Meu poeta favorito é Fernando Pessoa. Quando li pela primeira vez “A Tabacaria” descobri o significado de sublime. Nenhuma das leituras subsequentes do poema teve o mesmo efeito. Oh! Quem dera fosse possível lê-lo novamente pela primeira vez… ou talvez seja possível encontrar a mesma sensação na poesia de outrem? Para investigar esta segunda hipótese, mergulhei de cabeça num documentário que teve sua estreia recentemente no Festival de Cinema de Gramado.
Um documentário sobre poesia não poderia ser feito sem Fernando Pessoa. Por isso, passam-se apenas dez minutos de “Poemaria” até que um poema de um de seus heterônimos, Álvaro de Campos, seja declamado pelo escritor Marcelino Freire. Não é o primeiro poema a ser declamado, seja pelos próprios autores e autoras ou por terceiros – incluindo aí nomes como Mayakovsky e Florbela Espanca.
O estilista Fause Halten compara escrever uma poesia a criar uma roupa, costurando palavras como se costuram tecidos. O ator Nilton Bicudo encontra poesia em todas as frases que saem de sua mente. Para a escritora Martha Nowill fazer poesia é estar em constante estado de atenção, que requer “uma pré-disposição da massa cinzenta”. O laureado escritor Ignácio de Loyola Brandão garante que nunca fez poesia – ao menos, não conscientemente – porque é muito difícil! A riqueza das entrevistas fica patente nesta amostra, mas há muito mais nos 74 minutos de projeção.
Tecnicamente, “Poemaria” é simples, até mesmo “quadradão”. O formato é de 24 pessoas sentadas frente a uma câmera estática, com um fundo de tecido preto, num diálogo, quase monólogo, acompanhado de declamação de poesias. Um documentário completamente diferente, mas sem dúvida também instigante, poderia ser feito apenas trocando os entrevistados.
“Poemaria” vem sendo manufaturado há quase dez anos, e deu origem, além do documentário, a um blog e um aplicativo, o Declamaí. Ademais, todo o processo de gestação da iniciativa múltipla Poemaria será futuramente narrado em um livro.
O diretor, argumentista e produtor Davi Kinski estreia no mundo dos longas-metragens com um projeto profundamente autoral, e sobre ele declara:
“Poemaria nasceu para disseminar poesia. Os depoimentos são muito intimistas e nos emocionam ao cruzarem histórias pessoais e declamações de poesias que marcaram a vida de cada um, sejam de autoria própria ou de poetas conhecidos”.
Adélia Prado diz que o poeta não cria a poesia, mas sim experimenta aquela sensação maravilhosa, de que a vida tem significado, como todos somos capazes de experimentar, e a coloca no papel. A partir da fala dela, que está muito em evidência por ter ganhado neste ano de 2024 os Prêmios Machado de Assis e Camões, podemos concluir que todos temos a capacidade de fazer poesia. Isso pode até ser questionado por alguns, mas uma coisa é certa: todos podemos viver melhor se agregarmos poesia no nosso dia a dia.
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