“Paradise Now” (2005): palestino Hany Abu-Assad retrata conflito e a paz dividindo o mesmo lado

“Paradise Now” chegou aos cinemas pouco mais de cinco anos após os atentados do 11 de setembro. As cicatrizes na cultura ocidental, portanto, estavam abertas. Mas a história sobre dois amigos recrutados para um ataque suicida não surgiu para amenizá-las. O foco do diretor palestino Hany Abu-Assad parece o de mostrar outros machucados. 

Said (Kais Nashef) e Khaled (Ali Suliman) moram próximo à Tel Aviv, uma cidade ocupada por Israel. Não há fanatismo sendo mostrado, uma ideologia agressiva ou violenta. Os dois trabalham em uma funilaria, levam a vida como jovens comuns, com algum desleixo e preguiça. Quando Jamal (Amer Hlehel) convoca a dupla para a missão que estava sendo preparada há dois anos, Said ouve em silêncio. Khaled, ao contrário, parece eufórico. 

Leia também: O cinema palestino em 4 filmes: Uma viagem pelas origens da Palestina moderna

A partir daí, Hany Abu-Assad filma a trajetória até o ataque suicida de maneira crua. As razões da questão palestina, as disputas geopolíticas ou mesmo religiosas, são comprimidas nesse curto espaço entre a convocação e a morte. E ao evitar didatismos, Abu-Assad joga o centro do conflito para o colo do próprio espectador, como na cena onde Said questiona sua mãe sobre o pai morto.

Outro momento provocativo está na última refeição de Khaled Said, emulando o quadro de Leonardo da Vinci. Essa equiparação entre os dois lados, mostrando que a guerra, na verdade, é um espelho só também está na ironia do título, “Paradise Now”. O grande feito do filme é tecer um comentário contundente sobre a inoperância dos ataques, mas de uma forma seca, sutil. O roteiro, escrito pelo próprio diretor, mira na sensação de angústia das pessoas comuns, dos jovens, homens e mulheres à espera de um paraíso ainda em terra, de um lugar onde viver em paz seja possível.  

Em 2006, “Paradise Now” concorreu ao Oscar na categoria de melhor filme estrangeiro. No mesmo ano, “Munique”, de Steven Spielberg, recebeu cinco indicações. Uma coincidência interessante. Nos dois casos o interesse é justamente em mostrar que a paz é um remédio que não vai ser produzido a partir da guerra, como os dois lados acham. O fim de Munique, inclusive, é emblemático, ao responder a dúvida de Avner (Eric Bana) para Ephraim (Geoffrey Rush) apontando para as Torres Gêmeas, ainda de pé. 

O final de “Paradise Now” é tão previsível quanto doloroso. Porque quando ferir vale mais do que o ferido, nenhum lugar na terra parece dar conta do peso de ser um homem. 

Related posts

“Tipos de gentileza” (2024): todo mundo quer ser aceito, todo mundo quer ser amado

“Família” (2023): nem sempre os laços de afeto vêm dos laços sanguíneos

Motel Destino (2024): um retrato exuberante sobre ser refém dos próprios desejos