“Nem o Céu, Nem o Inferno”: voz insurgente de Mário Bortolotto relata anos passados em seminário

Uma das vozes contemporâneas mais marcantes da chamada contracultura paulista e brasileira é a do dramaturgo, escritor e cantor Mário Bortolotto, que há quatro décadas comanda a companhia Cemitério de Automóveis e a banda Saco de Ratos nas noites paulistanas. Agora, ele se aventura no romance para contar um lado pouco conhecido de sua biografia: os anos que passou em um seminário.

Mário Bortolotto publica este romance, espécie de autobiografia romanceada ou, como contemporaneamente se chama, uma “autoficção” desses cinco anos estudando em uma instituição religiosa. Para isso, os nomes das pessoas e instituições estão trocados a fim de evitar qualquer constrangimento, porém, no geral, o que temos são lembranças de um tempo que, segundo ele, não foram maravilhosos, não foram terríveis como o próprio título quer deixar claro.

Talvez se encaixando no gênero de “romance de formação”, Nem o céu, nem o inferno é muito mais uma espécie de romance de transição da infância para a adolescência de um garoto que parecia ter um ódio imorredouro dentro de si e que estava tentando domar esse ódio e se manter vivo apesar de já ter uma visão bastante pessimista a respeito da vida e de futuro.

Leia também: Cemitério de Automóveis comemora 40 anos de estrada: entrevista exclusiva com Mário Bortolotto

Leia um trecho da obra:


“Alguns eram garotos que acreditavam realmente estarem predestinados a seguir os ensinamentos bíblicos, se tornarem sacerdotes e servir ao Bom Deus que aprenderam a amar nos flácidos seios de suas famílias. Esses tavam fudidos. Iam comer o pão bolorento que o Belzebu que eles tantos repudiavam foi obrigado a amassar, assim que Deus chutou o rabo dele para fora do paraíso. E havia alguns bons garotos, mas eu demorei a entender que eles não eram inimigos. Quanto a mim, ah, que se foda. Eu só tava ali porque queria sair de casa”.

Compre o livro aqui!

Ano passado, Bortolotto deu uma entrevista pra gente em que conta sobre a reinauguração do Cemitério de Automóveis. Confira um trecho:

O Cemitério de Automóveis vai fazer 40 anos de existência, né? Um grupo que vem fazendo teatro em períodos diferentes do nosso país, contando sobre pessoas marginais e marginalizadas. O que mudou no fazer teatral de lá pra cá? Ficou mais simples ou mais complexo?


Mário Bortolotto – Sempre foi difícil. Atualmente, ainda é mais, com um governo como o nosso, que parece ter verdadeira ojeriza a tudo que se relacione com cultura ou arte. Mas, acredito também que, em épocas como a atual, a cultura se faz ainda mais necessária para combater essa ideia vil de que a “arte” é desnecessária. E o fazer teatral para mim, por mais difícil que venha a ser, sempre foi algo muito prazeroso também.

Veja a entrevista completa aqui!

Sobre o autor:

Escritor, dramaturgo, ator, roteirista, poeta, dono de um teatro e de um bar, compositor e cantor da banda Saco de Ratos

Related posts

Novela de Thomas Mann: o fascismo é capaz de hipnotizar?

Ambição, Poder e Destino: Anakin Skywalker, o Macbeth de Star Wars?

Uma nova cosmologia para ver o mundo: o livro africano sem título – Cosmologia dos Bantu-Kongo, de Bunseki Fu-Kiau