Entrevista com Regiane Winarski, tradutora de Pequenas Realidades, de Tabitha King

Recentemente, foi anunciado o lançamento da obra Pequenas Realidades (Small World, 1981), o primeiro romance da escritora norte-americana Tabitha King, a qual faz parte de uma família de escritores, sendo ela esposa do escritor Stephen King e mãe dos escritores Owen King e de Joe Hill. Ainda que faça parte de uma grande família de escritores de sucesso, a obra de Tabitha não havia recebido tanto reconhecimento no Brasil, sendo que seu primeiro romance havia sido traduzido apenas uma vez e publicado por aqui pela editora Franciso Alves, traduzido por Reinaldo Guarany em 1985. No entanto, a edição já era difícil de ser encontrada há algum tempo, o que tornara a obra de Tabitha de difícil acesso no Brasil. Até que, neste ano de 2019, a editora DarkSide anunciou a publicação de uma nova edição da obra, agora traduzida por Regiane Winarski como Pequenas Realidades.

O romance conta a história de uma socialite chamada Dorothy Hardesty Douglas, filha de um antigo presidente norte-americano, que vive na redoma de seu legado de sucesso. Entusiasta de miniaturas, ela possui uma réplica da Casa Branca, perfeita em seus mínimos detalhes. Ao conhecer um homem chamado Roger Tinker, que trabalhou para o governo em um projeto secreto, ela descobre uma maneira fantástica — e um tanto perturbadora — de decorar sua casinha. A nova edição da obra será lançada no dia 29 de maio, mas já está em pré-venda no site da editora DarkSide e na Amazon.

Conversamos um pouco com a tradutora Regiane Winarski, responsável pela nova tradução da obra no Brasil, para saber mais sobre seu trabalho como tradutora literária e sobre como foi o processo de traduzir Pequenas Realidades, assim como o que ela pode nos contar sobre o estilo de escrita de Tabitha King.

Regiane Winarski é formada em Produção Editorial pela ECO-UFRJ e tradutora de inglês para português desde 2008. Especializada em tradução literária para editoras como Suma, DarkSide, Rocco, Intrínseca, Record e outras, com mais de cem livros publicados. Trabalha com uma ampla variedade de gêneros, como fantasia, suspense/horror e romances para adultos e jovens adultos, de autores como Stephen King, Rick Riordan e David Levithan. Tradutora do premiado livro de 2017 “O ódio que você semeia”, de Angie Thomas, publicado pela Galera Record.

Regiane Winarski, a tradutora de Pequenas Realidades

Confira abaixo a entrevista exclusiva com Regiane Winarski e conheça sua jornada como tradutora e o que ela nos conta sobre sua nova tradução da obra de Tabitha King, pela editora DarkSide:

Você trabalha com tradução literária há quanto tempo? Por que escolheu traduzir literatura? Poderia contar-nos um pouco sobre a sua jornada na tradução literária e sobre como chegou a trabalhar com grandes editoras?

Comecei na tradução literária em 2009, há dez anos. Sempre fui apaixonada por livros e pela língua inglesa, mas minha vida deu algumas voltas pra chegar no trabalho que une as duas coisas. Fiz faculdade de Comunicação – Produção Editorial na UFRJ porque queria trabalhar com livros, mas acabei indo dar aulas de inglês em cursos de idiomas do Rio por 10 anos antes da vir parar aqui. O grande divisor de águas foi o nascimento da minha filha, que me fez ter vontade de correr atrás de uma coisa que foi só um sonho da época de faculdade e fazer com que virasse realidade. Parei de dar aulas, me dediquei ao estudo por um tempo (com total apoio do meu marido) e comecei com legendagem depois que fiz um curso da área. Mas eu queria mesmo os livros, e pouco depois eu consegui minha oportunidade com romances de banca. O caminho de entrada no mercado editorial não é fácil, é preciso persistir.

Pelo que observamos, você já traduziu obras de Stephen King também, certo? Quais outros autores você também já traduziu?

Sim, já traduzi 13 livros do Stephen King e estou trabalhando no 14º. Eu traduzo os mais variados autores, gêneros, estilos. Já traduzi Meg Cabot, Angie Thomas, David Levithan, Jenny Han, Stephenie Meyer, Sophie Kinsella, George RR Martin, Maya Angelou e muitos outros – e alguns que nem posso contar ainda porque não foram lançados. Foram experiências bem diversas.

Quais obras você mais gostou de traduzir?

Ah, isso é quase como perguntar a uma mãe qual é o filho favorito, haha. Stephen King é sempre incrível porque ele é um dos meus autores favoritos desde que eu tinha 13 anos. Mas foi maravilhoso poder trabalhar com um livro autobiográfico da Maya Angelou e também ter a oportunidade de traduzir o George R.R. Martin, claro. Meu queridinho da vez, recém-lançado, é Garoto devora universo, do Trent Dalton. Mas a Tabitha King foi a cereja do sundae, uma honra traduzir um casal tão maravilhoso desses.

Dentre as obras do Stephen King, quais delas você mais gostou de traduzir? Já traduziu algumas das suas favoritas dele?  Há alguma obra dele que você goste muito e ainda queira traduzir futuramente?

Dos livros antigos do King, eu gostei muito de traduzir A metade sombria, porque é um clássico que eu sempre tive como meus favoritos desde que li e acabou de ser relançado. Mas o mais especial pra mim tem sido traduzir os livros que a Suma está lançando simultaneamente com os EUA, porque isso significa que os originais chegam antes pra mim. Ter a oportunidade de ler um livro de um de seus autores favoritos antes do público em geral é muito precioso. Outsider talvez seja meu favorito nessa linha dos livros que foram lançados simultaneamente, e vale lembrar que em setembro teremos outro, O instituto, que já está sendo trabalhado.

Você já conhecia a obra de Tabitha King antes de trabalhar com a tradução do romance Pequenas realidades? O que conhecia sobra a autora?

Já tinha lido o livro Pequenas realidades na adolescência, na edição da editora Francisco Alves com o título de Miniaturas do terror. Mas não me lembrava de detalhes da história, só da sinopse. Como acompanho o trabalho do Stephen King há muitos anos, sempre acompanho por tabela as notícias sobre ela. Quanto aos outros livros dela, ainda não li (mas estão na minha lista).

Como descreveria o estilo de escrita de Tabitha King?

Usando como base apenas esse livro, o Pequenas realidades, avalio a Tabitha King como uma escritora que sabe aonde quer chegar e toma decisões na história que a levam por esse caminho. O texto do livro me passou a sensação de ser muito bem planejado e executado, numa movimentação que vai se estreitando e direcionando a história, a ponto de você começar a imaginar o que pode acontecer e ao mesmo tempo torcer para estar errado, porque ela não tem pena dos personagens. Ela usa inclusive os recursos do idioma com maestria com esse objetivo.

É possível transpor esse estilo para o português sem perder muitos elementos extratextuais, como contexto social, referências culturais, gírias, etc?

É possível, sim. Esse é efetivamente o trabalho ideal da tradução: não se prender somente às palavras, mas a toda a atmosfera do texto. Claro que as referências culturais sempre podem ser um problema, mas elas são importantes para o contexto da história e os autores em geral sempre os escolhem por algum motivo. Felizmente,hoje em dia temos o Google a nosso favor e fica fácil fazer qualquer consulta. Outrodetalhe é o fato de o livro ter sido publicado no começo da década de 80, o que faz a ambientação, os recursos tecnológicos e vários outros aspectos se destacarem muito da nossa realidade de século XXI. É interessante que o leitor tenha isso em mente.

Como foi o processo da tradução em si? Exigiu muita pesquisa em relação ao contexto social da obra, ou alguma necessidade de adaptação de linguagem no que se refere a níveis de formalidade/informalidade da narrativa, referências culturais ou jogos de palavras?

A tradução de Pequenas realidades não ofereceu nenhum grande desafio no sentido de pesquisa, mas muito cuidado para que eu entendesse as escolhas da autora e tentasse me manter fiel pra causar o mesmo impacto no leitor. A Tabitha King tem um texto caprichado, cheio de detalhes, e era importante não simplificar e nem fugir disso para que o leitor brasileiro não perdesse a atmosfera que ela cria.

O que você mais gostou no livro? Quais os pontos fortes da obra?

A história não diz ao que veio logo de cara e acho isso um ponto positivo. O leitor precisa desbravar os acontecimentos pra ir percebendo as pontas se amarrando e entender a direção que o enredo está tomando. Eu gosto muito de livros assim.

O que acha da comparação que alguns leitores fazem entre a escrita de Tabitha com a de Stephen? Há alguma verdade nisso, ou o fato de eles serem casados pode ser o que influencia alguns leitores a fazerem essa comparação?

As mulheres sempre são comparadas aos homens, infelizmente. Mas nós não precisamos disso e a Tabitha não precisa disso. No caso dela, o fato de o marido ser um escritor de sucesso só torna as comparações ainda mais inevitáveis — como se a validação dela dependesse de ser aprovada na comparação a ele. Ninguém ganha com isso, nem ela e nem ele, e o leitor perde, pois cria expectativas que podem estragar a experiência de leitura. Por que não encarar como apenas um livro de terror e mergulhar na experiência sem amarras? Sinto muito orgulho de ler as entrevistas da Tabitha King e perceber que ela é uma mulher que entende seu valor e que não se sente ameaçada pela sombra do marido.

Há outra(s) obra(s) de Tabitha King que você gostaria de traduzir?

Eu sempre gosto de traduzir obras de bons autores! Só conheço os outros livros dela de nome e de sinopse, mas qualquer um seria bem-vindo.

Confira aqui também a matéria de Winarski sobre Pequenas Realidades para o site da editora DarkSide.

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