Os 10 melhores poemas de Florbela Espanca

Florbela Espanca foi uma poetisa portuguesa. A sua vida, de apenas 36 anos, foi plena, embora tumultuosa, inquieta e cheia de sofrimentos íntimos, que a autora soube transformar em poesia da mais alta qualidade, carregada de erotização, feminilidade e panteísmo. Há uma biblioteca com o seu nome em Matosinhos.

Autora polifacetada: escreveu poesia, contos, um diário e epístolas; traduziu vários romances e colaborou ao longo da sua vida em revistas e jornais de diversa índole, Florbela Espanca antes de tudo é poetisa. É à sua poesia, quase sempre em forma de soneto, que ela deve a fama e o reconhecimento. A temática abordada é principalmente amorosa. O que preocupa mais a autora é o amor e os ingredientes que romanticamente lhe são inerentes: solidão, tristeza, saudade, sedução, desejo e morte.

O NotaTerapia separou os melhores poemas da autora. Confira:

SER POETA

Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!

É ter de mil desejos o esplendor
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim…
é condensar o mundo num só grito!

E é amar-te, assim, perdidamente…
É seres alma, e sangue, e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!

PERDIDAMENTE

“Eu quero amar,
Amar perdidamente!
Amar só por amar: aqui… Além…
Mais este e aquele, o outro e a toda gente…
Amar! Amar! E não amar ninguém!
Recordar? Esquecer? Indiferente!…
Prender ou desprender?
É mal? É bem?
Quem disse que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!
Há uma primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi para cantar.
E se um dia hei de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que eu saiba me perder…
Para me encontrar…”

FANATISMO

Minh’alma de sonhar-te anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver
Não és sequer a razão do meu viver
Pois que tu és já toda minha vida

Não vejo nada assim enlouquecida
Passo no mundo meu amor a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida

Tudo no mundo é frágil tudo passa
Quando me dizem isto toda a graça
Duma boca divina fala em mim
De olhos postos em ti digo de rastros

Podem voar mundos morrer astros
Que tu és como um Deus princípio e fim
Podem voar mundos morrer astros
Que tu és como um Deus princípio e fim

Minh’alma de sonhar-te anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver
Não é se quer a razão do meu viver
Pois que tu és já toda minha vida
Não vejo nada assim enlouquecida
Passo no mundo meu amor a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida

Tudo no mundo é frágil tudo passa
Quando me dizem isto toda a graça
Numa boca divina fala em mim
E olhos postos em ti digo de rastros

Podem voar mundos morrer astros
Que tu és como um Deus princípio e fim
Podem voar mundos morrer astros
Que tu és como um Deus princípio e fim

Podem voar mundos morrer astros
Que tu és como um Deus princípio e fim

Eu
Já te falei de tudo
Mas tudo isso é pouco
Diante do que sinto

Veja também: 10 vídeos com poemas de Florbela Espanca que você precisa assistir!

A MULHER

Ó Mulher! Como és fraca e como és forte!

Como sabes ser doce e desgraçada!

Como sabes fingir quando em teu peito

A tua alma se estorce amargurada!

Quantas morrem saudosa duma imagem.

Adorada que amaram doidamente!

Quantas e quantas almas endoidecem

Enquanto a boca rir alegremente!

Quanta paixão e amor às vezes têm

Sem nunca o confessarem a ninguém

Doce alma de dor e sofrimento!

Paixão que faria a felicidade.

Dum rei; amor de sonho e de saudade,

Que se esvai e que foge num lamento!

ANGÚSTIA

Tortura do pensar! Triste lamento!

Quem nos dera calar a tua voz!

Quem nos dera cá dentro, muito a sós,

Estrangular a hidra num momento!

E não se quer pensar! … e o pensamento

Sempre a morder-nos bem, dentro de nós …

Querer apagar no céu – ó sonho atroz! –

O brilho duma estrela, com o vento! …

E não se apaga, não … nada se apaga!

Vem sempre rastejando como a vaga …

Vem sempre perguntando: “O que te resta? …”

Ah! não ser mais que o vago, o infinito!

Ser pedaço de gelo, ser granito,

Ser rugido de tigre na floresta!

DE JOELHOS

“Bendita seja a Mãe que te gerou.”

Bendito o leite que te fez crescer

Bendito o berço aonde te embalou

A tua ama, pra te adormecer!

Bendita essa canção que acalentou

Da tua vida o doce alvorecer …

Bendita seja a Lua, que inundou

De luz, a Terra, só para te ver …

Benditos sejam todos que te amarem,

As que em volta de ti ajoelharem

Numa grande paixão fervente e louca!

E se mais que eu, um dia, te quiser

Alguém, bendita seja essa Mulher,

Bendito seja o beijo dessa boca!!

EU

Eu sou a que no mundo anda perdida,

Eu sou a que na vida não tem norte,

Sou a irmã do Sonho,e desta sorte

Sou a crucificada … a dolorida …

Sombra de névoa tênue e esvaecida,

E que o destino amargo, triste e forte,

Impele brutalmente para a morte!

Alma de luto sempre incompreendida!…

Sou aquela que passa e ninguém vê…

Sou a que chamam triste sem o ser…

Sou a que chora sem saber porquê…

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,

Alguém que veio ao mundo pra me ver,

E que nunca na vida me encontrou!

IMPOSSÍVEL

Disseram-me hoje, assim, ao ver-me triste:

“Parece Sexta-Feira de Paixão.

Sempre a cismar, cismar de olhos no chão,

Sempre a pensar na dor que não existe …

O que é que tem?! Tão nova e sempre triste!

Faça por estar contente! Pois então?! …”

Quando se sofre, o que se diz é vão …

Meu coração, tudo, calado, ouviste …

Os meus males ninguém mos adivinha …

A minha Dor não fala, anda sozinha …

Dissesse ela o que sente! Ai quem me dera! …

Os males de Anto toda a gente os sabe!

Os meus … ninguém … A minha Dor não cabe

Nos cem milhões de versos que eu fizera! …

O MEU ORGULHO

Lembro-me o que fui dantes. Quem me dera

Não me lembrar! Em tardes dolorosas

Lembro-me que fui a Primavera

Que em muros velhos faz nascer as rosas!

As minhas mãos outrora carinhosas

Pairavam como pombas… Quem soubera

Porque tudo passou e foi quimera,

E porque os muros velhos não dão rosas!

O que eu mais amo é que mais me esquece…

E eu sonho: “Quem olvida não merece…”

E já não fico tão abandonada!

Sinto que valho mais, mais pobrezinha:

Que também é orgulho ser sozinha,

E também é nobreza não ter nada!

ÓDIO?

Ódio por Ele? Não… Se o amei tanto,

Se tanto bem lhe quis no meu passado,

Se o encontrei depois de o ter sonhado,

Se à vida assim roubei todo o encanto,

Que importa se mentiu? E se hoje o pranto

Turva o meu triste olhar, marmorizado,

Olhar de monja, trágico, gelado

Com um soturno e enorme Campo Santo!

Nunca mais o amar já é bastante!

Quero senti-lo doutra, bem distante,

Como se fora meu, calma e serena!

Ódio seria em mim saudade infinda,

Mágoa de o ter perdido, amor ainda!

Ódio por Ele? Não… não vale a pena…


Fonte

Related posts

Documentário “Poemaria” nos convida a poetizar o cotidiano

5 poemas de Anna Akhmátova, grande poeta da ‘Era de Prata da Poesia Russa’

“Compaixão” de Anne Sexton: a poesia que confessa e ensina a lidar com a dor