Os 6 melhores poemas de Maya Angelou

Maya Angelou foi tudo que uma artista pode ser: poeta, escritora, ativista, biógrafa, bailarina, cantora, performer, contadora de história, ensaísta e compositora. Nascida em St. Louis, Missouri, em 1928, Angelou (nascida Marguerite Ann Johnson) é considerada um dos maiores nomes da cultura americana e uma das melhores escritoras de seu país.

Deixou um legado artístico e político de potência, tendo sido uma importante aliada de Martin Luther King e Malcolm X na luta pelos direitos civis nos EUA. Para além da sua efetiva particação política, Maya Angelou foi a primeira motorista negra de ônibus de San Francisco, tendo apenas 15 anos na época, e foi um exemplo vivo da conquista pela equidade de direitos.

Maya Angelou foi uma poeta. Seus temas mais centrais são a força da mulher, o espírito humano e a questão da pessoa negra numa sociedade racista. Seus poemas percorrem a vida de pessoas negras da época da escravidão aos rebeldes anos 60; a angústia sofrida pelo sujeito negro quando é forçado à submissão, e os desdobramentos de uma vivência enclausurada.

A partir da escrita, Maya Angelou pôde exercer uma liberdade singular, sendo uma marca na literatura americana e na histórias dos sujeitos historicamente silenciados. Como exemplo disso, os seguintes poemas são emblemáticos da sua palavra mais liberta.

Arte de Jeffrey Smith

HOMENS

Quando eu era nova, tinha por hábito
Observar por trás das cortinas
Homens que subiam e desciam a rua. Os homens da manguaça, os homens de idade.
Homens moços afiados feito mostarda.
Veja. Os homens estão sempre
Indo a algum lugar.
Sabiam que eu estava lá. Quinze
Anos e faminta por eles.
Sob minha janela, eles paravam,
Os ombros altos como os
Peitos de uma moça,
A cauda dos casacos batendo
Naqueles traseiros,
Homens.

Um dia eles te seguram nas
Palmas das mãos, gentis, como se você
Fosse o último ovo cru do mundo. Então
Te apertam. Só um pouco. O primeiro
Aperto é bom. Um abraço rápido.
Suave na sua fraqueza. Um pouco
Mais. A dor começa. Arranca um
Sorriso que contorna o medo. Quando o
Ar desaparece,
A mente estoura, explodindo com violência, breve,
Como a cabeça de um fósforo. Estilhaçada.
É o seu sumo
Que escorre pelas pernas deles. Mancha os sapatos.
Quando a terra se põe outra vez no lugar,
E o gosto tenta voltar à língua,
Seu corpo já se fechou. Para sempre.
Chave nenhuma existe.

Então a janela se cerra toda sobre
Sua mente. Lá, além
Do balanço das cortinas, os homens caminham.
Sabendo algo.
Indo a algum lugar.
Mas desta vez eu vou só
Ficar aqui e observar.

Talvez.

(Tradução de Adriano Scandolara)

MULHER FENOMENAL

Lindas mulheres indagam onde está o meu segredo
Não sou bela nem meu corpo é de modelo
Mas quando começo a lhes contar
Tomam por falso o que revelo

Eu digo,
Está no alcance dos braços,
Na largura dos quadris
No ritmo dos passos
Na curva dos lábios
Eu sou mulher
De um jeito fenomenal
Mulher fenomenal:
Assim sou eu

Quando um recinto adentro,
Tranqüila e segura
E um homem encontro,
Eles podem se levantar
Ou perder a compostura
E pairam ao meu redor,
Como abelhas de candura

Eu digo,
É o fogo nos meus olhos
Os dentes brilhantes,
O gingado da cintura
Os passos vibrantes
Eu sou mulher
De um jeito fenomenal
Mulher fenomenal:
Assim sou eu

Mesmo os homens se perguntam
O que vêem em mim,
Levam tão a sério,
Mas não sabem desvendar
Qual é o meu mistério
Quando lhes conto,
Ainda assim não enxergam

É o arco das costas,
O sol no sorriso,
O balanço dos seios
E a graça no estilo
Eu sou mulher
De um jeito fenomenal
Mulher fenomenal
Assim sou eu

Agora você percebe
Porque não me curvo
Não grito, não me exalto
Nem sou de falar alto
Quando você me vir passar,
Orgulhe-se o seu olhar

Eu digo,
É a batida do meu salto
O balanço do meu cabelo
A palma da minha mão,
A necessidade do meu desvelo,
Porque eu sou mulher
De um jeito fenomenal
Mulher fenomenal:
Assim sou eu.

(Tradução de Rita Cammarota)

INSONE

Há certas noites em que
o sono se faz de pudico,
distante e desdenhoso.
E todos os ardis
de que tenho me valido
para ganhar os seus favores
são inúteis como orgulho ferido,
e muito mais dolorosos.

(Tradução de Adriano Scandolara)

MESMO ASSIM EU ME REERGO

Você pode me menosprezar na história,
Com suas mentiras distorcidas e amargas,
Você pode me pisotear nessa lama,
Mas mesmo assim, como poeira, eu me reerguerei.

A minha impertinência lhe  incomoda?
Por que você está perturbado em melancolia?
Porque eu ando como se tivesse poços de óleo
Jorrando na minha sala de estar.

Bem como luas e como sóis,
Com a certeza das marés,
Bem como esperanças brotando alto,
Mesmo assim eu me reerguerei.

Você queria me ver quebrada?
Cabeça inclinada e olhos para baixo?
Ombros caindo como lágrimas.
Fraquejando pelos gritos do meu âmago.

A minha arrogância lhe ofende?
Não leve isso tão a sério
Porque eu rio como se tivesse minas de ouro
Sendo escavadas no meu quintal.

Você pode atirar em mim com as suas palavras,
Você pode  me cortar com os seus olhos,
Você pode me matar com o seu ódio,
Mas mesmo assim, como o ar, eu me reerguerei.

A minha sensualidade lhe ofende?
É realmente uma surpresa
Eu dançar como se tivesse diamantes
Onde minhas coxas se encontram?

Das tocas da vergonha da história
Eu me reergo
Saindo de um passado enraizado na dor
Eu me reergo
Eu sou um oceano negro, borbulhante e vasto,
Vertendo e me expandindo eu agüento a maré.
Deixando para trás noites de terror e medo
Eu me reergo
Rumo a um amanhecer que é surpreendemente claro
Eu me reergo
Trazendo os presentes que meus ancestrais deram,
Eu sou o sonho e a esperança do escravo.
Eu me reergo
Eu me reergo
Eu me reergo.

(Tradução de Brenda Nepomuceno)

PÁSSARO NA GAIOLA

Um pássaro liberto salta
nas costas do vento
e plana rio abaixo
até o fim da corrente
e molha suas asas
no laranja raio de sol
e ousa assumir o céu.

Mas um pássaro na espreita
de sua estreita gaiola
mal pode ver através de
suas grades de fúria
suas asas estão presas e
seus pés estão amarrados
e assim estica sua garganta para cantar.

O pássaro engaiolado canta
com um trilo temeroso
do que desconhece
e no entanto ansia
e seu som é ouvido
no monte distante
pois o pássaro na gaiola
canta da liberdade.

O pássaro liberto pensa em outros ares
e os ventos alísios se amaciam por entre as árvores que respiram
e as gordas minhocas esperam na grama cor-de-amanhecer
e ele chama o céu de seu.

Mas um pássaro engaiolado se posta em seu caixão de sonhos
sua sombra grita o grito dos pesadelos
suas asas estão cortadas e seus pés presos
e assim estica a garganta para cantar.O pássaro engaiolado canta
com um trilo temeroso
do que desconhece
e no entanto ansia
e seu som é ouvido
no monte distante
pois canta da liberdade
o pássaro na gaiola.

(Tradução de Bianca Peter, para o Notaterapia)

TOCADA POR UM ANJO

Nós, desacostumados a coragem

Exilados da graça

Vivemos encolhidos em conchas de solidão

Até que o amor deixe o seu alto e sagrado templo

E se revele

Para nos libertar em vida.

O amor nos alcança

E em seu cortejo vem os êxtases

Velhas memórias do prazer

Antigas histórias de dor.

Se formos corajosos, no entanto,

O amor afasta as correntes do medo

De nossas almas.

Desacostumados por nossa timidez,

No clarão das luzes amorosas

Nós ousamos ser corajosos

E de repente vemos

Que o amor sacrifica tudo que somos

E o que seremos.

E, no entanto, é só o amor

Que nos liberta.

(Tradução de Ana Calazans)

KIN (Para Bailey)

Estávamos envoltos em anéis vermelhos

De sangue e solidão

Antes que caíssem as primeiras neves

Antes das nuvens semeadas por rios lamacentos

Acima de uma floresta virgem, e

Homens correram nus, azuis e pretos

Esfolados nos abraços quentes de Sheba, Eva e Lilith.

Eu era sua irmã.

Você me deixou para obrigar estranhos

Como um irmão, exigente

A pagar tributos que eles nunca

Deveram ou Poderiam honrar.

Você lutou para morrer, pensando

Que na destruição está a semente

Da criação. Você pode ter razão.

Eu me lembro de caminhadas em silêncio

Nos bosques do Sul e longas conversas

Em voz baixa

Protegendo seu sentido das orelhas grandes

Dos adultos curiosos.

Você pode ter razão.

Em seu lento retorno

De regiões sangrentas e de terror

Gritos, cortam meu coração.

Escuto de novo a risada

Das crianças e vejo vaga-lumes

Espalhando pequeninas explosões em

Um crepúsculo do Arkansas.

(Tradução de Ana Calazans)

Créditos da imagem: Michael Ochs Archives/Getty Images

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