Para além de “Ainda Estou Aqui”: como Eunice Paiva se dedicou a defender os direitos dos indígenas

A história de Eunice Paiva apresentada no filme “Ainda Estou Aqui“, que está concorrendo ao Oscar de Melhor Filme, Melhor Filme Estrangeiro e Melhor Atriz, por meio da atuação de Fernanda Torres, ganhadora do Globo de Ouro, por sua interpretação, não representa em sua totalidade a potência que era Eunice Paiva.

Precisaria de outro filme para demonstrar todo seu legado e todas as nuances desta mulher que fez a diferença não apenas na manutenção da sua família, mas também na preservação de todo um povo indígena.

Eunice, viúva, mãe de cinco filhos, se formou em Direito aos 47 anos e foi uma das pessoas responsáveis pela demarcação do território indígena do povo Zoró, um ano após o fim da Ditadura Militar no Brasil, em 1986.

A luta de Eunice pelo povo Zoró

Quando Eunice Paiva, chega até a casa do povo Zoró, a região sofria forte desmatamento e segundo documentos da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), havia 79 invasores no território, uma estrada com 45 km de extensão, além da ocupação de 24 mil hectares por uma cooperativa de agricultores do Paraná, apoiada pelo governo federal e pelo governo de Mato Grosso, que havia distribuído títulos de terra dentro do território. 

Foi então que Eunice elaborou um parecer jurídico, no qual eram analisados os argumentos favoráveis e contrários relacionados ao reconhecimento da área Zoró como terra indígena, no qual ela categoricamente determina: “Nada impede a demarcação da Área Indígena Zoró”.

A posição de Eunice foi forte e decisiva na demarcação daquele território, que já havia sido devastado e cuja população quase foi extinta por doenças graves levadas pelos brancos, além das mortes pelos invasores, conforme relatos à BBC News Brasil do cacique geral do povo Zoró, Panderewup Zoró.

O cacique do povo Zoró também afirma que:

“Isso só cessou com a demarcação e homologação do nosso território e, com certeza, a doutora Eunice Paiva contribuiu neste processo”, prossegue. Se não tivéssemos tido a cooperação de parceiros para provar em documentos nossa existência e posse da terra desde a nossa ancestralidade, teríamos sido exterminados.” (BBC News, 2025)

Mesmo que à distância, a participação de Eunice foi essencial para a preservação do território do povo Zoró, assim como evitar a extinção do povo, que chegou a ter cerca de 100 pessoas, de acordo com documentos da época.

Certidão de óbito de Rubens Paiva: a outra luta de Eunice

Em “Ainda Estou Aqui“, a abordagem é sobre a luta de Eunice Paiva pelo reconhecimento da morte de seu marido, Rubens Paiva, pelo estado brasileiro. Oficialmente, o engenheiro e ex-deputado estava desaparecido desde 1971. 

Em 1996, Eunice finalmente conseguiu obter a certidão de óbito do marido, com uma retificação que responsabilizava o Estado brasileiro pela morte dele, representando uma das grandes vitórias obtidas por esta mulher, que nunca cansou de lutar, mesmo quando permaneceu em silêncio.

Revisado por Dáleth Costa

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