“A Menina e o Mar” é um filme dirigido por Gabriel Mellin e venceu o prêmio Grande Otelo 2024
O curta, inspirado no livro infantil O menino e o mar, de Lulu Lima e Lalan Bessoni, conta a história de duas crianças que viam o mundo sob pontos de vista diferentes mas que se conectaram através da escuta e sensibilidade. O encontro se dá na praia, lugar onde o momento presente é precioso e vital. A menina é deficiente visual, no entanto, presta atenção na vida que está acontecendo ao seu redor. Já o menino, está imerso em tablets e smartphones, e por isso, se distrai muito facilmente e não observa as coisas à sua volta.
A primeira cena já traz um contraste entre a força da natureza e o vício doentio na tecnologia. O menino chega à praia com sua mãe e com os olhos fixados na tela do celular. Somente após a bateria do telefone descarregar, que ele decide olhar para o lado e vê a menina sentada na areia e vai ao seu encontro. A partir desse momento, a narrativa do filme começa a se desenrolar e o diálogo entre os dois, repleto de poesia e ternura, emergem na tela.
Frases como ““Esse é o mar te dando beijos na bochecha”, ou ““Essa é a risada do mar”, são ditas pela menina que não enxerga mas que consegue sentir o mar e se conectar com ele. A potência da conversa entre os dois atravessa públicos de diferentes idades, e apesar de ser um curta infantil, o filme tem muito a ensinar aos adultos. Assim, o curta nos faz refletir sobre nossa dependência na tecnologia e no mundo efémero das redes sociais e nos aponta o quanto essas ferramentas podem ser limitantes e acabar afetando nossa criatividade e sensibilidade, por exemplo.
A ideia do curta surgiu quando Gabriel, estava em uma livraria com sua filha, e folheando alguns livros, se deparou com o livro O menino e o mar. O diretor se emocionou de cara e intuiu que a história daria um bom filme.
– O que me chamou atenção, foi exatamente essa história, porque ela tem muitas camadas, ela tem a questão da acessibilidade da menina ser cega. Ela tem a questão de um menino que tem medo do mar e tem que vencer o medo e ela tem uma questão que eu achei muito forte também que é a coisa da gente parar para sentir a natureza, ouvir o som do mar, sentir o vento, a textura. Então, quando eu olhei, eu falei, nossa quanta mensagem legal e ainda achei esse um ótimo curta, até para me desafiar como diretor. – reflete Gabriel.
Na história original do livro, não há a presença da tecnologia na história, porém, o diretor entendeu que acrescentar esse elemento para os personagens poderia ser interessante para a reflexão tão urgente do nosso tempo: o uso excessivo da internet e redes sociais, principalmente, entre as crianças e os adolescentes. Essa falta de equilíbrio com o uso das tecnologias, de certo modo, acaba afetando nossa capacidade de imaginação. Sobre o assunto, Gabriel é enfático.
– Por isso que eu quis trazer a tecnologia que não estava no livro. Todo mundo está muito viciado em tablet e eu sempre fui contra por causa disso, de a gente poder apreciar a natureza, da gente ficar olhando para fora da janela na viagem. E a gente quando viaja com outros pais, nós convivemos com muitas crianças e pais e a gente observa que não existe mais isso, uma criança olhando para fora da janela, é o tempo inteiro no aparelho eletrônico, entrou no carro é tablet. Então eu sempre fui contra, por isso que eu batalho muito com a minha filha e ela já captou isso.Eu já vejo essa resposta funcionando de como eu a tenho educado porque ela sempre cria brincadeiras cheias de imaginação, por exemplo, ela se tornou a melhor aluna em escrever e criar histórias. E as amigas dela tem uma dificuldade enorme, eu acho que o celular e a tela, de um modo geral, deixa a criança o tempo inteiro tendo que receber informação, o que acaba limitando o espaço para a criação. – analisa Gabriel.
“Só se vê bem com o coração, o essencial é invisível aos olhos”. A frase é do célebre livro O Pequeno Príncipe, clássico do escritor francês Saint-Exupéry, publicado em 1943. O best-seller, apesar de ser classificado como uma obra infantil, também é leitura obrigatória para os adultos. Assim como no livro, o curta traz diversas mensagens importantes que conversam com todas as idades.
A delicadeza do diálogo entre os personagens, sobretudo, a menina, que encoraja e ensina o menino a sentir o mar e a se conectar com ele, chega ao público como uma lição de que devemos praticar o exercício de enxergar além, deixando um pouco de lado as telas e os headphones, para isso, é preciso estar atento ao mundo à nossa volta e a natureza pulsante que nos cerca.
O curta, então, é uma ode ao mundo real e a possibilidade do encontro e o quanto as relações olho no olho podem ser transformadoras e benéficas. Assim como o personagem do menino que tinha medo de experimentar as coisas e vencer seus medos, o público também sai do filme com inúmeras reflexões e questionamentos. Pois, ao diminuirmos o consumo das redes sociais, podemos observar a natureza, as pessoas e a nós mesmos. No filme, o mar serve de metáfora para essa mensagem tão fundamental nos dias de hoje.
– O mar é um personagem, eu sempre tive uma ligação muito forte com o mar, apaixonado por praia e o surfe para mim, durante muitos anos, era minha vida. Tentei ser surfista profissional. Aí o tempo foi passando e fui para o audiovisual. Diminuí muito o ritmo, ainda mais com três filhos, mas levo eles muito à praia e é uma coisa muito forte. No livro o mar é mais um elemento, no filme, pelo fato de ser imagem, poder ouvir o barulho, o mar está ali presente o tempo inteiro, eu vejo ele totalmente como personagem. O spielberg fala muito isso, às vezes ele termina o filme dele e durante as entrevistas, as críticas, as pessoas começam a trazer reflexões que ele mesmo não tinha percebido, aí ele costuma dizer que “isso parece uma terapia”.
Gabriel Mellin é um premiado diretor, produtor e roteirista com mais de 40 prêmios nacionais e internacionais, incluindo o Prêmio Grande Otelo 2024. Em seus 20 anos de mercado audiovisual, dirigiu dezenas de projetos entre filmes, documentários, séries de TV, videoclipes e publicidades. Seu último curta “A Menina e o Mar”, já foi selecionado para 90 festivais por todo o mundo, ganhando mais de 35 prêmios em 20 países diferentes, entre estes, 6 prêmios como melhor direção para Mellin.
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Confira o trailer do filme: