“Seja para lançar um livro de forma independente ou para abrir uma editora, é essencial entender que a literatura é também um negócio.”
Por Karol Lopes*
Um dos grandes equívocos — talvez o maior de todos — que observamos na trajetória de autores e autoras é a crença de que o amor pela literatura, por si só, será suficiente para abrir portas e construir uma carreira de sucesso. Frases como “Amo escrever. Vou abrir uma editora” ou “Literatura é minha paixão. Vou lançar vários livros e viver de escrita” são comuns, mas escondem uma armadilha perigosa.
Assim como no amor romântico, no amor entre amigos ou no amor familiar, o sentimento é importante, mas não é o suficiente para garantir resultados. No mundo literário, o amor pela escrita precisa ser acompanhado de estratégia, planejamento e conhecimento de mercado.
Escrever é, sem dúvida, um ato de paixão. É o que move autores e autoras a passarem horas diante de uma tela em branco, criando mundos, personagens e histórias. No entanto, a ilusão de que apenas o amor pela literatura será suficiente para construir uma carreira sustentável é um erro comum. A realidade é que, para se destacar no mercado literário, é necessário muito mais do que talento e dedicação à escrita.
Seja para lançar um livro de forma independente ou para abrir uma editora, é essencial entender que a literatura é também um negócio. E, como em qualquer negócio, é preciso estudar outras áreas além daquela que inicialmente nos atrai. Saber emitir notas fiscais, ter um CNPJ, precificar produtos, planejar a distribuição, escolher parceiros comerciais e investir em divulgação são apenas alguns dos aspectos práticos que precisam ser considerados.
Um dos maiores desafios para autores e autoras independentes é conciliar a paixão pela escrita com a necessidade de pensar comercialmente. Muitos resistem a essa ideia, achando que isso pode “diminuir” o valor artístico de sua obra. No entanto, pensar comercialmente não significa abandonar o amor pela literatura ou se tornar “mercenário”. Significa, na verdade, entender o valor do que você cria e trabalhar para que ele chegue ao público certo.
Seu livro é um produto, e você é a marca por trás dele. Essa mentalidade pode parecer fria ou distante da paixão que te levou a escrever, mas é ela que vai garantir que o amor pela literatura possa coexistir com uma carreira sustentável. Afinal, de que adianta escrever uma obra incrível se ela não chega às mãos dos leitores?
Perguntas essenciais para quem quer viver de literatura
Se você deseja construir uma carreira sólida como autor ou autora, é fundamental começar a ajustar o foco e responder a algumas perguntas-chave:
1. Qual é o seu público-alvo?
Saber para quem você escreve é essencial para criar estratégias de divulgação eficazes, ajustar o tom da sua comunicação e até mesmo definir o estilo das suas histórias. Conhecer seu público ajuda a direcionar seus esforços de marketing e a criar conexões mais profundas com seus leitores.
2. O que te diferencia no mercado?
Com milhares de livros publicados todos os meses, é crucial entender o que faz o seu trabalho se destacar. É a sua voz única? O tema que você aborda? O seu posicionamento como autor ou autora? Identificar seu diferencial é o primeiro passo para construir uma marca forte.
3. Qual é a sua estratégia de vendas?
Publicar um livro é apenas o começo. Ele precisa ser visto, desejado e comprado. Onde ele estará disponível? Como você vai divulgá-lo? Quem são as pessoas ou empresas que podem te ajudar a levar sua obra adiante? Ter um plano de vendas claro é fundamental para o sucesso.
4. Como você vai financiar seus projetos?
Publicar um livro envolve custos, desde a edição e diagramação até a impressão e distribuição. É importante planejar como você vai arcar com esses gastos e, se necessário, buscar formas de financiamento, como crowdfunding ou parcerias.
5. Quais são seus objetivos de curto e longo prazo?
Ter um plano de carreira é essencial para não se perder no caminho. Pergunte-se: onde você quer estar daqui a cinco anos? Quantos livros quer publicar? Que formatos deseja explorar (físico, digital, audiolivro)? Ter um norte claro ajuda a manter o foco e a motivação.
A estratégia como ferramenta de sobrevivência
No contexto da carreira literária, a estratégia é o que separa o autor ou autora que escreve por hobby daquele que constrói uma carreira sustentável. Uma das maiores armadilhas para autores independentes é confundir o ato de escrever com o ato de ser escritor ou escritora. Escrever é a paixão, o que te move. Ser escritor ou escritora envolve, além disso, tomar decisões estratégicas.
Para desempenhar esse papel, é necessário abrir espaço para reflexões menos poéticas e mais práticas. Pergunte-se: você tem um plano de carreira? Consegue mensurar seus resultados? Entende onde quer chegar nos próximos anos? Desculpe o papo de coach, mas a verdade é que, sem um norte, até mesmo o maior amor pela literatura pode se perder no cansaço e na frustração.
Uma dica valiosa para quem está começando é começar pequeno, mas começar estruturado. Experimente criar uma visão geral de como você quer que sua carreira evolua. Pense em perguntas como “Quantos livros você quer publicar nos próximos anos?”, “Quais histórias você quer contar?”, “Que formatos você vai explorar: físico, digital, audiolivro?”, e “Quais são as pessoas do mercado literário que você precisa conhecer?”. Ter um plano, mesmo que simples, já coloca você à frente de muitos que ainda estão apenas no campo das ideias.
O amor pela literatura é o que te trouxe até aqui, mas é o conhecimento do mercado e a estratégia que vão te levar mais longe. É possível construir uma carreira equilibrada e, sim, fazer o que você ama. No entanto, isso exige cuidado, estudo e muito trabalho. Amor sem estrutura cansa. Amor sem planejamento frustra. Portanto, se você quer viver de literatura, não abra mão da paixão, mas também não negligencie a parte prática. Afinal, como dizem, “o amor é lindo, mas ele não paga as contas”.
*Karol Lopes é jornalista de formação, professora e pós-graduanda em História da Arte. Tem mais de 15 anos de experiência na área de comunicação e assessoria de imprensa. É professora convidada do Núcleo de Estratégias e Políticas Editoriais (Nespe) e da A Casa Inventada. Há 4 anos fundou a com.tato, agência especializada em auxiliar autores e autoras independentes. Também é editora do selo Tato Literário.