Entrevista com o escritor Dylan Ricardo, autor de Mil poemas e um suicídio

Prestes a lançar sua sétima obra, o escritor pernambucano Dylan Ricardo, natural de Recife, nos concedeu uma entrevista contando sobre sua relação com a literatura, seu processo de escrita, e também dando uma prévia da sua nova obra, Contos Noturnos, a ser lançada nos próximos meses.

Dylan Ricardo é autor das obras Nas Brumas do Desalento, No Zênite da Insanidade, Asas de pedra (publicados pela Editora Chiado) Mil poemas e um suicídio (este com um conto e cem sonetos), Do Inferno (ambos publicados pela Cultura em Letras Edições) e Estado Terminal (publicado pela editora All Print Editora) todas com poemas de inspiração gótica, decadentista, romântica, simbolista e ultrarromântica nos quais descreve liricamente trajetórias existenciais abarrotadas de desânimo, decepções e sonhos destruídos. Trazendo reflexões ao leitor sobre a sua própria existência, seus desejos e atos praticados. Muitos desses poemas tornaram-se crônicas do cotidiano de uma personalidade insatisfeita, realista e questionadora, por se referirem a assuntos voltados ao relacionamento humano, às lembranças e à efemeridade da vida. Além de dedicar-se no momento a outros livros de poesias, enveredou também por contos voltados ao horror e às peças de teatro. Segundo o próprio autor, seu interesse e sombria necessidade de investigar os insanos hábitos humanos o levaram a aprofundar-se não só em estudos de filosofia e psicologia, mas na própria literatura. Filho de musicistas, pai maestro, compositor e violinista e mãe violoncelista, sempre esteve ligado às artes desde a infância, quando criança frequentava, levado por seus pais, aos ensaios da Orquestra Sinfônica de Recife, que ocorriam no Teatro de Santa Isabel, localizado em sua cidade.

Confira abaixo a nossa entrevista exclusiva com o autor.

Como surgiu o seu gosto pela escrita gótica e pelo horror? Quais autores você diria que foram/são suas maiores inspirações?

Minha escrita não é especificamente gótica. Há uma mescla de goticismo, simbolismo, romantismo e ultrarromantismo. E alguma outra coisa fornecida pela minha personalidade. Resumindo, eu poderia classificá-la de uma forma geral como decadentista aos moldes do século XIX.

Não posso traçar um ponto inicial, a escrita se desenvolveu com o passar dos anos. Aflorou espontaneamente. Brotou naturalmente a partir da necessidade de manifestar insatisfações. Escrevo desde pré-adolescente. Na época, posso afirmar, que era uma forma de externar os efeitos nocivos da depressão, e de minha incapacidade de adaptação ao meio, sentimento que me acompanha até hoje, mas com o tempo, a idade e a experiência adquirida na vida; a custa de muitas leituras, o estilo foi tomando forma e se depurando.

Hoje tenho vinte livros escritos (e mais surgindo), com seis publicados e outros engatilhados. Esse ano, creio, mais três irão para as gráficas.

O horror me acompanha como uma visão de mundo, é uma consequência de como entendo a realidade. A condição humana me provoca desesperança e por muitas vezes é necessário fantasiar para não ser abocanhado pelos dias.

Sei que minha idiossincrasia é fruto de um crivo peculiar e negativo. Apesar de eu escrever sobre a rosa, também discorro acerca de seus espinhos. Vejo o conjunto, não apenas um lado.

Falar sobre o espinho é o meu lado realista — que mesclo com o simbolista — e discorrer sobre a rosa é o flanco sonhador. Talvez seja a gota de esperança que ainda obstina-se em existir.

Minha inspiração é advinda do que vivi: das decepções, tristezas, sonhos destruídos, etc. Mas o estilo, sua construção, é proveniente do aprendizado que tive com várias leituras. A partir delas houve uma identificação de métrica. Álvares de Azevedo, Casimiro de Abreu, Castro Alves, George Byron, Verlaine, Keats, Percy Shelley, Baudelaire, Rimbaud, Oscar Wilde, e, claro, Edgar Allan Poe. São muitas as fontes inspiradoras.

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Qual foi seu primeiro contato com a poesia gótica? E com o horror?

Meu primeiro contato com o horror foi no momento em que comecei a raciocinar e a observar o mundo. Não há maior horror do que estar vivo, mas, essa é minha visão pessoal. Minha personalidade me levou por caminhos literários onde a compatibilidade se mostrou de imediato. Ler os contos de Guy de Maupassant, Bram Stoker, Mary Shelley, Edgar Allan Poe, Daniel Dafoe, dentre outros, me ajudou a descobrir meu estilo, mas não a formar a personalidade. Buscar por eles foi apenas uma consequência dela. Da mesma maneira que ler Augusto dos Anjos me forneceu a identificação e a descoberta do gênero que em mim já era latente.

Para escrever é fundamental ler, e isso faço com extrema dedicação. Mas não é só através da leitura que as ideias surgem, minha história de vida fornece material suficiente.

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Você planeja seus escritos, estruturando o enredo dos contos ou a sonoridade intencionada, número de sílabas dos poemas, ou costuma seguir a inspiração e editar depois?

Já levei vinte e quatro horas para escrever um soneto, e quando o terminei, outros surgiram e foram finalizados em minutos. O processo criativo tem vida própria e permaneço à mercê de seus caprichos. Crio a partir de memórias, de imagens e de textos. Apenas surge e deixo-me levar. É um processo doloroso. Escrever me rouba a saúde e a sanidade. Se não houver algum tipo de sofrimento, a poesia está perdida. Sequer o escrito pode ser chamado de poema. E métrica, para mim, é de radical importância. Escrevo muitos sonetos, tercetos, sextetos, quintilhas, etc. Utilizando também palavras de pouco uso diário. Isso requer pesquisa profunda, dedicação e noites sem dormir. Posso dizer que minha existência tem por base a leitura e a escrita, e a elas dedico-me sem reservas.

Não costumo a escrever a partir de um titulo, pois se assim o fizer estarei preso a ele. Gosto da liberdade criativa, o título vem depois. Eu edito durante o processo, buscando a melhor palavra, o encaixe perfeito e a sonoridade conveniente, procuro mesclar a frieza da técnica com a calidez do conteúdo.

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Possui algum ritual para a hora de escrever? Alguma hora determinada? Número de páginas ou de palavras mínimo?

Geralmente escrevo de madrugada, sentado em um colchão no chão, deixando-me levar por lembranças. Por muitas vezes coloco fones de ouvido onde Vivaldi quase sempre está presente. Mas o chamado estilo “Dark ambient” também ajuda a criar o clima propício para que as ideias surjam. Música, para mim, é de extrema importância, pois ela consegue “pescar” o que às vezes nem sei que está perambulando pelos abismos de minha psique.

Há uma zona escura onde tenho tudo guardado, uma caixa perdida por algum corredor dos labirintos de meu cérebro. E a ela sempre consigo alcançar. Em seu interior há rostos, frases, acontecimentos, lágrimas, e muita história. Essa caixa não tem fundo, e por muitas vezes me engole. Escrevo após chafurdar por um bom tempo em seu interior.

É impossível sair dela completamente, ou incólume.

Lá há muito material para temas, como também estes materiais existem em tudo o que leio. Há material em Dostoiévski, em Tolstoi, em Tcheckov, Tueguêniev, Gogol, como há em Camilo Castelo Branco, Machado de Assis, José de Alencar, Aluísio Azevedo, etc. Encontro inspiração até em Jane Austen. Eu absorvo tudo e decodifico a partir de meu peculiar entendimento.

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Qual das suas obras diria que é a sua favorita até hoje e por quê?

Muito difícil dizer. Todas são partes de mim. Costumo a dizer que meus livros são órgãos externos. Agora estou começando a escrever romances. Esse ano será publicado um livro com dez contos de horror, e já estou trabalhando em outro, com mais dez, além de um romance (que já está na página 250 e sem previsão de terminar). Costumo a escrever mais de dois livros ao mesmo tempo, como a ler mais de três.

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Conte sobre como surgiu a ideia do seu mais recente livro, Mil Poemas e Um Suicídio?

Muito difícil falar disso. O personagem surgiu a partir de meus próprios questionamentos. Posso resumir escrevendo aqui parte de sua introdução. Que resume bem a resposta: O protagonista desta obra está completamente perdido. Abandonado não só ao inferno da realidade, mas à sorte de um comportamento destrutivo. Sonhador, preferiu nutrir seus dias com hábitos quase autistas, buscando no mundo dos livros refúgio e acolhimento. Decidiu imergir na fantasia desejada, apesar de permanecer assombrado pelos fatos do passado. As decepções e os erros lhe perseguem sob a forma de arrependimentos e despertos pesadelos, tornando sua rotina uma penalidade.
Sua taciturna forma de ser, cultivada ao longo dos anos no sombrio molho da negatividade, o fez aprofundar-se no mundo das obras ultrarromânticas e simbolistas, tendo nelas encontrado inspiração não só para escrever, mas também conduzir seu “estilo de existir”.
Anacrônico, isolou-se em seu minúsculo quarto, convertendo a sua cela mental em cárcere físico, e ali, vitimado por lembranças e desejos regurgitou violentamente em textos, perdas, sonhos, dores e revoltas.

Podemos afirmar, sem dúvida, que sua existência, por ser recheada de infaustos eventos, lhe forneceu material suficiente para o pessimismo e desesperança que permeia suas composições. Sendo todas prolongamentos de sua própria personalidade transtornada.

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Como foi o processo de escrita dos cem sonetos que compõem o livro?

Ininterrupto, noturno, sofrido. Estou chegando ao soneto de número 500, e espero lançar todos em uma obra. Há muitos assuntos expostos, os temas são variados, mas todos falam, de uma forma geral, sobre a condição humana, e obviamente sobre mim.

Posso afirmar que tudo o que escrevo faz parte de minha biografia.

Escrever é mergulhar em si, é afogar-se no abismo do âmago. É uma queda dolorosa em um desfiladeiro sem fundo. Quando escrevo, passeio pelo inferno dos meus pensamentos.

Escrever dói, até fisicamente. Quando somatizo lembranças, desabrocham algias poéticas que precisam ser escritas.

É o que deixarei para a posteridade… se é que alguém se lembrara de minha passagem por este mundo.

Tenho plena consciência da transitoriedade, e esta certeza me impele a querer registrar tudo o que passei. Mas certamente que o motivo de minha escrita não é só esse. Escrevo para descarregar um pouco o peso que me esmaga o intelecto.

Muitas vezes pensar é uma penalidade.

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O seu próximo lançamento será o livro Contos Noturnos, certo? Pode revelar um pouco sobre do que se trata?

São dez contos de horror, de temas variados: Um homem que descobre ter acordado no pior lugar do mundo. Um estranho espelho deixado de herança por uma tia excêntrica. As assustadoras mensagens de uma misteriosa caixa antiga. Uma corriqueira conversa de bar que leva a terríveis conclusões. Um perturbado escultor e sua diabólica estatueta de gato. O encontro de dois Serial-Killers. O doentio humor de um palhaço. A obsessão de um jovem por uma coloração. Um cão de sombrio comportamento. As reflexões de um monstro.

Estou escrevendo outro com mais dez contos, e um romance, também de horror. Além de ter mais três livros de poesias prontos e outros surgindo.

Sou um leitor dedicado e um escritor compulsivo.

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Após este livro, quais os planos para projetos futuros? 

Planos? Escrever e ler. Só. Passar o resto dos meus dias publicando. Não há final. Nasci para isso e continuarei até que seja fisicamente impossível. Escrever para mim é exorcizar, mas ao mesmo tempo é uma punição.

É uma necessidade natural e uma imposição existencial.

Se posso dizer que tenho um plano, este é o de permanecer vivo para poder continuar a ler e a escrever, mas… lhe asseguro… permanecer vivo está cada dia mais difícil.

 
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