Eu costumo dizer que escritores são oráculos. Eles antecipam, leem o passado e o presente, além de projetar aquilo que pode acontecer no futuro do nosso país. E dessa vez, quem fez uma análise minuciosa da situação do Brasil foi o escritor moçambicano Mia Couto, autor do clássico Terra Sonâmbula.
Em entrevista ao Jornal O Globo, ele disse ver a situação do Brasil “com tristeza”. Ele destacou que a tragédia sanitária que vive nosso país é resultado de uma política que agiu com “recusa, teimosia, negação da evidência que veio de cima e foi responsável por uma enorme tragédia”. Ele comparou com a situação de Moçambique que, durante a pandemia, teve 1825 mortos pela Covid até semana passada:
Aqui, a realidade social hegemônica é a de famílias com até 40 pessoas vivendo juntas em casas pequenas, sem saneamento. Não há como falar em isolamento social. [Mas] o governo seguiu todas as recomendações da comissão científica e antes mesmo do primeiro caso iniciamos o controle nos aeroportos e a campanha de informação nas várias línguas nacionais.
Na entrevista, ele comentou que o Brasil está cada vez mais distante da África e que o Brasil é um país que “faz falta”, pois aprendeu sobre ele próprio quando descobriu o seu “lado brasileiro”. “Um dos grandes confortos que tinha ao chegar no Brasil era identificar uma faceta africana do país, o desejo de dar a volta por cima, de sacudir a poeira, de se estar disponível para a alegria”, disse. Um fato que teria mudado na política dos últimos anos do país:
Em 2019, no entanto, vi um Brasil que não parecia ter razão para sambar, sentenciou.
Livro Novo: “O mapeador de ausências”
A entrevista foi por conta de um novo livro lançado por Mia Couto em que volta ao seu passado e a sua infância em Moçambique. Para isso, criou Diogo, escritor branco que retorna a Beira em 2019, após longo hiato, para receber uma homenagem. Ao mergulhar em memórias familiares, ele compreende a real razão da viagem: redimensionar o papel do pai em sua vida e sua participação na luta de libertação da ex-colônia de Portugal nos anos 1970.
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