O historiador Leandro Karnal vem sendo, em nosso momento político conturbado, “um descanso na loucura”. Sua inteligência, ironia e ao mesmo tempo, gentileza e cuidado no trato, trazem a tona cada vez mais uma nova forma de fazer pensamento: através do afeto. Uma aproximação quase íntima dos leitores e um cuidado nos formatos em que se vai dizer, faz com que Karnal consiga a exata mediação entre rigor teórico e penetração popular. Assim, é um grande prazer ter o professor como um iluminador das zonas sombrias de um mundo contemporâneo um tanto quanto obscuro.
Leandro Karnal, em sua página no Facebook, postou uma lista de 10 livros que mudaram a sua vida para sempre. Tratam-se de clássicos da literatura, formadores de gerações de leitores, e que refletem grandes questões humanas essenciais para a formação moral de um ser como indivíduo e de um cidadão, pronto para viver em seu coletivo. O NotaTerapia, sempre preocupado em indicar livros e formar leitores, separou a lista com um breve resumo de cada uma dê-las para, quem sabe, fazer você abrir um desses livros!
1- Hamlet, de Shakespeare
Após ter visto o espírito do pai morto, Hamlet se encontra insatisfeito com o decorrer da trama na corte, na qual a sua mãe casa-se com o irmão do marido falecido poucos meses após sua morte. O desfecho do rei choca o filho, que deixa os estudos na Universidade de Wittenberg para retornar à corte, em Elsenor. Inconformado com as corrupções a sua volta, Hamlet tem Horácio e Ofélia como únicos confidentes, sendo esta a mulher que ama, mas que promete ao pai Polônio não se casar com Hamlet.
Em uma vídeo-aula no facebook, Karnal afirma que Hamlet é uma chance de despertar no aluno a consciência para seu mundo interior. Afirma ainda que “há seis anos morreu meu pai e eu vivi a experiência de ser um órfão, exatamente como Hamlet, e finalmente a peça adquiriu um sentido totalmente novo, porque agora eu estava numa situação similar da dor de perder a identidade paterna”. (Leia a resenha aqui!)
2- A Paixão segundo GH, de Clarice Lispector
Numa determinada manhã G.H. resolve fazer uma arrumação em sua casa, e inicia pelo quarto da empregada que não mais trabalhava para ela, ao entrar no quarto, se surpreende, pois imaginara que encontraria tudo bagunçado, no entanto, é tomada por uma enorme surpresa ao encontrar tudo em ordem. Ela se depara com uma barata que havia saído do armário, e imediatamente a esmaga com a porta do armário. Diante dela, estava aquela barata morta, sem a casca jorrando uma secreção branca. (Leia a resenha aqui!)
Em uma postagem no Facebook, Karnal afirma:
Quando descobri e entendi A Paixão Segundo GH, há quase 20 anos, chorei muito pela beleza da escrita, bem como pela escritora atormentada que ali despejava seu gênio e sua dor. Chorei pelo retrato difícil da alma humana.
3- O Livro de Jó
O Livro de Jó é um dos livros sapienciais do Antigo Testamento e da Tanakh, vem depois do Livro de Ester e antes do Livro de Salmos. É considerada a obra prima da literatura do movimento de Sabedoria. Também é considerada uma das mais belas histórias de prova e fé. Conta a história de Jó, onde o livro mostra que era um homem temente a Deus e o agradava.
Sobre a figura de Lúcifer no monoteísmo do Judaísmo, Karnal, em uma entrevista, usa como exemplo o Livro de Jó:
O monoteísmo absoluto do Judaísmo transforma o demônio em auxiliar de Deus, como no livro de Jó. Os judeus acreditavam em espíritos imundos que tomavam as pessoas, mas não deram ao demônio a autonomia de um reino.
4- A Divina Comédia, de Dante Alighieri
“O Poema Sagrado de Dante”, séculos após registrado como A Divina Comédia é um poema de viés épico e teológico da literatura italiana e da mundial, escrito por Dante Alighieri no século XIV e dividido em três partes: Inferno, Purgatório, Paraíso. Em uma vídeo-aula, Karnal analisa os pecados dos homens a partir da imagem do purgatório de Dante:
5- Dom Quixote, de Cervantes
Dom Quixote de la Mancha é um livro escrito pelo espanhol Miguel de Cervantes y Saavedra (1547-1616). Com sua primeira edição publicada em Madrid no ano de 1605. O protagonista da obra é Dom Quixote, um pequeno fidalgo castelhano que perdeu a razão por muita leitura de romances de cavalaria e pretende imitar seus heróis preferidos. O romance narra as suas aventuras em companhia de Sancho Pança, seu fiel amigo e companheiro, que tem uma visão mais realista.
Em um post em seu Facebook, em que compara Quixote a Hamlet, afirma que “Quixote e um idealista que não encontra mais lugar na sua época” em que “o mundo é prático e pouco idealista, como o cavaleiro da triste figura soube pela Dulcineia encantada.”
6- Madame Bovary, de Flaubert
O romance francês publicado por Gustave Flaubert em 1857 que carrega o nome da protagonista tornou-se um paradigma para as histórias de amor infelizes cujo cenário é o adultério. Embora o romance carregue o nome da grande protagonista, Emma Bovary só aparece a partir do capitulo dois e só assume o lugar de protagonista principal do romance depois de casada. Quando solteira Emma morava no campo com seu pai viúvo, era uma jovem e bela provinciana cuja educação que recebera se resumia à obediência aos pais e ao marido. Emma conhece o médico Charles Bovary com quem se casa e vai morar em uma pequena cidade chamada Tostes. (Leia a resenha aqui!)
Em um post no Facebook, Karnal indica um livro de Mario Vargas Llosa que trata exatamente do clássico de Flaubert: termino um lindo texto peruano sobre Flaubert e ganho uma viagem quase inédita ao mundo do casal Bovary. Duplo presente.
7- Ensaios, de Montaigne
Montaigne fundou um gênero – o ensaio – em que a pena do autor é deixada à vontade, guiada pelo senso comum, misturando instinto com experiência, circulando pelos temas mais diversos, sem compromissos com a autoridade mas sim com a liberdade. Tratava-se do registro das suas experiências, de observações, reflexões que ele tratava da vida. Nada lhe foi estranho; o amor, a luta, a religião, a coragem, a amizade, a política, a educação.
Em um vídeo, Karnal fala sobre o problema do mundo segundo Montaigne:
8- O mal estar na civilização, de Freud
O mal-estar na civilização é um texto do médico e fundador da psicanálise Sigmund Freud que discute o fato da cultura – termo que o autor iguala à civilização – produzir um mal-estar nos seres humanos, pois que existe uma dicotomia entre os impulsos pulsionais e a civilização. Portanto, para o bem da civilização, o indivíduo é oprimido em suas pulsões e vive em mal-estar. É um dos principais escritos onde Freud esboça a relação entre os elementos de sua teoria da consciência com uma teoria social, o outro texto é O futuro de uma ilusão.
Karnal, no programa Provocações, de Antônio Abujamra, inicia sua fala discorrendo sobre sobre a felicidade. Ele cita Freud ao dizer que “Sem a infelicidade, a frustração e o trauma não haveria cultura”.
9- Confissões, de Agostinho
Confissões é uma das obras mais conhecidas de Santo Agostinho e um dos mais importantes livros da história, sendo considerada uma autobiografia na qual o santo relata sua vida antes de se tornar cristão e sua conversão. A respeito desta obra, Santo Agostinho diz que a palavra confissões, mais que confessar pecados, significa adorar a Deus. É, portanto, um hino de louvor. O livro é considerado um clássico, tanto da literatura mundial, quanto da teologia cristã e até mesmo da filosofia. (Leia mais aqui!)
No mesmo curso já citado acima sobre os pecados, Karnal cita uma frase de Agostinho:
“o orgulho é a fonte de todas as fraquezas, por que é a fonte de todos os vícios.”
10- A poesia de Fernando Pessoa
Fernando Pessoa é o mais universal poeta português. Por ter sido educado na África do Sul, numa escola católica irlandesa, chegou a ter maior familiaridade com o idioma inglês do que com o português ao escrever os seus primeiros poemas nesse idioma. O crítico literário Harold Bloom considerou Pessoa como “Whitman renascido”, e o incluiu no seu cânone entre os 26 melhores escritores da civilização ocidental, não apenas da literatura portuguesa mas também da inglesa.
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