“Ana Marginal”: peça mergulha na poética contracultural de Ana Cristina Cesar

Idealizado por Nataly Cavalcantti, o espetáculo Ana Marginal explora facetas diferentes da autora que fez história a partir dos anos 70


Um dos grandes nomes da literatura marginal da década de 1970, para a poeta carioca Ana Cristina Cesar (1952-1983), vida e literatura eram inseparáveis. Ela seguia o ritual do parceiro de geração, o poeta Roberto Piva, que dizia que não existia arte experimental sem vida experimental. Ana Marginal – Um navio ancorado no espaço, projeto idealizado pela artista Nataly Cavalcantti, usa justamente essa mistura de vida e obra como inspiração para o espetáculo.

A dramaturgia assinada por Michelle Ferreira traz para a cena três personas para representar a escritora: Ana – a poeta, Cristina – a bailarina, e Cesar – a acadêmica, representadas pelas atrizes Nataly Cavalcantti, Carol Gierwiastowski e Bruna Brignol, respectivamente.

Trabalho feito em parceria, atrizes e dramaturga, ao lado do diretor Nelson Baskerville e da diretora assistente Anna Zêpa, mergulharam na sua obra para desvendar o corpo-poema de Ana Cristina Cesar, misturando arte e vida pessoal. 

Foto: Bruna Castanheira

ANA – “para que então ‘ter’ um corpo se é ‘preciso’ mantê-lo num estojo como umviolino muito raro.” Katherine Mansfield.
Trecho de “Ana Marginal – Um navio ancorado no espaço”

A característica forte de seus textos, a um só tempo viscerais e coloquiais – marca comum também entre outros poetas marginais dos anos 1970 -, cria uma aproximação confidencial com seus leitores.

“Como Ana Cristina Cesar pregava a quebra dos padrões eruditos e escrevia de uma maneira mais espontânea e contestadora, entendemos que o teatro performativo era a melhor maneira de homenagear essa mulher tão potente. Sempre achei que o Baskerville seria o diretor que conseguiria transpor para a cena o universo que eu  imaginava pro espetáculo. E eu não me enganei”, comenta Nataly. 

Para o encenador, entender a essência da autora é um desafio. “A cada dia chegam novos materiais que são incorporados ao espetáculo. Ela não está em apenas um poema ou um livro. Para desvendá-la, é preciso se debruçar sobre suas fotografias, cartas, cartões postais, entrevistas. Talvez hoje sua angústia fosse muito mais dispersa, porque os tempos mudaram muito, mas gostaríamos de devolver para ela essa sexualidade que lhe foi negada”, defende Baskerville.  

A complexidade desse processo de pesquisa também está presente na peça. Além de performático, Ana Marginal – Um navio ancorado no espaço configura-se como um metateatro, já que as atrizes discutem, em cena, temas como: por que sempre que se fala em artistas mulheres, o primeiro assunto é a sua vida pessoal, a histeria feminina, ao invés da importância das suas obras?

“Nosso objetivo é fazer os espectadores também saírem em busca de Ana Cristina Cesar. Infelizmente, ela morreu precocemente e não deu tempo de ela ser venerada como a grande autora brasileira que é”, reflete o diretor.  

Foto: Bruna Castanheira

Leia um trecho da peça:

CESAR – Não se preocupe, é confuso mesmo.

ANA – Não, não é confuso, é simples. Nós estamos criando algo que não existe.

CESAR – Sim, até porque se estivéssemos criando algo que já existe, não

estaríamos criando nada, estaríamos reproduzindo.

ANA – A Célia disse que você é muito criativa. Enfim, é isso.

CRISTINA – Olha, eu não estou entendendo muito bem.

CESAR – É confuso mesmo.

ANA – Não, é simples. É muito simples. É um espetáculo sobre Ana Cristina

César.

CESAR – Sabe quem é?

ANA – Claro que ela sabe quem é.

CÉSAR – Ela pode não saber.

ANA – Você sabe quem é?

CRISTINA – Ela foi homenageada na Flip uns anos atrás.

Leia também: “Cálculo Ilógico”: peça transforma matemática em metáfora para entender dor pessoal

Foto: Bruna Castanheira

FICHA TÉCNICA

Idealização e produção artística: Nataly Cavalcantti  

Dramaturga: Michelle Ferreira 

Direção: Nelson Baskerville  

Diretora Assistente: Anna Zêpa 

Atrizes: Bruna Brignol, Carol Gierwiastowski e Nataly Cavalcantti   

Concepção Cenográfica: Bruna Brignol e Nelson Baskerville

Figurino: Marichilene Artisevskis    

Assistente de figurino: Carolina Oliveira 

Iluminação: Lui Seixas

Trilha Sonora: Nelson Baskerville 

Criação e montagem dos vídeos: João Paulo Melo

Consultoria em Vídeo: André Grynwask

Vídeo Heloísa Teixeira: Anna Zêpa 

Direção de Movimento: Débora Veneziani

Preparação Vocal: Alessandra Lyra (Cor & Voz)

Cenotecnia: Casa Malagueta

Operação de Som: Gabriel Müller

Operação de Luz e Vídeo: João Paulo Melo

Operação de Letreiro: Iza Marie Miceli 

Contrarregra: Victoria Aben-Athar

Arte gráfica: Bruna Brignol

Fotos de divulgação: Bruna Castanheira 

Registro em fotos e vídeos: João Paulo Melo e Marcos Floriano

Assessoria de Imprensa: Canal Aberto – Márcia Marques 

Assistente de Produção: Gabriel Müller  

Diretora de Produção: Iza Marie Miceli

Projeto contemplado pela 16ª Edição do Prêmio Zé Renato de Teatro para a cidade de São Paulo – Secretaria Municipal de Cultura

SERVIÇO

Ana Marginal – Um navio ancorado no espaço
Local: Espaço Elevador | 75 minutos | Classificação indicativa: 12 anos
Data: 9 de setembro a 30 de outubro de 2023
Horário: sábados e segundas, às 20h, e, aos domingos, às 19h
Endereço: R. Treze de Maio, 222 – Bela Vista, São Paulo – SP
Ingresso: 40 (inteira) e R$ 20 (meia-entrada)

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