Contar histórias assombrosas é uma excelente forma de atravessar o mês de outubro, porém essa história que estou prestes a resenhar para vocês foi relatada no Natal. De qualquer forma, histórias fantasiosas combinam com fim de ano e reuniões entre amigos. Em uma velha mansão londrina, um grupo de amigos se reúne para compartilhar narrativas fantasmagóricas. Entre eles, Douglas afirma conhecer o relato mais terrível de todos, uma história de fantasmas que ouvira de uma amiga. À primeira vista, o enredo de Henry James é simples: uma jovem preceptora é contratada para cuidar de duas crianças encantadoras, Flora e Miles, na mansão Bly, uma residência inóspita e afastada dos centros ingleses.
No entanto, a jovem começa a ver aparições de dois antigos funcionários da casa, já mortos. Para essa narradora sem nome, os fantasmas pretendem destruir as doces crianças. Crianças, mansões no interior da Inglaterra e fantasmas podem ser uma excelente combinação. Como o próprio Douglas diz: “se uma criança dá ao fenômeno outra volta do parafuso, o que me diriam duas crianças?”
Publicado em 1898, A outra volta do parafuso (Tradução de Paulo Henriques Britto) é um livro construído sob a ambiguidade. Para David Bromwich, o livro é “[…] um experimento caracteristicamente moderno, que mostra o quanto a narrativa depende do ponto de vista.” O terror de Henry James é a incerteza: estamos diante de um relato de possessão ou de histeria? A nossa narradora é confiável? A linguagem impecável, o ponto de vista limitado e a falta de provas concretas conduzem o leitor a uma experiência de incerteza e ansiedade constante.
(27 de Janeiro – 16 de abril, 1898
A pessoa que olhava diretamente para dentro de casa era a mesma que já me havia parecido. Voltava a aparecer não direi com maior nitidez, o que teria sido impossível, mas como uma proximidade que representava um avanço no nosso relacionamento e que me fez, ao defrontar-me com ele, prender a respiração e gelar.
Nossa narradora, então, passará a proteger a qualquer custo essas crianças dos antigos criados mortos que assombram Bly. Com o passar das páginas, o autor vai apertando o parafuso de seu leitor: estamos tensos, confusos e com dúvida se vamos, de fato, confiar na preceptora – a única da residência a ver as aparições. O terror proposto por Henry James não virá de gritos, mas dos sussurros dentro da nossa própria mente.
A genialidade de Henry James está, justamente, em não oferecer resposta. Talvez você seja forçado a ser cúmplice da preceptora, ao mesmo tempo que desconfia dela, porque não há nada que faça você acreditar nela. O autor coloca seu leitor nessa névoa de dúvida. Não há monstros visíveis, é insuportavelmente humano, está entre nós, sem nunca nos tocar.
Quem foi Henry James?
Henry James nasceu em Nova York em 1843, de ascendência irlandesa e escocesa. Proveniente de família aristocrática, era filho do teólogo Henry James Senior, que frequentava a nata intelectual norte-americana, além de irmão da escritora de diários Alice James e do célebre filósofo e psicólogo William James. Recebeu uma educação notavelmente cosmopolita em Nova York, Londres, Paris e Genebra, e entrou na faculdade de direito em Harvard em 1862.
A partir de 1869, morou sobretudo na Europa, a princípio escrevendo artigos críticos, resenhas e contos para periódicos americanos. Ele viveu em Londres por mais de vinte anos e, em 1898, mudou-se para Rye, em East Sussex, Inglaterra, onde seus últimos romances foram escritos. Entre seus primeiros romances, estão Roderick Hudson (1875) e Retrato de uma Senhora (1881), que refletem a preocupação do autor com o impacto da antiga civilização europeia sobre a vida norte-americana, tema que retorna em seus últimos três grandes romances As Asas da Pomba (1902), Os Embaixadores (1903) e A Taça de Ouro (1904). Em obras como Pelos Olhos de Maisie (1897) e The Awkward Age (1899), ele investigou o caráter inglês com extrema sutileza. E também se dedicou às histórias góticas, como no celebrado clássico A Volta do Parafuso (1898) e em diversos contos e novelas. Em 1915, Henry James foi naturalizado como súdito britânico. Faleceu em 1916.
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