“O novo modo do eterno consiste em passar”, escreve Jacques Rancière, a certa altura deste livro. E prossegue: “Se a eternidade não faz senão passar […] a forma é forma de uma pura passagem e é, ao mesmo tempo, momento de uma história das formas”. Estas são apenas duas formulações luminosas do pensamento deste que é um dos mais agudos filósofos contemporâneos, dos raros capazes de pensar o mundo a partir da experiência estética, e não contra ou fora dela.
Em Mal-estar na estética, publicado na França em 2004, na esteira de A partilha do sensível, livro que deslocou de forma profundamente inovadora o debate sobre as relações entre estética e política, Rancière se contrapõe a algumas das principais correntes críticas das últimas décadas (particularmente, às teorias de Alain Badiou e Jean-François Lyotard) ao mesmo tempo em que aprofunda suas investigações sobre o que constitui uma obra de arte e que relações esta entretém com o conjunto da vida social.
Neste, como em outros livros do autor, salta à vista sua capacidade de pensar a política em estreita conexão com as artes, pois — como ele observa na apresentação escrita especialmente para a edição brasileira — o que o termo “estética” designa não é uma fruição elitista, mas “uma promessa de comunidade”, compartilhada por todos os humanos.
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Na orelha do livro, o professor Luiz Camillo Osorio comenta que o livro abre com uma discussão que pontua os caminhos e descaminhos das políticas da estética, tendo em vista explicitar o que pode a arte em termos de transformação social, repensando o papel crítico das artes dada a falência do modelo convencional de engajamento.
Sem abrir mão da radicalidade que retira a arte dos domínios dos saberes instituídos, Rancière vai retomar de forma original a estética kantiana. Ele fará uma leitura política, schilleriana, da terceira crítica. Entretanto, é na experiência do belo, e não na do sublime, que ele percebe uma potência política, na medida em que nela tudo é simultaneamente atividade e passividade, liberdade e suspensão. É aí, no seio desta experiência desprovida de conceitos, que somos convocados a lidar com o que ainda não está definido, enunciado, sabido.
“O belo é, portanto, o que faz falar, o que se abre à discussão — não em busca de consensos, mas em nome dos dissensos, daquilo que nos faz diferir na igualdade.”, conclui
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Sobre o autor:
Considerado um dos maiores intelectuais franceses da atualidade, Jacques Rancière nasceu em Argel, em 1940, e é Professor Emérito de Estética e Política da Universidade de Paris VIII — Vincennes/Saint-Denis, onde lecionou de 1969 a 2000. Entre seus livros destacam-se A lição de Althusser (1975), A noite dos proletários (1981), O mestre ignorante (1987), Os nomes da história (1992), O desentendimento (1995), A partilha do sensível (2000), O inconsciente estético (2001), Aisthesis: cenas do regime estético da arte (2011) e As margens da ficção (2017).
Sobre os tradutores:
Gustavo Chataignier é professor da Universidade Católica do Maule, em Talca, no Chile; doutor em filosofia pela Universidade Paris VIII, pesquisador associado ao Departamento de Filosofia da mesma instituição, agraciado com a Chaire des Amériques (Institut des Amériques, Universidade Rennes II) em 2020; professor convidado pela Universidade de Valparaíso (2016); e pós-doutor em filosofia pela UFRJ. É autor de Temps historique et immanence (L’Harmattan, 2012).
Pedro Hussak possui doutorado em filosofia pela UFRJ e atualmente é professor associado IV de Estética na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Em 2014 realizou estágio na Université Paris I Panthéon-Sorbonne. Publicou vários artigos na área de Estética e é organizador, entre outras publicações, dos livros Educação estética: de Schiller a Marcuse (NAU, 2011), Artes do corpo, corpos das artes (Relicário, 2020) e Modernismes et anthropophagies (Éditions Mimésis, 2020). Traduziu também, em parceria com Carla Damião, Diário parisiense e outros escritos, de Walter Benjamin (Hedra, 2020).