“Motel Destino” (2024): suor, gozo e sangue em cor

“Motel Destino”, daqui a um tempo cantaremos “cores de Almodóvar, cores Frida Khalo, cores de Karim, cores”. A volta de Karim Aïnouz ao cinema brasileiro trouxe um neo-noir nordestino que transpira pela tela.

Novo filme de Karim Aïnouz traz o movimento físico que nossa emoção estava precisando. Nosso cinema tem passado por uma revolução e tanto e não é de hoje. Os filmes que saem do circuito nacional levam a mensagem, a estética e sobretudo a linguagem deste novo cinema, pode não ser bem traduzido lá fora, mas é nosso. Desta forma, conseguimos mostrar o Brasil que somos. O Nordeste sendo reverenciado, não só nas paisagens lindíssimas, mas como em histórias de peso e exposição de artistas como merecem.

A visão que o mundo tem do nosso cinema é muito limitado e nichado. Não somos só favela, samba e havaianas. Apesar de fazer parte do nosso DNA, estamos em uma fase mais metalizada e naturalista, e acho que isso gera um pouco de desconforto nos telespectadores mais desatentos às nossas demandas culturais.

Ainda falando sobre essa nova fase, muito tem a ver com os nomes de peso do mercado como Kleber Mendonça Filho e seus filmes dramaticamente simples e profundos. Assim como também Nara Normande e Tião e seu filme sensibilíssimo “Sem coração”. Que é um “coming of age” nenhuma semelhança com o subgênero do objeto de hoje, mas com a mesma audácia e com a mesma visão de Nordeste.

“Motel Destino” além do nome que já é um grande símbolo e guia para o filme, traz consigo uma beleza saturada, o calor que começa no corpo de cada personagem, que se estende na premissa, esbarra na trilha sonora e vaza pela tela. Basicamente, aqui temos a história de Heraldo, vivido por Iago Xavier que para tentar se livrar de uma dívida tenta um assalto a um banco, mas não tem sucesso. Busca, então, esconderijo em um motel de beira de estrada, onde conhece a personagem de Nataly Rocha, Dayana. Que é casada com o dono do Motel, Elias, papel de Fabio Assunção.

O filme se passa como um estudo de cada personagem neste triângulo onde o refúgio mescla com cativeiro, e o sol só invade para lembrar Heraldo o que lhe aguarda do lado de fora.

É preciso exaltar Nina Kopko, produtora de elenco do filme, pela escolha dos atores. Não só o Fábio Assunção que nitidamente estava à vontade no mundo de Karim e assumiu com louvor a essência predatória que lhe devia. Mas também a Nataly Rocha, que eu não consegui enxergar atuando em um só momento. Ela foi Dayana do início ao fim. “Motel Destino” é um filme que desafia, desafia por falar de vitalidade, desejo e poder sem melindre. Desafia o conservadorismo por si só. Impossível não notar as referências estéticas e sensoriais às nossas Pornochanchadas, além da intenção bem sucedida de trazer o gênero Noir para o Brasil.

Leia também: “Armadilha”(2024): Pelo olhar de um predador

Um thriller sensual que mescla o crime, suspense, delírio e muito sexo. Inebriante com humor compulsório,atual (diretamente do twitter) e real. “Motel Destino” é espesso e doce, passa por nossos olhos sem atrito, com explosão de cores e movimentos. O uso das cores tanto na fotografia, quanto na cenografia e no figurino nos conduzem de forma hipnotizante. Os lençóis na cor laranja, uniformes em azul caneta, letreiro neon, lentes infravermelhas, lentes 16mm granuladas que eletrificam e a super exposição das luzes.

sim, cada frame é uma pintura!

E neste quesito de fotografia, não é a toa que estamos falando de Hélène Louvart. Conhecida também por seu trabalho, de novo com Karim, em  “A vida invisível”. O roteiro, elaborado em parceria por Wislan Esmeraldo e Maurício Zacharias, é igualmente preciso ao utilizar símbolos que antecipam o próximo ato. Ele explora o papel das alucinações como forma de terror e usa de artifícios como a câmera de segurança para acompanhar a passagem de tempo. além do mais importante: aborda temas como violência contra as mulheres, crime organizado, corrupção e machismo. Desconstruindo cada um desses problemas.

Marcos Pedroso, enquanto diretor de arte, explorou com maestria a riqueza de elementos presentes nessa história. Não só trouxe as cores e formas necessárias como também uma história cultural desmistificando muito do que vemos como personalidade dentro do crime organizado. Celebro este filme como um marco. Não estamos atrás no cenário do mercado cinematográfico, Só precisamos reconhecer e assumir o nosso cinema como necessário.

Veja o trailer completo aqui:

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