Autora: Paula Hawkins
Editora: Record, 2017
Tradução: Cláudia Costa Guimarães
Páginas: 364
”Há pessoas que são atraídas pela água. (…) Acho que sou uma delas. Eu me sinto mais viva quando estou perto da água, quando estou perto desta água. (…) Mas as aparências enganam, pois este é um lugar mortífero. A água, escura e opaca, oculta o que há por baixo: algas que te prendem, que te arrastam para o fundo, pedras pontiagudas que cortam a pele e a carne. Acima paira o penhasco de rocha de ardósia cinza: um desafio, uma provocação.”
O pensamento do que significa ser mulher e todas as suas implicações em nossa sociedade tem estado mais do que na boca do povo, como também tem sido tema constante de visões e revisões, na medida em que o papel da mulher durante séculos esteve legado ao anonimato. O que mais incrível é que, a literatura, quando coloca esses assuntos em xeque, transforma o que é um mero debate em exposição artística de um problema, de uma questão que precisa ser pensada, repensada e exposta, como uma carne viva, mas vivida pelos corpos de forma livre, pacífica, como um rio que corre. Este é o tema de Em Águas Sombrias.
“Nel Abott já vinha brincando com fogo – era obcecada pelo rio e seus segredos, e esse tipo de obsessão nunca acaba bem.”
Em Águas Sombrias, de Paula Hawkins, conta a história de uma série de mulheres que morrem ao pular de um penhasco em direção a um rio em uma pequenina cidade. A cada morte, uma série de questões são levantadas, mas acabam por se tornarem esquecidas com o tempo, dando ao penhasco um ar de “maldito” ou uma espécie de zona sagrada do mal. No entanto, a partir da morte de uma mulher solteira que investigava justamente as histórias daquele passado de mulheres, todas as histórias começam a vir a tona. Teria sido suicídio? Assassinato? Ou o que se vê são apenas a raça humana sendo o que sempre é: um empecilho na vida de outros seres repletos de regras e expectativas sociais impossível.
“O rio pode voltar ao passado, trazer coisas à tona e cuspi-las na margem diante dos olhos de todos, mas as pessoas não podem.“
O mais interessante da obra é como a autora consegue dominar diversas formas de escrita ao oscilar em sua análise por capítulos narrados por personagens diferentes da obra. Algumas vezes em primeira pessoa, outras em terceira, temos uma série aproximações e distanciamentos em relação a narrativa nos dando, por vezes, visões parciais, por vezes observações atentas que, aos poucos, vão se focando em um ponto que me parece principal: a influência da sociedade sobre os corpos das mulheres e a posição que os homens ocupam de violência em relação a mulher desde os pequenos gestos até os maiores atos em todas as etapas de suas vidas.
Em Águas Sombrias, de Paula Hawkins, é uma obra ainda mais instigante que seu sucesso anterior, A Garota do Trem. Sua escrita veloz, cuidadosa e que nos deixa a parte apenas de fragmentos daquilo que ela quer nos contar, faz do livro um dos maiores suspenses do ano. Sem dúvida, uma obra imperdível para todos os amantes do gênero.
Foto: A World to Read