Este é um dos livros mais belos e singelos de Dostoiévski, talvez aquele com seu lado mais romântico. Na verdade, não é propriamente um romance, mas uma novela que conta a história de um homem solitário que vaga pela cidade noite adentro, deixando que o sentimento de cada rua, esquina ou calçada o penetre. Durante a caminhada, avista uma mulher aos prantos encostada no parapeito de um canal. Ao acudi-la, tem início um idílio fadado a se dissipar como a tênue claridade das noites de verão na Rússia.
Veja nosso papo sobre o livro:
O NotaTerapia separou 5 motivos pra você ler Noites Brancas. Confira:
1- O livro mais “fácil” do Dostoievski
Uma coisa que todo leitor que adentra o mundo de Dostoiévski costuma passar é uma primeira dificuldade com os livros. Seja porque sua escrita é pesada, densa, filosófica, seja porque a trama tem muitos personagens com muitos nomes e apelidos, muitas vezes, os romances, novelas e contos de Dostoiévski “travam” os leitores em algum momento. Noites Brancas, neste caso, é o contrário: com uma narrativa centrada em duas personagens, se torna a mais “fácil” das obras do autor para quem quer começar a ler. E isso sem perder a força e a potência dos escritos do russo.
2- Uma leitura rápida e intensa
Outra barreira que alguns leitores encontram é o tamanho dos livros. Crime e Castigo, por exemplo, costuma ser dividido em dois volumes dado o grande número de páginas. Os Irmãos Karamazov, outro sucesso do autor, tem mais de 500 páginas em diversas edições. Embora o autor tenha outras obras curtas, Noites Brancas é uma das novelas mais breves.
Uma curiosidade é que Dostoiévski vivia da escrita e ganhava por página escrita, então muito de sua filosofia vem também da necessidade de “engordar” seus romances. No caso de Noites Brancas, no entanto, a escrita é breve e intensa, acelerada, em que a gente vê as noites se encaminhando para um destino.
3- Uma história sobre as idealizações do amor
Para quem gosta de uma história de amor, Noites Brancas é o Dostoiévski ideal para se ler. Não que seja uma história feliz. Sem spoiler, acho que a história passa longe disso, mas capturando os moldes românticos, o autor trata a idealização do amor por parte do personagem “sonhador” de modo que a gente leia descrições belíssimas de uma das mais lindas paixões. Sem conseguir dar conta deste sentimento, o sonhador coloca em seu ideal tudo aquilo que um grande amor deve possuir…e paga um preço por isso. Pelo menos, não estamos mais nos tempos de um Werther, né?
4- As belas descrições de São Petersburgo
A Rússia é um dos países com uma geografia bastante curiosa. Com um grande território, é quase como um continente dentro de um país. E Dostoiévski consegue capturar muito bem o clima da cidade moderna da Rússia, principalmente de São Petersburgo, através das descrições de Noites Brancas.
É através das andanças do sonhador, um grande “flaneur” nos moldes de Baudelaire, que anda pelas partes urbanas, passando pelas regiões as mais afastadas da cidade, chegando na descrição da natureza, do céu, das noites, que podemos nos aproximar daquele ambiente. O próprio título do livro se refere a um fenômeno natural muito curioso que acontece na Rússia: as Noites Brancas.
As noites brancas de São Petersburgo são um fenômeno atmosférico que tem lugar de finais de maio a meados de julho durante o qual o sol não se chega a pôr por completo, oferecendo entardeceres intermináveis ao longo de toda a noite.
Veja algumas imagens do fenômeno:
5- Frases lindíssimas
A novela propicia pra todo leitor trechos absolutamente incríveis. A gente separou alguns pra vocês retirada do blog Ouriço Elegante e Roda dos Livros. Confira:
Se não há outra vida, então é preciso construí-la a partir desses pedaços. E no entanto, é uma outra coisa que a alma pede e quer!
E em vão o sonhador remexe, como que nas cinzas, em seus velhos sonhos, procurando nessas cinzas ao menos uma centelha para soprá-la e, através do fogo renovador, aquecer o coração esfriado e ressuscitar novamente nele tudo o que antes era tão belo, que tocava a alma. (…)
“Que seja claro o teu céu, que seja luminoso e sereno o teu doce sorriso e bendita sejas pelos minutos de felicidade e de alegria que deste a outro coração solitário e agradecido .Meu Deus! Um minuto inteiro de felicidade! Não será isso o bastante para preencher toda a vida de um homem!”
Sou um sonhador; tenho tão pouca vida real, que momentos como estes que presentemente vivo, por demais preciosos, não posso deixar de os repetir nos meus sonhos. Sonharei consigo toda a noite, toda a semana, todo o ano. Amanhã sem falta, voltarei aqui, a este lugar, a esta mesma hora, e sentir-me-ei feliz por recordar o dia de hoje. A partir de agora, este lugar é querido aos meus olhos. Existem dois ou três locais assim em Petersburgo.”
“Sentimos que, por fim, a fantasia, esta inesgotável fantasia, dá sinal de estar cansada, esgotada numa permanente tensão, porque amadurecemos e começamos a deixar para trás os nossos antigos ideais: estes desmoronam-se em bocados e desfazem-se em pó, e, se não existe outra vida, é preciso construí-la a partir desses mesmos fragmentos. Contudo, a alma pede e deseja outra coisa! Em vão o sonhador busca no meio dos seus velhos sonhos, como entre a cinza, à procura de uma ténue centelha para reavivar a fantasia, para inflamar um fogo novo no seu coração arrefecido e ressuscitar nele tudo o que dantes lhe era tão caro, que lhe fazia ferver o sangue e lhe tocava a alma, que lhe fazia chegar lágrimas aos olhos, iludindo-o maravilhosamente.
E novamente me pergunto: mas o que você fez dos seus anos?
Que seja claro o seu céu, que seja luminoso e sereno o seu lindo sorriso; abençoada seja você pelo momento de júbilo e felicidade que concedeu a um coração solitário e agradecido!
Meu Deus! Um momento inteiro de júbilo! Não será isto o bastante para uma vida inteira?…