“Não há nada que seja bom ou mau,
O pensamento é que faz uma coisa ou outra.”
William Shakespeare
Monsenhor Quixote, do escritor americano Graham Greene, é uma espécie de releitura contemporânea da obra clássica de Cervantes, o Dom Quixote. O livro conta a história de Padre Quixote e seu amigo comunista Sancho que, juntos, ao lado do antigo carro Rocinante, viajam pela Espanha em busca de aventuras. Mantenho um diálogo constante entre a fé religiosa e a ideologia política do pensamento marxista, os dois começam a refletir sobre suas posições no mundo e, diante das diferenças, encontram pequenos zonas de afeto e construção de possibilidade de convivência e afeto. No fim das contas, o livro é, talvez, uma grande reflexão das grandes ideias que habitaram as mentes humanas do século XX: o sonho político da igualidade, do fim da miséria e a grande dúvida do que acontece, ao final da vida, com nossos corpos e nossa alma. Um dos livros mais interessantes que já li!
O NotaTerapia separou as melhores frases do livro:
Onde estaria a fé se não existissem mistérios?
Não há passos este ano nos ninhos do ano passado.
A vodka me deu um sonho e outra vodka levou-o embora.
Sobre Marx:
Só que ele escreveu isso no século XIX, Sancho. O ópio não era então uma droga diabólica…o láudano era um tranquilizante, nada pior do que isso. Um tranquilizante para as pessoas prósperas, que os pobres não tinham condições de usar. A religião é o valium dos pobres…isso foi tudo o que ele quis dizer. Melhor para eles do que uma visita a uma casa de gim. Melhor para eles talvez até mesmo do que este vivo. O homem não pode viver sem um tranquilizante.
Na história recente, Sancho, houve camaradas demais que foram mortos por camaradas. Não me importo de chamá-lo de amigo. Amigos são menos propensos a se matarem mutuamente.
O crente lutará com outro crente por causa de uma divergência mínima, enquanto o homem que duvida luta apenas consigo mesmo.
Pôncios Pilatos foi um homem maléfico. O mundo quase o canonizou porque ele era neutro. Mas ninguém pode ser neutro quando se trata de escolher entre o bem e o mal.
É engraçado, mas a Igreja pode mudar de ideia a respeito de dinheiro muito mais facilmente que a respeito de sexo.
A embriaguez que termina em completa perda de razão é um pecado mortal, a menos que haja motivo suficiente. Fazer com que outros bebam também é, a menos que haja uma desculpa válida.
Apesar disso, quem lia a história podia imaginar que Dom Quixote percorrera toda a extensão imensa da Espanha. Havia uma virtude na lentidão que estava perdida. Rocinante era de mais valor para um viajante autêntico que um avião a jato. Os aviões a jato serviam para homens de negócio.
– O tempo há de mostrar.
– O tempo nunca mostra. Nossas vidas são curtas demais.
Mas não gosto de ofender alguém que leva uma coisa a sério. O riso não é um argumento. Pode ser um insulto estúpido. Talvez eles encarassem as coisas de maneira diferente de mim. Talvez fosse a beleza que eles vissem. Mesmo assim, desejei às vezes que alguém risse…até mesmo você, Sancho…a fim de que eu pudesse rir também.
Prefiro o silêncio da paz ao silêncio que vem depois do sucesso…esse silêncio é como o silêncio permanente da morte. E nem é uma boa morte.
Às vezes, se perdem o controle. Mas nem sempre é tão ruim assim. É bom perder o controle de vez em quando. No amor, por exemplo.
Estou repleto de dúvidas. Não tenho certeza de nada, nem mesmo da existência de Deus. Mas a dúvida não é uma traição, como vocês, os comunistas, parecem pensar. A dúvida é humana. Claro que eu quero acreditar que tudo é verdade…e esse desejo é a única coisa certa que eu sinto. Quero que outros acreditem também…talvez um pouco da crença deles possa se transferir pra mim.
Não queria sentir-se grato – a gratidão era como uma algema que somente o captor pode abrir.
A dúvida faz a pessoa começar a vacilar entre uma ação e outra.
Por que o ódio a um homem, até mesmo um homem como Franco, desaparece com a morte dele, enquanto o amor, o amor que começara a sentir por Padre Quixote, parecia agora viver e crescer.
Edição: Editora Record, 1982