Amiri Baraka foi um dos poucos poetas negros da geração beat e seus melhores poemas precisam ser conhecidos. Ele era também escritor, dramaturgo e crítico musical dos Estados Unidos e autor de ensaios contra o racismo e o colonialismo. Baraka faz parte da geração de Jack Kerouac e Allen Ginsberg que era vigiada pelo FBI e foi um precursor do hip-hop e do rap.
Durante os anos 60 e 70 ele abandonou uma visão de integração social entre brancos e negros, após a Revolução Cubana, o assassinato de Malcolm X e sua prisão e espancamento em 1967, passando a defender uma revolução dos negros. Autor de diversas obras poéticas e historiográficas, que variavam da poesia, teatro, contos, etc., ele participou de diversos movimentos sociais dos negros estadunidenses. Faleceu ao 79 anos.
O NotaTerapia separou os melhores poemas do poeta Amiri Baraka. Confira:
PREFÁCIO PARA UM BILHETE SUICIDA DE VINTE VOLUMES
Ultimamente, tenho me acostumado ao jeito
Com que o chão se abre e me engole
Cada vez que saio para passear com o cão.
Ou a singela música cortante que o vento faz
quando corro para alcançar o ônibus…
As coisas chegaram a esse ponto.
E agora, a cada noite conto as estrelas.
E a cada noite obtenho o mesmo número.
E quando elas não se mostram para serem contadas,
Conto os buracos que deixam.
Ninguém canta mais.
Então, na noite passada subi na ponta dos pés
Rumo ao quarto da minha filha e a escutei
Conversando com alguém, e quando abri
A porta, não havia ninguém ali…
Apenas ela, ajoelhada, espiando dentro
De suas próprias mãos fechadas.
Tradução de Leonardo Morais. In: Mallarmargens, Revista de Poesia e Arte Contemporânea. Disponível em:< http://www.mallarmargens.com/2014/01/3-poemas-de-amiri-baraka-leroy-jones.html>. Acesso em: 30. Mar. 2018.
Babilônia Revisitada
A coisa abatida
sem órgãos
rasteja pelas ruas
da Europa, ela será
indultada, com seu vestido de morcego emplumado
sem órgãos
com feridas em seu interior
até a cabeça dela
uma vasta câmara de pus
de memórias vu(lvares)rmosas
sem órgãos
nada para fazer bebês
ela será a grande bruxa da lenda euroamericana
a que sugou a vida
de algum negro desconhecido
cujo nome será conhecido
mas cuja substância nunca será
nem mesmo por ele
que jaz em um pilha de dermonarcóticos.
Esta vadia matou um amigo meu chamado Bob Thompson
um pintor negro, um gigante, certa vez, ela foi reduzida
a uma pífia imitação marica
cheia de buracos Americanos e um macaco em suas costas
estapeou aviões
lá do empire state building
Que esta vadia e suas irmãs, todas elas,
recebam minhas palavras
em todos os seus orifícios como soda cáustica misturada com
cocola e xarope alaga
Sintam essa merda, vadias, sintam, agora riam essas suas
risadas histerectomizadas
enquanto suas carnes queimam
e seus olhos se atentam à lama vermelha.
Fonte: https://www.oficinapalimpsestus.com.br/amiri-baraka/
POEMA QUE ALGUNS TERÃO QUE ENTENDER
Sujas e opacas janelas dos olhos
e edifícios de esforço. Que
esforço faço eu? Um menino
preto e esperto, a 3 quilômetros da sua
casa. Não faço nenhum esforço.
Já não sou motivo de orgulho
pra minha raça. Leio um pouco,
trabalho contra o silêncio lentas tardes
de primavera.
Pensei, antes, alguns anos atrás
que chegaria ao fim da minha vida.
Ego de aquarela. Sem a exatidão
que um homem violento poderia oferecer.
Mas a sorte, e as sortes,
Não nos abandonarão. Toda a fantasia
e justiça, e invernos de carvão seco
Todos os cidadãos lamentavelmente inteligentes
Que me forcei a amar.
Esperávamos a vinda de um fenômeno
natural. Místicos e românticos, versados
trabalhadores
da terra.
Mas nenhum veio.
(Repita)
mas nenhum veio.
Metralhadores, por favor, podem dar um passo à frente?
Tradução de Luci Collin. In: UFSC qorpus. Disponível em: < http://qorpus.paginas.ufsc.br/teatro-na-praia/edicao-n-016/3554-2/>. Acesso: 30.Mar. 2018.
SEGUNDA EM SI BEMOL
Posso rezar
o dia inteiro
& Deus
nem aí, ó.
Mas se eu ligo
190
O Diabo
aparece logo
vejam só!
Tradução de Leonardo Morais. In: Mallarmargens, Revista de Poesia e Arte Contemporânea. Disponível em:< http://www.mallarmargens.com/2014/01/3-poemas-de-amiri-baraka-leroy-jones.html>. Acesso em: 30. Mar. 2018.
KA ‘BA
Uma janela fechada sobranceira
olha um pátio sujo, e os negros
a cruzar apelos, gritos, atravessam-no
desafiando a física com a torrente da sua vontade
O nosso mundo está cheio de som
O nosso mundo é mais belo que qualquer outro
embora soframos, e nos matemos uns aos outros
e às vezes nos falhe andar no ar
Somos gente bela
com imaginações africanas
cheios de máscaras, danças e cantos empolgantes
com olhos africanos, e narizes, e braços,
que se abrem com grilhões cinzentos num lugar
cheio de Invernos, e só queremos o sol.
Fomos capturados,
irmãos. E labutamos
para ser livres, para transformar
a imagem antiga, numa nova
correspondência connosco próprios
e com a nossa família negra. Precisamos de magia
precisamos agora dos sortilégios, para nos erguermos
regressar, destruir e criar. Qual será
a palavra sagrada?
[KA ‘BA de Amiri Baraka (LeRoy Jones)
trad. H. Barbas 14.Maio.2011]
Fonte: http://www.helenabarbas.net/um-poema-de-amiri-baraka/
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INCIDENTE
Ele voltou e atirou. Atirou nele. Quando
voltou, ele disparou, e ele caiu, cambaleando, no negror
da mata, caído, furado, morrendo, morto, até a pausa total.
No chão, sangrando, abatido. Ele morreu então, ali
depois da queda, a bala veloz rasgou a cara dele
e o sangue esguichou em cheio no assassino e na luz cinza.
Tem foto do morto em tudo que é canto. E seu espírito
sorve a luz. Mas ele morreu numa escuridão mais escura que
sua alma e tudo desabou cegamente com ele morrendo
escada abaixo.
Nenhuma notícia se tem
sobre o assassino, exceto que voltou, de algum lugar
pra fazer o que fez. E deu um único tiro na vítima
atônita, e a deixou depressa quando o sangue verteu. Sabemos
que o assassino foi hábil, ligeiro e discreto e que a vítima,
é provável, o conhecia. Fora isso, tirando o amargor concreto
da expressão do morto e a fria surpresa na rigidez
daqueles dedos e mãos, não sabemos mais nada.
Tradução de Luci Collin. In: UFSC qorpus. Disponível em: < http://qorpus.paginas.ufsc.br/teatro-na-praia/edicao-n-016/3554-2/>. Acesso: 30.Mar. 2018.
Mais alguns dos melhores poemas de Amiri Baraka:
NOTAS PARA UM DISCURSO
O blues africano
não me conhece. Seus passos, em areias
de seu próprio
solo. Um país
em preto & branco, jornais
lançados nas calçadas
do mundo. Não
sentem
o que eu sou.
Resistência
no sonho, um oblíquo
sugar do vigor, o vento
levanta areia, os olhos
estão algo fechados no
ódio, do ódio, do ódio, para
perambularem, eles conduzem
suas mortes em separado
da minha. Aquelas
cabeças, que chamo de
meu “povo”.
(E quem são. Povo. Pra interessar
a mim, homem feio. Quem é
você, para se preocupar com
os estômagos lisos e vazios
das donzelas, morrendo
dentro das casas. Negras. Luar despido
sobre os movimentos
dos meus dedos por baixo
das roupas dela. Cadê
seu marido. Negras
palavras jogam areia
nos olhos, dedos de
seus mortos particulares. Cujas
almas, olhos, na areia. Minha cor
não é a deles. Mais clara, papo de
branco. Eles recuam assustados. Minhas próprias
almas mortas, meu, assim chamado,
povo. A África
é o estrangeiro. Você é
como qualquer outro infeliz aqui
Tradução de Luci Collin. In: UFSC qorpus. Disponível em: < http://qorpus.paginas.ufsc.br/teatro-na-praia/edicao-n-016/3554-2/>. Acesso: 30.Mar. 2018.
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LEROY
Queria ter visto minha mãe sentada
o olhar triste pelo campo nos idos dos anos 20
a sondar o futuro da alma, havia anjos negros
cantando sobre sua cabeça, trazendo vida dos nossos ancestrais,
e conhecimento, e o forte sentimento negro. Sentada
(naquela foto do anuário que mostrei a Vashti) ela penetrou
em novos blues, vindos dos antigos, passos e paixões que ela mesma
fez recair sobre si. Me hipnotizando, desde muito
tempo, daquele conhecimento superior transmitido a ela transmitido a
mim e a todos os outros negros da nossa época.
Quando eu morrer, a consciência que carrego legarei
às pessoas negras. Que elas possam me repartir em pedaços e levar as
partes úteis, os caramelos dos meus sentimentos. E deixar
a asneira amarga e podre das partes brancas
de lado.
Tradução de Luci Collin. In: UFSC qorpus. Disponível em: < http://qorpus.paginas.ufsc.br/teatro-na-praia/edicao-n-016/3554-2/>. Acesso: 30. Mar. 2018.
E aí, o que achou dos melhores poemas de Amiri Baraka?
Fonte: https://www.oficinapalimpsestus.com.br/amiri-baraka/
http://arspoeticaethumanitas.blogspot.com/2018/03/segunda-em-si-bemol-sete-poemas-de.html
http://www.helenabarbas.net/um-poema-de-amiri-baraka/