Flavio de Carvalho foi um dos grandes nomes do modernismo brasileiro. Antropófago, fez diversos trabalhos que provocaram o status quo do Brasil da primeira metade do século. Era arquiteto, engenheiro, cenógrafo, teatrólogo, pintor, desenhista, filósofo, músico, entre outros. Ficou conhecido por fazer a experiência de sair pela cidade de saia pois achar que “era a roupa ideal para os homens dos trópicos” e pela série trágica “Minha mãe morrendo” em que desenhou sua mãe nos momentos de agonia que anteciparam sua morte. A Origem Animal de Deus é um estudo teórico e a edição de onde as frases foram retiradas é Editora Difusão Européia do Livro de 1973.
É no aparelho digestivo onde nascem os deuses do mundo. O nascimento, a vida, a morte, e a ressurreição do alimento conduzem ao espasmo religioso. (…) A satisfação religiosa é a satisfação da fome. É pela fome que o homem entra em contato com o mundo animal. (…) Apetite é religião. (p.9)
A noção de Bem e de Mal também são geradas na fome. As noções de moral surgem desse contato com essa natureza: o imoral é tudo quanto destrói a unidade do indivíduo e da espécie, e o moral é aquilo que os perpetuam. (p.11)
É pelo intestino e pelo sexo que o homem entra em contato íntimo com a sua natureza: devorando a natureza ele perpetua-se. (p. 11)
O orifício de ingestão de alimentos, a boca, assume grande importância na eclosão social. A boca é usada para o beijo, a fala, a careta e o gesto oral. (…) Com a aquisição de fome e de sede, o homem aprende a atacar e, pelo ataque, ele torna-se táctil e um “connaiseur” da carícia. O Deus do homem do começo é o Deus da fome. (p. 21-22)
O silêncio, a solidão e a ausência de movimento de um Mundo Parado, formam a grande tragédia que conduz ao medo. A passividade pertencia a um mundo parado e é um convite à agressão e ao movimento. A passividade é um estado receptor apropriado ao medo. A ação demonstra uma ausência de medo e é pela ação que o medo é vencido. (p. 29)
Solidão varia inversamente com Movimento. Um aumento no movimento diminui a solidão. As forças em movimento são agressivas e provocam receios e consequentemente medo ao indivíduo parado. (…) O medo é uma função do movimento do indivíduo e o indivíduo em movimento é uma entidade agressiva, portanto sem medo. (p.30)
O herói está sempre ligado à ação violenta, ao sofrimento e expiação e à volúpia. A ação violenta e o sofrimento são expressões para vencer o medo e pertencem ao sadismo e ao masoquismo, ambos produtos das aspirações da natureza humana, e a volúpia e de ambos o prêmio sublime e supremo. (p. 43)
O uso do sexo é uma função da alegria de viver e tem em si os característicos do movimento e é o oposto da abstinência, da melancolia e do medo. A ideia da alma é uma forma de prolongamento eterno do uso do sexo, porque demonstra a continuação do personagem na eternidade (p. 67)
Somente os organismos insatisfeitos, isto é, organismos que anseiam por liberdade, podem promover progresso. (p.71)