E se houvesse um portal que só pudesse ser atravessado quando se morre? Isso resolveria o problema da saudade daqueles que ficaram neste mundo, já que a pessoa amada estaria viva, apenas em outro lugar, ou simplesmente apontaria para a fragilidade da vida neste nosso pequeno universo? Para Sofia Spencer, que tem que lidar cotidianamente com a ausência de sua mãe, Florence, que suicidou-se na ponte quando a filha tinha apenas 7 anos, esta é uma pergunta sem resposta. A jovem, que mora em San Francisco com seu pai, tem obsessão por esta ponte que, para ela, é sinônimo de perda e possibilidade, ao mesmo tempo. Seus dias são divididos com Claude Jenkins, seu amigo de infância e vizinho desde sempre, e entre a escola e esta grande amizade, Sofia passa bastante tempo de sua vida pensando em sua mãe e da qual ela pulou.
Apesar da dor das lembranças constante da ausência da mãe, Sofia vive uma tradicional vida adolescente: seu relacionamento com o pai é regado de afagos e discussões, seu irmão mais velho Evan, quando vem visitar a família, é um clássico irmão mais velho e seu dia a dia com Claude é divertido e cheio de filmes, livros e telefonemas. Até que Joseph Humfrey se torna seu mais novo vizinho: bonito e intrigante, logo desperta a atenção de Sofia – e o ciúme do melhor amigo, que percebe que Sofia, agora, só tem olhos para o garoto. Acontece que Joseph está de passagem por San Francisco, pois a doença de sua mãe obriga a família a peregrinar atrás dos mais novos e eficazes tratamentos por todo o país. Frente à cada vez mais perto separação de Joseph, Sofia se vê convocada a lidar com seus próprios medos e os abandonos que viveu durante sua trajetória. Neste meio tempo, tenta conciliar a amizade de Claude e o amor de Joseph, às vezes sem sucesso – provocando situações que vão do ridículo ao divertido -, às vezes se saindo como uma mestra das vidas-duplas.
“Um universo a mais”, escrito por Léo Silva, é um livro voltado para o público jovem. Mas não só. Entre outras coisas, ele se destaca por três aspectos fundamentais: 1) a qualidade da escrita de Silva é impressionante, colocando o livro como um potencial sucesso do gênero por ser bastante superior ao que vem sendo produzido nacionalmente para este público; a fluidez, a sensibilidade e a ironia das personagens e da própria narrativa transformam a experiência de leitura numa experiência literária – e sabe-se que há diferença entre estas duas coisas. 2) o livro foge de determinados clichês do gênero sem perder a capacidade de produzir reflexão por parte dos(as) leitores(as). Abordando temas caros ao universo da literatura juvenil – o amor, a amizade, o medo, a passagem para a vida adulta, as descobertas -, o autor, talvez exatamente pela competência de sua escrita, não dá respostas prontas nem apresenta personagens totalmente estereotipados. Sofia não é uma garota perfeita, Evan certamente vive situações que, para a maioria das pessoas, não seriam consideradas “legais”, Claude, apesar de um pouco nerd e solitário, não é um “bobalhão”, mas um rapaz inteligente e articulado. 3) a construção dos personagens é evidentemente uma preocupação do autor, que busca dar ao(à) leitor(a) elementos para que se aproximem afetivamente de Sofia, Claude, Joseph, Evan e todos os outros. Destaco, neste aspecto, a acidez e a inteligência de Sofia, que tornam fácil para o(a) leitor(a) se ligar afetivamente a ela. Além de tudo isso, a trama é muito bem desenhada, tanto cronológica quanto intensivamente, o que, novamente, torna a leitura muito agradável.
Quando digo que “Um universo a mais” é um livro de literatura juvenil, não corroboro com algumas tendências de colocar este gênero fora do que se convenciona chamar “literatura nacional” ou apenas “literatura”. Pelo contrário: livros como este deveriam ser, na minha concepção, extremamente reconhecidos e recomendados, pois é através de excelentes obras como esta de Léo Silva que jovens iniciam sua caminhada no mundo da leitura – e isso não é pouca coisa. Não obstante, não se trata apenas de este ser um gênero fundamental no sentido de ser, muitas vezes, “a porta de entrada” para a literatura, mas também por abordar temáticas que certamente atravessaram ou atravessam as vidas de todos(as) nós, de modo que, se fala sobre nossas vidas, produz também vidas e experiências – como toda boa literatura. O livro, assim, é uma excelente pedida para jovens, mas não se restringe a este público, certamente – eu mesma fui totalmente fisgada pela história. Seus leitores encontrarão em suas páginas momentos de alegria, risadas, tristezas, esperanças e, principalmente, inspiração para ler, escrever e criar. Certamente, depois de lerem “Um universo a mais”, jovens ou não, buscarão novas leituras e novas experiências literárias.
O livro pode ser adquirido, nas versões física e digital, AQUI
#publi