Ájax, de Sófocles, a trágica história do herói de Tróia transformado em vilão

Acabei de ler uma peça do Sófocles baseada no mito de Ájax, um dos combatentes da Guerra de Tróia, publicada pela Editora 34 numa edição bilingue sensacional. A curiosidade é que das 6 peças do Sófocles que chegaram até a gente, tudo indica que essa é a primeira, então estamos diante de um Sófocles que estava ainda descobrindo o que seria sua escrita de Édipo e Antígona, por exemplo.

Edição Bilíngue de Ájax, de Sófocles da Editora 34

A figura de Ájax, um dos heróis da Guerra de Troia, tem fascinado o público desde a mais remota Antiguidade. Na Ilíada ele já era retratado como um personagem arcaico, um indômito guerreiro que portava um enorme escudo e eventualmente atirava pedras nos inimigos.

Na tragédia de Sófocles (496-406 a.C.), um dos pontos altos da dramaturgia mundial, o foco volta-se para a sua derrocada. Após o julgamento que destinou as armas de Aquiles a Odisseu, e não a ele, que tinha sido o responsável por deter as forças troianas na ausência do maior herói grego, Ájax se revolta e decide matar Agamêmnon, Menelau e o próprio Odisseu.

Nesse momento intervém a deusa Atena que, na hora que Ájax cata a espada e vai para matar todo mundo, lança sobre ele uma espécie de feitiço em que, enquanto Ájax acha que está matando todo mundo, ele está na verdade matando um rebanho de bois e ovelhas.

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Um vaso retratando o suicídio de Ájax

Totalmente ensanguentado depois da carnificina que faz, tendo sua esposa transformada em escrava, é aí que começa a história de Sófocles: com um herói exausto, devastado, sujo de sangue animal e aniquilado pelo feitiço que lhe enganou. Diante desta situação, Ájax conclui que seria o grande mal de toda aquela história, vai até uma floresta e comete suicídio.

Nesta edição, está incluso o clássico ensaio de Bernard Knox sobre a tragédia, em que o eminente helenista discute esse e outros temas, e a brilhante tradução de Trajano Vieira, na qual toda a riqueza de registros do texto sofocliano foi recriada com talento e esmero em nossa língua.

Separei um trechinho preferido, dito por Tecmessa, esposa de Ajax:

“Há língua que o indizível articule?

Uma ruína se equipara à morte:

a loucura que o abate, nossa glória.

Em meio à noite o ultraje o leva longe:

verás dentro da tenda, em poças rubras,

as vítimas que sua mão mutila,

oferendas do herói em sacrifício.”

Na foto, um vaso representando a morte de Ajax.

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E aí, o que achou da história de Ájax, de Sófocles?

Sobre o autor

Filho de Sófilo, Sófocles nasceu em Colono, vila próxima a Atenas, em 496 a.C. É autor de 123 peças, das quais só conhecemos sete: ÁjaxAntígoneAs TraquíniasElectraÉdipo ReiFiloctetes e Édipo em Colono. Considerado um dos maiores dramaturgos da Grécia Antiga, junto com Ésquilo e Eurípides, teve participação destacada na vida pública de Atenas, seja como tesoureiro entre 443 e 442 a.C., seja como general durante a revolta de Samos (441 a.C.), além de ter sido um dos dez conselheiros designados para reverter a situação crítica por que passava a cidade após a derrota de sua armada em Siracusa (413 a.C.). Viveu cerca de noventa anos, vindo a falecer em 406 a.C.

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