Compilação de cartas escritas pela autora antilhana Françoise Ega e que jamais foram entregues ganha edição brasileira após mais de 40 anos
As cartas são, sem dúvida, a forma mais íntima e potente de contar sobre si mesmo. O relato das cartas, ainda hoje, é a forma que, lançada no tempo, consegue mostrar as muitas facetas da humanidade, desde uma individualidade intensa até uma questão coletiva e social expressa na vida dos sujeitos que as escreve. Uma incrível relação entre cartas se deu – sem se dar – entre Carolina Maria de Jesus (1914-1977) e a escritora antilhana Françoise Ega (1920-1976), ambas com a mesma origem social e que se conectavam com o mundo através da palavra.
Carolina durante muitos anos trabalhou como catadora de papel, mas seu papel no muito sempre foi o de escrever. E foi anos depois, exatamente após ler um trecho sobre o livro de Carolina de Jesus numa revista que a antilhana Françoise Ega, tomou coragem escrever sobre sua vivência. Ega, diferentemente de Carolina, era faxineira e costureira na cidade de Marselha e o meio que ela encontrou para se comunicar com a brasileira foram as cartas.
Segundo matéria da Vogue, foi por meio de cartas autobiográficas destinadas à escritora que Françoise Ega se tornou uma escritora. Escritora graças a Carolina de Jesus e escritora de cartas para Carolina de Jesus. Cartas que nunca foram enviadas. Porém, esses preciosos relatos agora estão recuperados em Cartas a uma Negra, livro publicado em 1978 e que chega pela primeira vez às prateleiras brasileiras a partir do dia 9, pela editora Todavia.
Françoise é natural de Le Morne-Rouge, na Martinica, e, ainda segundo a Vogue, é dona de uma poesia ímpar e com outros dois livros publicados ao longo de sua trajetória (Le Temps des Madras: Récit de la Martinique, em 1966; e L’Alizé Ne Souf lait Plus, em 2000), passeia por debates como a tensão da imigração para a França, o preconceito racial e a luta de classes, principalmente a relação entre patroa e empregada.
Confira alguns trechos:
“Pois é, Carolina, as misérias dos pobres do mundo inteiro se parecem como irmãs. Todos leem você por curiosidade, já eu jamais a lerei”
“Vivo correndo, como todas as donas de casa atoladas em serviço, leio livros condensados… Para escrever alguma coisa, preciso esconder meu lápis, senão as crianças somem com ele e com meus cadernos”
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