Joel Rufino dos Santos (1941-2015) foi historiador, professor, escritor e ativista do movimento negro. Ganhou 3 vezes o prêmio Jabuti e escreveu mais de 50 livros. Por ter participado do livro História Nova do Brasil, que propunha uma reforma no ensino da disciplina, Rufino foi preso em dezembro de 1972. Entre suas obras publicadas está Quando eu voltei, tive uma surpresa, ganhador do prêmio Orígenes Lessa, em 2000, para jovens leitores. O livro reúne 32 cartas enviadas ao filho Nelson, de oito anos, no período de 1973 a 1974, em que foi preso político. Elas só puderam ser publicadas porque a mãe de Nelson as guardou, enquanto aquelas enviadas pelo filho para Joel não foram liberadas após a sua saída da prisão.
Em um momento, Santos explica ao filho o porquê de sua prisão e reafirma a convicção nos seus ideais:
Eu viajei logo depois do Natal. Se lembra? Fui ao norte do Brasil, trabalhar.
Quando eu voltei, tive uma surpresa. Fui convidado pelo governo a contar algumas coisas que eu fiz. Por exemplo: eu dei algumas aulas sobre coisas que o nosso governo não gosta; contei algumas histórias que o nosso governo não gosta que se conte; e, finalmente, escrevi alguns livros que o nosso governo também não gostou. Aí, o governo me pediu que esclarecesse todas estas coisas. […] Eu acho que tenho razão. As aulas que dei, as histórias que eu contei e as coisas que eu escrevi nos meus livros e nos jornais – eu acho que são coisas certas. O governo não acha (SANTOS, 2000, p. 9).
O autor utiliza sua imaginação para contar histórias como de Zumbi dos Palmares, ilustrando com desenhos, o Velho e o Mar de Ernest Hemingway, o nascimento de Jesus, a lenda de Iemanjá e várias outras.
Ele também emprega outros recursos como recortes de figuras e lugares históricos, postais antigos e atuais (1973) do Rio de Janeiro, sua terra natal. Em vários trechos, evidencia a saudade da sua terra, descrevendo o Pão-de-açúcar, praias e bondes.
As cartas são coloridas e ricas em figuras. Ele faz questão de escrever com as canetinhas que foram presentes do filho Nelson. Tudo isso, permite que ele se aproxime do mundo infantil e, desse modo, desperte a atenção do filho. Com a finalidade de evitar precoces decepções, usa a imaginação para que a realidade possa ser traduzível aos olhos de uma criança.
É um livro que relata a luta de um pai na tentativa de manter contato, evitar o sofrimento do filho e amenizar a saudade. Mesmo tendo o direcionamento a um leitor específico, a obra traz, entre outros, um importante ensinamento, permite compreender que a ausência física não anula ou extingue o sentimento, é a comunicação que promove a aproximação, materializado, nesse caso, pelas cartas que ultrapassam as grades que isolam o narrador do mundo exterior e possibilitam o contato com as pessoas que lhe são estimadas.
Resenha do artigo publicado em 2015: Letras em revista UESPI