Julio Cortázar, “o grande cronópio”, é um escritor argentino bastante conhecido por contos como Casa Tomada, As babas do diabo (inspiração de Antonioni para o longa “Blow-Up – Depois Daquele Beijo”), Carta a uma senhorita em Paris e A Autoestrada do Sul, dentre outros, além do romance Rayuela (traduzido como O Jogo da Amarelinha no Brasil).
Algumas das características cortazarianas são encontradas em várias de suas obras, como a busca e a colagem, ambas perceptíveis na última obra escrita por Cortázar e sua então esposa, Carol Dunlop.
Quién podría sospechar que no íbamos a ninguna parte? (Quem poderia suspeitar que não íamos a nenhuma parte?)
“Os autonautas da cosmopista ou uma viagem atemporal Paris-Marselha” é um livro escrito a quatro mãos, pelo escritor argentino Julio Cortázar e sua então esposa Carol Dunlop. O surpreendente texto narra a viagem empreendida pelo casal, a bordo de uma Kombi denominada “Fafner”, pela Autopista do Sul, partindo de Paris rumo à Marselha. O surreal? O cortazariano nesta história toda? A viagem que duraria apenas algumas horas durou 33 dias.
Cortázar e Dunlop tinham apenas duas regras: não sair nunca da estrada, e ir parando nos “parkings” ao longo do trajeto. Em “Los Autonautas de la Cosmopista”, a estrada passa de um lugar de passagem a um território a ser poeticamente explorado. Definida por Carol Dunlop como “viagem pelo avesso”, essa expedição lúdica tem o mérito de quebrar com a sensação de continuidade ininterrupta que a estrada comumente nos produz.
O deslocamento lento não fez com que o casal fugisse da realidade, pelo contrário: entre paradas para dormir, se alimentar e catalogar plantas diferentes, Cortázar e Dunlop se mantinham informados acerca dos acontecimentos mundo afora, como a Guerra das Malvinas, por exemplo.
A seguir, leia alguns trechos retirados do livro que transforma a estrada em um microcosmos:
“Quem poderia suspeitar que não íamos a nenhuma parte?”/“Quién podría sospechar que no íbamos a ninguna parte?”
“(…) por uma autoestrada que agora era diferente, já que que a víamos como um território a ser explorado”/”(…) por una autopista que ahora era diferente puesto que la veíamos como un territorio a explorar (…)”
“Esta autoestrada paralela que procuramos apenas existe na imaginação de quem sonha com ela (…)”/“Esta autopista paralela que buscamos sólo existe acaso en la imaginación de quienes suenãn con ella (…)”
“As coisas, então, estavam realmente habitadas; os parkings são o lugar e a hora da verdade, onde a vida continua tendo duas pernas e dois braços, enquanto os robôs da autoestrada encontram-se imóveis, abatidos, mortos em seu silêncio e sua impotência.” /“Las cosas, entonces, estaban realmente habitadas; los paraderos son el lugar y la hora de la verdad, donde la vida sigue teniendo dos piernas y dos brazos, mientras los robots de la autopista yacen inmóviles, abatidos, muertos en su silencio y su impotencia.”
“Incomoda-lhes não compreender verdadeiramente o que estamos procurando, acreditam por acaso que estamos planejando uma reunião suspeita na autoestrada?”/“Los exaspera no compreender verdaderamente lo que estamos buscando, creen acaso que estamos complotando alguna reunión sospechosa en la autopista?”