“Frio o bastante para nevar”, de Jessica Au: o rio caudaloso que atravessa nossas relações

“Frio o bastante para nevar”, Jessica Au. Tradução Fabiane Secches. Editora Fósforo, 2023.

Pode até ser clichê o que vou dizer, mas a impressão que eu tive é que esta narrativa sobre a relação entre mãe e filha se desenvolve como um rio, aparentemente calmo na superfície, mas caudaloso quando mergulhamos.

Um texto bastante reflexivo sobre conexões, pertencimento e também identidade, pois há na relação entre as duas um deslocamento físico e até cultural, com a mãe tendo nascido em Hong Kong enquanto a filha nasceu e cresceu em outro lugar, em um país anglófono.

Para além disso, gostei da forma como a partir das interações com a mãe a filha vai puxando as memórias e a gente passa mais tempo dentro da cabeça dela do que efetivamente nos diálogos com a mãe ao longo da viagem pelo Japão, país teoricamente neutro e que traz para as duas sentimentos, memórias e reflexões diferentes sobre a infância e o passado no geral.

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Falando em passado, eu lembrei muito de um trecho do filme Past Lives, da diretora Celine Song, no qual o marido da Nora, uma das personagens principais, diz que ela fala em coreano enquanto dorme e que isso o fez perceber que existe um espaço inacessível para ele ali, e mesmo a relação no livro sendo completamente diferente, há o peso desse não acesso à língua materna do outro e por consequência a forma como esse outro pensa em uma língua estrangeira.

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