A filósofa e pensadora brasileira Sueli Carneiro completou 75 anos e ganhou um presente antecipado de Cidinha da Silva. Autora de diversos livros, ela lança até o fim deste mês “Só bato em cachorro grande, do meu tamanho ou maior” (2025), pela Editora Rosa dos Ventos.
O livro é uma coletânea dos aprendizados ao longo de 40 anos de convivência de Cidinha da Silva com Sueli Carneiro. Cidinha afirma que é um livro de memórias, enquanto a Sueli, tem dito que é uma biografia não autorizada.
Cidinha diz que o livro é resultado dos seus próprios pensamentos e declara:
“Esse livro é uma declaração pública de amor a Sueli Carneiro.”
O livro foi dividido em três grandes blocos:
- as orientações expressas diretamente;
- o aprendizado a partir do exemplo; e
- “tempo espiralar”.
O “tempo espiralar” é um conceito emprestado da autora Leda Maria Martins utilizado para se referir ao conhecimento ganho com a maturidade. E maturidade não falta a estas duas mulheres que são referências quando o assunto é resistência e luta.
Cidinha da Silva e Sueli carneiro: criando pontes
Ao escrever sobre os aprendizados adquiridos ao acompanhar Sueli Carneiro, Cidinha da Silva ressalta a importância de construir pontes geracionais entre os que vivem no presente e às pessoas que pavimentaram caminhos.
Foi o trabalho e o enfrentamento de mulheres como Sueli Carneiro que promoveram conquistas de direitos humanos para grupos subalternizados ao longo da história e o trabalho da Cidinha de concatenar esses ensinamentos no seu livro “Só bato em cachorro grande, do meu tamanho ou maior” (2025) é uma maneira de construir essas pontes.
Cidinha declarou recentemente que criou uma imagem de Sueli como uma baiana no desfile de escolas de samba. As baianas vestem uma roupa que pesa cerca de 12 quilos e ao vê-las pensamos que estão carregando plumas, dada a leveza da sua trajetória.
Desta maneira, pensamos o quanto é densa a nossa história, e neste ponto, me coloco como mulher negra e compartilho desta convicção, e do quanto é difícil “desfilar” com leveza, ao viver em um país tão racista quanto o Brasil.
Sobre Sueli Carneiro
Sueli Carneiro nasceu em 23 de junho de 1950 e dedicou praticamente toda sua vida para a luta antirracista. A leitura sempre esteve no centro de suas decisões e talvez por isso, sempre recorreu à escrita para se expressar.
Deu seus primeiros passos na leitura com “Capitães de Areia”, de Jorge Amado (1937) (que atualmente vem sendo perseguido por políticos de extrema-direita no Sul do Brasil) e nunca mais parou.
Cursou Filosofia na Universidade de São Paulo (USP), em 1972, e defendeu sua tese de doutorado, com título “A construção do outro como não ser como fundamento do ser (2005)” na mesma universidade 25 anos depois.
Em 2022, sua tese foi publicada com o título “Dispositivo de racialidade: a construção do outro como não ser como fundamento do ser”, pela Editora Zahar. Apesar de ter trilhado parte do seu caminho intelectual na universidade, Sueli afirma categoricamente:
“Não devo nada à universidade, quem me formou foi o movimento negro!”.
Cidinha da Silva: construtora de pontes!
Cidinha da Silva nasceu em Belo Horizonte, em 1967. e publicou mais de 22 livros ao longo de sua vida, sendo um dos grandes nomes da literatura brasileira. Suas obras abordam, de maneira geral, as experiências afrodiaspóricas, destacando a cultura e a identidade africanas da população brasileira.
Se dedicou à leitura desde a infância e se graduou em História na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) no início da década de 1990, quando começou a publicar artigos e ensaios no Brasil e no exterior.
Em 1996, se mudou para a cidade de São Paulo e passou a integrar a equipe do Geledés, instituição criada em 1988 por Sueli Carneiro, já apresentada acima. Cidinha atuou por quase uma década no Instituto, do qual foi presidenta entre os anos de 2000 e 2002.
Além da sua produção literária, Cidinha também fundou o Instituto Kuanza, para fomentar e promover o enfrentamento ao racismo, bem como auxiliou na organização de publicações sobre as relações raciais no Brasil nos séculos XX e XXI.
Autora inveterada de crônicas, Cidinha também publicou poesias, contos e literatura infantil, sempre construindo as pontes necessárias que possamos acessar de maneira espiralada entre o ontem, o hoje e o futuro.