Uma das maiores escritoras de todos os tempos, Virginia Woolf revolucionou a forma de escrever com seu fluxo de consciência – técnica moderna em que a narrativa caminha como um fluxo, narração, pensamentos e falas misturadas em um mesmo movimento. Técnica também utilizada pela nossa Clarice Lispector.
O Quarto de Jacob foi o primeiro livro que Virginia publicou na sua editora junto com o marido, Leonard Woolf, a Hogarth Press. Por essa razão, foi a primeira vez que sentiu-se totalmente livre para escrever como bem entendesse, sem pressões e interferências de editores e editoras. Como aponta Antonio Bivar no prefácio da edição da Editora Novo Século, Virginia mencionou em seu diário:
Acho que [O Quarto de] Jacob foi para mim um passo decisivo para trabalhar em liberdade.
O livro é inspirado no irmão de Virginia, Thoby, que morreu de tifo em 1906 após uma viagem que fez com os irmãos à Grécia e à Turquia – acontecimento que muito marcou Virginia. Conta a história de Jacob Flanders, personagem que, por meio de lapsos e recortes temporais, acompanhamos desde a infância até a vida adulta. Em cada momento de sua vida, seu quarto – na casa da mãe, na universidade, em hoteis – traz elementos que nos permitem conhecer um pouco sobre Jacob, de sua paixão pelas borboletas na infância aos clássicos da literatura que devora sem parar. Da intimidade do quarto passamos à coletividade da vida compartilhada, sentida e sofrida com outras pessoas.
É um livros mais fascinantes de Virginia Woolf. Com passagens belíssimas, faz com que nos apaixonemos por Jacob, esse rapaz distinto, mas um pouco desengonçado, apaixonado pela vida e pelo conhecimento. Selecionamos algumas frases curtas pra te instigar a ler essa obra. Você não vai se arrepender! Confira:
Ninguém vê ninguém tal qual é – exceto uma senhora idosa sentada diante de um estranho vagão de trem. As pessoas vêem um todo – vêem toda sorte de coisas – vêem a si mesmas…
Na verdade, as palavras eram inaudíveis. Era a intimidade, uma espécie de maleabilidade espiritual, da mente imprimindo-se, indelével, sobre outra mente.
Contudo, trata-se apenas de palavras de uma moça, além do mais apaixonada, ou a fugir do amor. Desejava que aquele momento continuasse para sempre, exatamente como era naquela manhã de julho. E momentos não fazem isso.
Não são catástrofes, assassinatos, mortes, enfermidades que nos envelhecem e matam; é o modo como as pessoas olham e riem, e sobem correndo os degraus dos ônibus.
Só que as flores de verdade jamais poderão ser dispensadas. Se o fossem, a vida humana mudaria muito. Porque as flores fenecem.
Pensemos em cartas – em como chegam na hora do café da manhã e à noite, com seus selos amarelos e os verdes, imortalizados pelo carimbo postal – pois ver o nosso próprio envelope na mesa de outra pessoa é entender com que rapidez nossos textos nos deixam e se tornam alheios.
Mas as palavras têm sido demasiadamente usadas; manipuladas e reviradas, expostas à poeira das ruas. As palavras que não buscamos pendem junto da árvore. Chegamos ao amanhecer e as encontramos, dóceis, frescas, debaixo das folhas.
O estranho em relação à vida é que, embora sua natureza deva ter sido evidente para todo mundo há centenas de anos, ninguém deixou o registro adequado. As ruas de Londres estão mapeadas; nossas paixões não. O que vamos encontrar, ao dobrar essa esquina?
Sem dúvida, nossa vida seria muito pior sem o nosso espantoso talento para a ilusão.
Quer o censuremos ou elogiemos, não há como negar o cavalo selvagem que trazemos dentro de nós. Ele galopa desenfreado; cai na areia, exausto; sente a terra girar; tem – sem dúvida – um impulso de afeto para com pedras e relvas, como se a humanidade tivesse acabado; e quanto aos homens e mulheres, vamos esquecê-los – não podemos ignorar o fato de que tal desejo muitas vezes nos domina.
E colocando o livro no chão, começou a escrever uma nota sobre a importância da história, como se estivesse inspirado pelo que lera – num desses rabiscos sobre os quais se pode fundar a obra de uma vida inteira; ou, por outro lado, rabiscos que cairão dentro de um livro vinte anos depois, e ninguém se lembrará de uma só palavra. É algo um pouco doloroso; sempre é melhor queimá-los.