“Morto, mas ainda conosco, ainda conosco, mas morto.”
O Pai Morto, Donald BarthelmeO Pai Morto é uma narrativa que mexe com o horizonte de expectativas do leitor: o título nos empurra para uma narrativa sobre a relação entre pai e filho, mas o que lemos é uma obra profundamente mergulhada em sua própria linguagem, como se a língua falasse antes da história, e nos conta a (não) vida de uma figura gigantesca, com uma perna mecânica, chamada Pai Morto. Pai Morto, essa figura mito-poética, está sendo levada por um grupo de humanos, Julie, Emma, Thomas, Edmund, para uma pretensa “fonte da juventude”. De caráter parabólico ou não – expondo a linguagem em seu limite, Donald Barthelme escreve uma intrigante obra da literatura americana. Leia mais AQUI!
O NotaTerapia separou as melhores frases da obra:
Nós queremos que o Pai Morto esteja morto. Sentamo-nos com lágrimas nos olhos querendo que o Pai Morto esteja morto – enquanto fazemos coisas fantásticas com as mãos.
Em minha imensidão havia espaço para necessidade de toda sorte de experiências. Assim, decidi que a experiência mecânica integrava as experiências para as quais havia espaço em minha imensidão. Queria saber o que sabem as máquinas.
Tanta idade preenche as cabeças de vocês por inteiro, disse Hilda. Então não conseguem se lembrar de como era ser criança. Não devem se lembrar nem do medo. Tanto da criatura. Tão pouco de você. A fuga para baixo do cobertor.
Jovens nunca entendem a situação como um todo.
Nem insinuo que entendo agora. Eu entendo os contornos, os limites.
Claro que os contornos são mais fáceis de entender.
Pessoas mais velhas tendem a negligenciar os contornos, mesmo quando olham diretamente para eles.
Um filho pode, com dedicação honesta, produzir o que algumas pessoas chamariam, tecnicamente, de filhos. Mas ele continua sendo um filho. No sentido mais pleno.
Nenhuma história aconteceu da maneira que é contada, disse Thomas, mas a moral está sempre correta.
Posso fazer qualquer coisa, desde que não seja importante.
Via de regra minimizamos o prazer. Via de regra enfatizamos a angústia. Guardamos o prazer dentro de nós, em segredo. De vez em quando podemos até mostrar um pouco para alguém – erguer uma ponta do véu, digamos assim. Mas só fazemos isso em busca de uma confirmação íntima do prazer.
A unidade familiar produz zumbis, psicóticos e transviados, disse Thomas. Em número bem maior do que o necessário.
As coisas são simples. O erro é sempre uma possibilidade, mesmo com as melhores intenções do mundo. As pessoas se equivocam. As coisas não são feitas do jeito certo. As coisas certas não são feitas. Há casos que não são claros. É preciso ser capaz de tolerar a ansiedade. Caso contrário é como pular fora do navio, em termos éticos.
Pais são professores do que é verdadeiro ou não, e pai algum jamais ensinaria conscientemente algo não verdadeiro. Assim, é em meio a uma nuvem de inconsciência que o pai transmite sua instrução.
O pai em queda é importante por personificar a “ética do trabalho”, que é uma burrice. A “ética do medo” deveria tomar seu lugar assim que possível. Enquanto fitamos o céu para contemplar sua descida sem fim, vamos simplesmente dar de ombros, desmontar a cama elástica com a qual tentaríamos resgatá-lo e guardá-la novamente sobre as vigas da garagem.
Os pênis dos pais são superiores em tudo aos pênis dos não pais, não por conta do tamanho ou peso ou qualquer estimativa desse quilate, mas por conta de uma “responsabilidade” metafísica.
Qual é o seu totem?
O cartão de crédito.
Muita gente esconde habilmente o que sente.
Sem chegar a lugar nenhum sem fazer nenhum progresso.
Coisas que eu nunca soube como o que torna cinza o calçamento e o que faz os monumentos gigantes avançarem e recuarem no distante horizonte sem cessar noite e dia no distante horizonte e o que causa a fibrilação das folhas nas árvores e o que significa urbanidade e o que faz o coração parar e como unicórnios foram aprisionados em tapeçarias, essas coisas eu nunca aprendi.
Edição: Editora Rocco, 2015
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