em lembranças ao degustar um pudim de leite da infância ou sentir o cheiro daquela torta de maçã que uma pessoa querida costumava preparar?
A comida retratada em livros também se transformou em pista para conhecer os costumes de uma época.
Machado de Assis mencionava alimentos nacionais para protestar contra a influência parisiense, que invadiu nossa cozinha em meados do século XIX.
Mergulhar em uma história pelo viés da gastronomia pode ser uma viagem e tanto pela vida do escritor, por suas preferências culinárias e pelo pano de fundo social, cultural e histórico de seu tempo.” (Prólogo)
Resgatamos algumas de suas receitas do canal. Além de comentar sobre o contexto histórico e aspectos da obra, ela apresenta alguns pratos. Confira:
1.Rosquinhas açucaradas de A hora da estrela, de Clarice Lispector
2. Moqueca de Dona Flor e Seus Dois Maridos, de Jorge Amado
3. Doce de Viúva para A Viuvinha, de José de Alencar
4. O Bacalhau de O Primo Basílio
5. Cerveja Amanteigada do Harry Potter
6. A Gemada de Edgar Allan Poe
7. Bolo de Natal da Anne Frank