Com folhas de outono, Aki Kaurismäki faz uma comédia romântica da classe trabalhadora trazendo cores para uma Finlândia cinzenta
Filme de alguns contrastes entre tema e estética, Folhas de outono tem um aspecto esquisitinho, colorido de cores primárias, pitoresco, para retratar uma comédia romântica proletária. Onde o romance vem muito de um encantamento pueril com a figura do outro quase como caricatura. Gente com cara de gente de verdade se apaixonando.
E onde a comédia vem de diálogos muito precisos e de situações pitorescas e peculiares que sempre parecem se aproximar demais de problemas reais e temas mais pesados. Relando neles. Ameaçando cair. Mas nunca se jogando de fato. O filme é, nesse sentido, uma valsa na beira do abismo.
Curto e grosso às vezes, muito da relação dos personagens vem do esforço para leves mudanças de rotina. Uma pessoa decide comprar um prato e um par de talheres pra receber a outra. Outra decide abrir mão da bebida para reconquistar a uma. Jogando com convenções da comédia romântica, o filme é feito desses grandes pequenos atos. Assim como ele se desenrola em um enredo que cria um problema grande a partir de coisas minúsculas. Um bilhete que cai do bolso da jaqueta.
Uma cena triste demais no contexto que vem minutos depois de uma engraçada demais. Quando uma pessoa sai do cinema depois de um filme de zumbi de Jim Jarmusch e diz que lembrou de Diário de um pároco da aldeia.
O retrato da Finlândia faz muito parte do charme aqui. Um país que é meio nórdico, meio leste europeu. Onde sempre paira o ruído do imperialismo russo da região. Em piadas ótimas como quando ela fala “quer ouvir uma música?” e liga o rádio só para ouvir o noticiário sem fim da guerra da Ucrânia.
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O aspecto trabalhista da coisa se faz presente o tempo todo. Sem pesar a mão. Um filme de gente pobre que é muito próximo da gente nos detalhes. Pegar um enlatado um dia depois do vencimento pra economizar dinheiro. Sair apagando as luzes ao se deparar com a conta de luz. Mas que nunca pesa a mão de fato.
Tudo em um mundinho plástico e bucólico. Se for para comparar com alguém. No todo, o filme parece um casamento entre um Roy Andersson, Norah Ephron e Ken Loach. Caminhando com a política de um e a cosmética de outro pra fazer um filme levado pela doçura e leveza da outra.
Veja o trailer aqui: