“Criei a imagem do eterno bêbado na minha obra e há pouca realidade por trás disso. Mesmo assim, sinto que meu trabalho disse outras coisas. Mas o único tema que parece sobreviver é o do eterno bêbado.” – Bukowski, Pedaços de um caderno manchado de vinho, p 192.
Quando se fala em Bukowski, é provável que muitos concordem com a frase do escritor mencionada acima, na qual ele comenta sobre o alcoolismo ser o aspecto mais marcante de sua obra. Charles Bukowski, o escritor e poeta nascido na Alemanha, mas que viveu sua vida toda nos Estados Unidos, é mundialmente conhecido como um autor de contos, romances e poemas encharcados de álcool misturado com bastante erotismo. Porém, sua obra não fala apenas desses assuntos, apesar de estes serem mesmo temáticas frequentes de Bukowski.
Os textos do autor divagam entre diversos outros tópicos, muitos têm tons melancólicos, como o famoso poema Pássaro azul, outros tons mais cômicos, outros fazem críticas à sociedade, falando sobre o modo de vida desregrado de seu autor e a sua visão contrária ao modo de vida imposto pela sociedade. Porém, um tema um particular chama bastante atenção: a visão de Bukowski da escrita, do ato de escrever e de ser um escritor.
O autor tem uma ligação bem forte com a escrita, que é algo bem intrínseco em sua existência, como ele conta em algumas das citações seguintes tiradas principalmente de suas obras O capitão saiu para o almoço e os marinheiros tomaram conta do navio e Pedaços de um caderno manchado de vinho, além de outras. Claro que a lista a seguir não abrange todas as citações de Bukowski sobre a escrita, apenas algumas delas, de algumas de suas obras.
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Do poema Então queres ser um escritor?
se tentas escrever como outros escreveram,
não o faças.
se tens que esperar para que saia de ti
a gritar,
então espera pacientemente.
se nunca sair de ti a gritar,
faz outra coisa.
Esse poema inteiro é sobre ser escritor e poderia muito bem ser citado por inteiro nesta lista, porém, como é um tanto longo, escolhi este trecho, no qual Bukowski coloca diretamente o ponto de vista que quer expressar em seu poema: ser escritor é algo que não pode ser forçado, não se deve imitar outros escritores ou escrever sem ter vocação. A partir de tais trechos, nota-se como Bukowski parece acreditar bastante na inspiração, pois que sem inspiração, quando o escritor se esforça para escrever algo bom, isso pode ser forçado e não soar verdadeiro. Claro que isto é um ponto de vista bem particular, muitos escritores trabalham muito com técnica, como Poe, enquanto alguns se guiam mais pela inspiração, como parece ser o caso de Bukowski.
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Escrever é quando vôo, escrever é quando começo incêndios. Escrever é quando tiro a morte do meu bolso esquerdo, atiro-a contra a parede e a pego de volta no rebate.
– O capitão saiu para o almoço e os marinheiros tomaram conta do navio
Neste trecho e nos seguintes, retirados do mesmo livro, até a citação 7, Bukowski exalta o poder da escrita, como algo que o torna mais forte, livre, superior ou indiferente aos problemas do mundo.
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E cada vez que escrevo um poema, é mais uma muleta que me faz seguir em frente.
– O capitão saiu para o almoço e os marinheiros tomaram conta do navio
Novamente, o escritor fala da escrita como algo que o fortalece, como um suporte para sua vida.
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Sou egoísta, gostaria de continuar a escrever palavras. Isso me dá um brilho, me joga no ar dourado.
– O capitão saiu para o almoço e os marinheiros tomaram conta do navio.
Dizer que algo o joga no ar dourado é, além de extremamente lírico, com certeza uma forma de dizer que a escrita o faz se sentir mais vivo.
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Essas palavras que escrevo me protegem da completa loucura.
– O capitão saiu para o almoço e os marinheiros tomaram conta do navio.
Será por isso que tantos escritores não parecem muitos normais? Por usar a escrita como uma maneira de não enlouquecer por completo (porque não enlouquecer nada não é possível?)? Enfim, aqui vemos mais um trecho onde Bukowski se diz sentir-se de alguma forma fortificado pelo ato de escrever.
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Eu escrevia visceralmente, alguns odiavam, outros amavam. Eu não estava nem aí. Apenas bebia mais e escrevia mais poemas. Minha máquina de escrever era uma metralhadora e estava carregada.
– Pedaços de um caderno manchado de vinho
Neste trecho, chega até a dar vontade de escrever ao notar uma certa empolgação de Bukowski com a escrita ao comparar sua máquina de escrever a uma metralhadora e sua indiferença com o público o amar ou o odiar.
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E todas as noites depois do trabalho eu me embebedava. Despejava rapidamente oito ou dez poemas.
– Pedaços de um caderno manchado de vinho
Para quem tinha dúvidas sobre escrever bêbado, Bukowski responde que para ele funcionava, e, pelo jeito, funcionava muito bem. Claro que nem todos conseguem escrever bem sob a influência de álcool, muitos escrevem melhor sóbrios, prestando mais atenção em seu trabalho, mas cada caso é um caso.
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Nada a fazer senão encher a cara e continuar escrevendo. Se um escritor conseguir se manter por um tempo suficiente e tiver qualquer coisa que seja, ele vai sobreviver. É claro, em tempos difíceis um escritor tem que ser a sua própria agência de arrecadação.
–Pedaços de um caderno manchado de vinho
Sobre a vida de escritor, Bukowski comenta as dificuldades de viver de escrita. Para ele, era possível se manter dessa forma.
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Um bom poema pode fazer uma mente despedaçada voar.
– Essa loucura roubada que não desejo a ninguém a não ser a mim mesmo amém
Mais uma citação na qual vemos a opinião de Buk sobre a escrita e sobre poemas, em particular: soa quase como que a literatura fosse literalmente um remédio para a mente (talvez porque assim o seja realmente!).
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– Você aconselharia alguém a ser escritor?
– Tá querendo me gozar? – retruquei.
– Não, não, falo sério. Aconselharia, como carreira?
– Escritor já nasce feito, não é conselho que vai resolver.
– Fabulário geral do delírio cotidiano –ereções, ejaculações e exibicionismos
Assim como no poema Então queres ser um escritor?, neste trecho, Bukowski defende sua opinião de que não se vira um escritor, mas já se nasce assim e que conselhos não ajudam alguém a escrever. É uma perspectiva um tanto particular, pois há escritores que estudam diversas técnicas e se esforçam escrevendo e reescrevendo seus textos e conseguem sucesso como escritores, assim como há aqueles que apenas escrevem seguindo sua inspiração e também escrevem muito bem. Claro que cada caso é um caso, mas para Bukowski, só é escritor se tiver vocação.