9 peças do Teatro Experimental do Negro (TEN) organizadas por Abdias do Nascimento

A Temporal Editora, em parceria com o Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (Ipeafro), anunciou a esperada reedição da antologia Dramas para negros e prólogo para brancos, importante obra da dramaturgia brasileira que reúne textos produzidos para o Teatro Experimental do Negro (TEN) e organizados por Abdias do Nascimento.

A nova edição inclui as nove peças e prólogo, presentes na edição original, de 1961, além de textos inéditos que evidenciam a trajetória e a relevância do TEN, tanto no contexto da dramaturgia quanto na luta contra o racismo. Entre as peças reunidas estão títulos como O filho pródigo, de Lúcio CardosoSortilégio, mistério negro, de Abdias Nascimento – em sua primeira versão –, Anjo negro, de Nelson Rodrigues, entre outros.

Conheça as peças através das sinopses da pesquisadora e dramaturga Leda Maria Martins!

O filho pródigo, de Lúcio Cardoso

Aila (Ruth de Souza) aponta um punhal para Manassés (Aguinaldo Camargo), ao fundo, Assur (José Maria Monteiro) observa o ato. Ensaio da peça O filho pródigo, de Lúcio Cardoso. Direção: Abdias Nascimento. Cenário: Tomás Santa Rosa. Teatro Ginástico, Rio de Janeiro, dezembro de 1947. Acervo Abdias Nascimento / IPEAFRO. Créditos:  José Medeiros

De tônus intimista e dicção mais literária do que teatral, a peça pode ser lida como uma alegoria poética, por meio da qual o drama do estigma da cor e da raça pulsa todos os embates e dilemas de uma família negra de referências arquetípicas bíblicas, em uma atmosfera sombria, composta por uma trama que se localiza em um espaço-temporal mítico e místico, quase como uma fábula ou parábola metafísica. 

O castigo de Oxalá, de Romeu Crusoé

Paulo Vicente (Isidro), Lenyr Elisa (Rita), Agnes Xavier (Leonor), Eduardo Calixto (Belarmino), Wlademir José (Raimundo) e, deitado, Roberto Nogueira (Ernesto).
Acervo CEDOC – FUNARTE. Créditos:  Carlos Moskovics/Foto Carlos

Na peça, o protagonista Raimundo, um jovem negro, tenta resolver suas questões identitárias e de afirmação como negro, voltando-se contra a religião do candomblé e se tornando, com determinação e resiliência, um próspero comerciante. […] Envolvido pela trama da antiga namorada negra, Rita, e de Ernesto, antigo cafetão de sua mulher branca, Raimundo é vítima das diabólicas ações de seus desafetos, perde seus bens, incendiados por seus inimigos, e, tal qual Otelo, consumido por suspeitas infundadas e ciúmes, assassina a esposa que diz amar. […]

Auto da noiva, de Rosário Fusco

Na obra, a comicidade da trama ligeira, como farsa, torna risível e ridiculariza os ideais de embranquecimento, tornando-o um mote caricato, continuamente desacreditado pelas falas, versos e cantos irônicos do coro e da Filha, risíveis, que, pela repetição farsesca, o ridicularizam, deslegitimam e desconstroem como máxima. O ritmo frenético das ações, a tessitura simplificada da linguagem, as falas e situações paródicas, os personagens-tipo, quase circenses, sem nome e sem profundidade psicológica, produzem uma comicidade de picadeiro, de humor satírico.

Leia também: 6 livros para conhecer Abdias do Nascimento

Em Sortilégio, mistério negro, Abdias do Nascimento

Emilio Paroli, Aparecida Bitencourt (sentada no chão), Marina Gonçalves (na cadeira), Abdias Nascimento, Noêmia Santos e Ruth de Souza em ensaio da peça Auto da noiva, de Rosário Fusco. Direção: Abdias Nascimento. Cenário: Tomás Santa Rosa. Teatro Phenix, Rio de Janeiro, 1947. Acervo Abdias Nascimento / IPEAFRO. Créditos:  José Medeiros.

Na peça, Abdias recria o trio amoroso exemplar: o homem negro que despreza a mulher negra, elegendo como esposa a mulher branca. Advogado, Emanuel observa que seu título pouco vale para defender Efigênia, sua jovem namorada negra, vítima dos abusos e estupro do homem branco. Seus ciúmes e desconfianças de uma suposta traição, nunca confirmada (à la Otelo), terminam com o assassinato da esposa, uma outra vítima imolada no altar dos efeitos das práticas do racismo e da misoginia ali refletidas e determinantes nos desfechos das personagens.

Além do rio (Medea), de Agostinho Olavo

 No espetáculo, acompanhamos a autoconscientização da persona negra, o abandono da máscara branca e a eleição da postura revolucionária, que vão guiar suas novas atitudes e ações insurgentes. Uma recriação dramatúrgica preciosa do mito de Medeia e da tragédia de Eurípedes. Filhos de santo, de José de Morais Pinho, nos apresenta personagens negros e brancos submetidos aos tensionamentos raciais e de gênero que se enovelam em conflitos intransponíveis e fracasso das relações romanescas.

Filhos de santo, de José de Morais Pinho

A peça nos apresenta personagens negros e brancos submetidos aos tensionamentos raciais e de gênero que se enovelam em conflitos intransponíveis e fracasso das relações romanescas. A complexidade das relações raciais se postula no enredo de tensionamentos no âmbito de uma família negra. [

Aruanda, de Joaquim Ribeiro

Tia Zefa (Ruth de Souza) e Rosa Mulata (René Ferreira). Aruanda, de Joaquim Ribeiro. Direção de Abdias Nascimento. Coreografia e cenário de Tomás Santa Rosa. Teatro Ginástico, Rio de Janeiro, 1948-1949. Acervo Abdias Nascimento / IPEAFRO.Créditos:  José Medeiros

O espetáculo apresenta o cômico e o dramático no tratamento da negrura, destacando uma caricatura ou construção exagerada do negro, através do candomblé, evidenciando um tipo de exótica teatralidade baseada no fomento do estereótipo e da subcultura.

Anjo negro, de Nelson Rodrigues

Nesta peça, Nelson configura um modo surrealista e crítico da perspectiva racista e de gênero. O protagonismo negro e feminino emerge como uma revisão crítica e deformadora das tradições e ideologias do patriarcado, no que se refere à sexualidade e à negrura, expostas nas relações amorosas e sociais com uma dramatização do negro e feminino, que extrapola a moralidade e o moralismo social. […]

O emparedado, de Tasso da Silveira

O texto homenageia o poeta Cruz e Sousa, tendo como foco o tema da frustração e da alienação do protagonista negro, em uma narrativa que entrelaça elementos realistas e simbólicos, e que expõe o tema da negrura e da marginalização em sua representação dramática e estética.

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